Coluna Vitor Vogas
Análise: como foi a estreia dos candidatos a governador na TV?
Coluna relata e analisa o que Manato, Casagrande, Guerino, Aridelmo e Audifax procuraram ressaltar em suas primeiras propagandas no horário eleitoral gratuito

Candidatos a governador do ES
Em toda campanha, o primeiro programa veiculado no horário eleitoral gratuito de rádio e TV é extremamente importante, não só por ser a grande estreia dos candidatos falando diretamente ao público em veículos de massa, mas porque esse programa inaugural costuma fornecer boas pistas sobre as estratégias de campanha escolhidas por cada candidato.
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Nesta sexta-feira (26), começou a ser exibida a propaganda dos nossos candidatos a governador. Na ordem em que foram ao ar (Manato, Casagrande, Guerino, Aridelmo e Audifax), a coluna disseca abaixo a estreia de cada um na TV, destacando as principais mensagens que as respectivas campanhas buscaram transmitir ao público. Aqui, você também pode ver como foi a estreia deles no rádio.
Manato: para além da direita
Com 1 minuto e 17 segundos no ar, Manato apresentou dois programas diferentes, assinados pelo jornalista Fernando Carreiro: um na hora do almoço (13h) e outro no horário nobre (20h30). O primeiro foi preparatório para o segundo. “À noite vou contar para você por que quero ser o governador de todos os capixabas”.
E o fez, de fato, no horário nobre, de uma forma diferente: “escrevendo”, ao som do Hino Nacional, uma carta endereçada ao Espírito Santo, cujos trechos são lidos por ele mesmo e várias pessoas, alternadamente, e cujo teor é o seguinte:
“Querido Espírito Santo,
Tenho acompanhado muito de perto tudo o que você tem ado. A pandemia agravou as coisas, é verdade. Perdemos tanta gente querida e continuamos a perder, todos os dias, para o crime, a fome, nas filas dos hospitais. Eu sou médico e sei que a dor tem a importante função de nos tornar ainda mais fortes. Ah, Espírito Santo, é triste te ver assolado, desolado, aflito. Quero cuidar de você e te ver brilhar, resplandecer com desenvolvimento e oportunidades. Fazer de você um lugar mais justo e seguro, um lugar com menos desigualdade. A gente precisa fazer alguma coisa. É por isso que eu quero ser o governador de todos os capixabas.”
Ao finalizar a missiva dessa forma, assim como na letra do seu jingle (“Com Manato, não importa o lado”), a campanha do candidato bolsonarista busca nitidamente alargar o eleitorado de Manato para além da bolha de Bolsonaro.
Casagrande vespertino: origens humildes e valores cristãos
Com invejáveis 6 minutos de 14 segundos (quase dois terços de cada bloco de 10 minutos), o programa eleitoral de Casagrande é uma superprodução. Pelo jeito não está sobrando só tempo, mas também recursos de campanha. A equipe do atual governador se deu ao luxo de exibir dois programas totalmente diferentes (não no conceito, mas no roteiro, na edição etc.) na hora do almoço e no horário nobre.
O primeiro foi mais concentrado na história de vida de Casagrande. Após uma breve abertura com uma moça dizendo por que vota nele, o governador aparece contando as suas origens humildes na zona rural de Castelo (naquele formato de documentário: olhando não para a câmera, mas para a pessoa oculta que o entrevista).
Ele enaltece sua família e atribuiu a si mesmo características herdadas do pai, que tinha uma pequena venda, e da mãe: “O comerciante sabe lidar com as pessoas, sabe conviver com as pessoas. […] Peguei um pouco da energia da minha mãe e da paciência do meu pai”.
Acenando para o eleitorado conservador, ele também ressalta os valores religiosos que assimilou da família, como a fé em Deus. “Nós nos formamos dentro de uma tradição de valores cristãos”. Ele também apela para um lado emocional, dizendo que governantes são “um componente da felicidade das pessoas” e precisam levar esperança a elas.
Daí em diante, o governador aparece com capacete branco na cabeça visitando obras como a da Ciclovia da Vida, na Terceira Ponte, visitando alguns equipamentos entregues por seu governo e conversando com pessoas beneficiadas por tais entregas, como alunos do ensino médio em uma escola, moradores em uma estrada vicinal no campo e uma moça que abriu o próprio salão de beleza após fazer um curso do programa Qualificar-ES.
Voltando à “entrevista”, o governador assume o compromisso de, se reeleito, transformar o Espírito Santo em “referência em todas as políticas públicas neste país”. Fala em conviver com as diferenças e “governar para todos”, com “coragem, equilíbrio e sensibilidade” (os três motes que, como já havíamos apontado aqui, deram a tônica da entrevista coletiva em que ele lançou sua candidatura, no dia 11 de julho).
O programa foi fechado com o slogan que procura combater a ideia de que um novo governo Casagrande (o terceiro) será mais do mesmo: “Novas ideias para novos desafios”.
Casagrande noturno: chuvas, pandemia e linguiça recheada
Já o programa da noite foi aberto numa linha curiosamente defensiva (ou talvez preventiva). O próprio Casagrande aparece caminhando em uma rua muito pobre, sem calçamento nem tratamento de esgoto, com um discurso na linha “Ei, eu sei que o Espírito Santo tem problemas e que meu governo não é perfeito”.
O texto literal é: “É verdade que o Espírito Santo ainda enfrenta muitos desafios. Temos, sim, problemas históricos, que não se resolvem da noite pro dia. Por outro lado…”
E aí, a partir da adversativa, ele começa a enumerar realizações de seu governo: “… seria uma mentira dizer que não avançamos muito de 2019 pra cá. […] A nossa gestão fez muito, mas ainda vamos fazer muito mais”.
Em seguida, o roteiro a a ressaltar as adversidades em que Casagrande precisou governar: as chuvas que destruíram cidades inteiras do interior em janeiro de 2020 e, logo depois, a maior pandemia que o mundo enfrentou em 100 anos. No primeiro caso, o governador aparece em uma série de imagens vestindo aquele colete laranjão da Defesa Civil, coordenando os trabalhos de reconstrução e, literalmente, manuseando uma pá. Tudo, é claro, para enaltecer a pretensa reação ágil e eficaz do governante.
No segundo caso, o destaque é dado aos resultados do Estado na vacinação (“Saímos na frente”) e à decisão do governador de ampliar a rede própria de leitos hospitalares do Espírito Santo, em vez de apostar em hospitais de campanha. “O Espírito Santo conseguiu atender a toda a sua população e ainda ficou com um legado de 620 novos leitos.”
Curiosamente, essa parte do programa é aberta por um ditado popular que o próprio Casagrande repetiu à exaustão ao longo deste ano em pronunciamentos de pré-campanha: “Mar calmo não faz bom marinheiro”.
Na sequência, Casagrande aparece em um momento de seu discurso na convenção do PSB, realizada no dia 31 de julho, no clube Álvares Cabral: “Eu quero que a população capixaba vote em nós pela confiança que nós conquistamos e por tudo aquilo que nós vamos fazer nos próximos quatro anos. […] Podem ter certeza que vamos fazer muito mais, porque preparamos o Estado para esse investimento. O melhor ainda está por vir”, prometeu, repetindo um dos slogans da campanha.
O programa de Casagrande é tão longo que se deu ao luxo de gastar o incrível tempo de 1 MINUTO E 45 SEGUNDOS com uma espécie de videoclipe para um rap até legalzinho, mas completamente dispensável (o famoso “encher a linguiça”).
É quase o dobro do tempo inteiro de Audifax. Ostentação em face dos adversários…
Guerino: “A mudança que queremos”
Com pouco mais de um minuto no ar, o programa do ex-prefeito de Linhares apostou na criação de um personagem coletivo. Uma voz masculina em off se apresenta ao ouvinte como representação de todo o Estado e sua gente: “Sou o povo capixaba. Sou o Espírito Santo”. Cobrindo a locação, sucedem-se belas imagens que simbolizam o Estado: paisagens e pontos turísticos do campo e da Grande Vitória, do litoral e do interior, moqueca e manifestações culturais.
O texto é o de um personagem frustrado: apesar de sua “gente batalhadora”, de suas belezas e virtudes, o Espírito Santo não consegue desenvolver plenamente suas potencialidades: “Mesmo com tudo isso, eu tenho certeza que posso ser mais. Não podemos nos contentar com tão pouco e perder mais quatro anos. […] Meu desejo é ser grande”.
A mensagem que se segue é de mudança e esperança. Para isso, Guerino é “convocado” pelo Estado: “Eu te chamo, Guerino, para promover a verdadeira mudança. Conheço a sua capacidade e sei que está pronto. Não temos mais tempo a perder. Agora tem que ser você, Guerino”.
Atendendo ao chamado, surge então o próprio Guerino, que se dispõe para a missão: “Conte comigo, Espírito Santo! Sou Guerino Zanon e estou pronto. Quero te convidar para irmos juntos. Irmos juntos para fazer a mudança que queremos e devolver a esperança para o nosso povo.”
A campanha de Guerino é dirigida pela jornalista Andréia Lopes.
Aridelmo: erradicar a miséria
Com apenas 24 segundos no ar, Aridelmo não tem tempo a perder e já assume um primeiro compromisso. O locutor apresenta o problema da insegurança alimentar: “Hoje 1,6 milhão de capixabas não sabem se terão comida na mesa para a família. Nós temos uma chance de erradicar a extrema pobreza no Espírito Santo”.
Então, surge a candidata a vice do Novo, a jornalista Camila Domingues, dando nome a essa “chance” e a deixa para “Aridelmo, 30”, que entra em cena apresentando a proposta:
“Vamos garantir vagas em creche de tempo integral e alimentar todas as crianças do estado.”
Audifax: “Dá pra fazer melhor!”
Com 59 segundos, o programa de Audifax, assinado pela marqueteira Jane Mary Abreu, enfoca de imediato o principal ponto da sua plataforma: segurança pública. Mas o tom meio alarmista do locutor do seu programa de estreia no rádio dá lugar ao tom suave, baixo, quase sussurrante do próprio Audifax, que dá ao público um testemunho da sua experiência de quase morte, em plena campanha eleitoral para prefeito da Serra em 2016. Ao fundo, ouve-se uma música instrumental igualmente suave.
O locutor introduz: “Foram 21 dias lutando pela vida. Isso fez de Audifax um novo homem”. Então, o próprio ex-prefeito entra em cena: “Quem sai vivo de uma experiência de quase morte tem uma nova postura diante da vida. A sensibilidade aumenta. Prestamos mais atenção às pessoas. Ficamos mais comprometidos com as soluções. Eu decidi me candidatar a governador para defender a vida”. Esse é o gancho para falar de segurança.
“Há oito anos, o governo tenta uma solução para a segurança pública, sem resultados. A televisão mostra isso todo dia. Estamos no meio de uma guerra. Uma guerra que já chegou ao interior. O governo agora está pedindo mais quatro anos de tolerância. Não dá mais, né?”
Por fim, Audifax apresenta suas credenciais como gestor público há mais de 30 anos e prefeito da Serra por 12. “Eu garanto: dá pra fazer melhor. Vem comigo!”
Uma ressalva possível é que uma frase grave como “Estamos no meio de uma guerra” contrasta com o tom suave e a expressão serena com que o candidato a enuncia. Parece haver certo desencontro entre o conteúdo do texto e sua enunciação.
Em tempo: foi exatamente após a alta hospitalar de Audifax na campanha na Serra em 2016 que teve início a parceria, até aqui bem-sucedida, entre ele e Jane Mary Abreu.
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