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Coluna Vitor Vogas

Entrevista (Max Filho): “PSDB perdeu valores, identidade e eleitores”

Hoje um estranho no ninho tucano, ex-prefeito de Vila Velha avalia que partido virou “força auxiliar do bolsonarismo”. “Não dá para nós, né?”

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Max Filho é ex-prefeito de Vila Velha. Crédito: Reprodução Facebook

Sem ambiente e com um pé e meio fora do PSDB, partido que o acolheu em 2012 e pelo qual disputou as suas últimas cinco eleições, o ex-prefeito de Vila Velha Max Filho diz ainda ter alguns bons companheiros entre os colegas de sigla, mas hoje se sente um estranho no ninho tucano, principalmente após a transição do partido para a direita nos últimos anos – ou, na visão de Max Filho, em direção à direita bolsonarista, o que é muito pior para ele:

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“No plano geral, o PSDB se tornou uma força auxiliar do bolsonarismo. Deixou de ser um partido social-democrata. Quer ser bolsonarista? É melhor se filiar ao PL. Acho que, com isso, o PSDB perdeu valores, identidade e eleitores. Não dá para nós, né?”, critica o ex-prefeito, praticamente antecipando um desligamento que parece questão de tempo, embora ele não tenha a menor premência em definir sua situação.

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Governante de Vila Velha por três mandatos (2001-2004; 2005-2008; 2017-2020), o ex-prefeito também opina sobre o governo Casagrande (PSB) e reserva uma avaliação bem crítica à istração municipal de Arnaldinho Borgo (Podemos), seu rival e algoz nas urnas na eleição de 2020 em Vila Velha.

Perto de completar 55 anos, o filho de Max Mauro é analista judiciário concursado no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) desde 1994. Desde que ficou sem mandato, é lá que cumpre expediente de segunda a sexta-feira, das 12h às 19h. Foi perto de bater o ponto que deu por telefone a entrevista abaixo à coluna:

O senhor vai sair do PSDB?

Eu gostaria de tratar disso quando tiver o fato consumado. Não sou membro da Executiva Estadual nem da Municipal. Sou só um simples filiado. É claro que o que virou o PSDB no plano nacional deixa muita gente insatisfeita. Mas não quero tratar disso estando dentro, até porque já fui convidado a me retirar por um deputado estadual do PSDB [Mazinho dos Anjos, em discurso na tribuna da Assembleia, em meados de março]. Tenho um carinho grande por algumas figuras do partido no plano nacional e no estadual, e não quero ficar contribuindo para um desgaste do partido. Se tiver que sair, vou sair, mas não quero ficar atirando.

O senhor menciona “o que virou o PSDB”. Quero abordar as questões ideológicas, mas agora se impõe antes de tudo uma questão prática mesmo: a iminente federação do PSDB e do Cidadania com o Podemos, partido do atual prefeito de Vila Velha, seu adversário político. O senhor consegue se enxergar na mesma federação que Arnaldinho Borgo?

A questão partidária virou uma questão muito volátil no Brasil, especialmente no Espírito Santo. O que é hoje não é amanhã. Eu acho que a federação não deve vingar para a eleição municipal. É só um palpite. Não sei se o atual prefeito fica no atual partido dele. O que posso te dizer é que, com certeza, não estarei no palanque dele, independentemente da questão partidária. O padre na Festa da Penha o definiu muito bem: disse que o prefeito de Vila Velha tem nojo de pobre*. Aliás, alguém já disse que, se você quiser conhecer uma pessoa, dê poder a ela. Não estaremos no mesmo palanque, de jeito nenhum. Não vai caber.

O senhor vem da esquerda, do brizolismo. Nos últimos anos, o PSDB, nascido na centro-esquerda, tornou-se um partido de centro-direita no Brasil. No Espírito Santo, sob a presidência de Vandinho Leite, o partido deu uma guinada rumo à direita conservadora ainda mais profunda do que foi essa inflexão em âmbito nacional. Essa guinada gera algum desconforto ao senhor?

Não quero fulanizar na pessoa do Vandinho, pelo contrário. Ele tem sido uma pessoa muito atenciosa e me tratado com lealdade. Mas, no plano geral, o PSDB se tornou uma força auxiliar do bolsonarismo. Deixou de ser um partido social-democrata. Quer ser bolsonarista? É melhor se filiar ao PL. Acho que, com isso, o PSDB perdeu valores, identidade e eleitores.

E o senhor não se identifica com nada disso?

Não dá para nós, né? Meu pai [o ex-governador Max Mauro] fez a sua construção política na resistência democrática à ditadura, com os princípios bíblicos de que não devemos remover os marcos antigos fincados por nossos pais. A causa democrática é inegociável para nós. Ficamos na clandestinidade, mas não deixamos de lutar na resistência pela democracia.

E o bolsonarismo é o oposto disso?

Sobretudo o que vimos nesses ataques às instituições democráticas.

E também por isso o senhor não se reconhece mais no PSDB?

No geral, o PSDB se tornou na prática, no Parlamento e em outros ambientes, essa força auxiliar do bolsonarismo. Acho que o Bolsonaro é mais autêntico que o PSDB quando defende essas causas antidemocráticas. Na verdade, nessa radicalização política, a gente não se identifica com nenhum dos polos. Já no plano local, todos sabem das agruras que vivi no PSDB: a convenção de 2017 [perdida por Max Filho para César Colnago], a intervenção no PSDB de Vila Velha, esse saldo geral. Mesmo, assim, com todas essas diferenças que tivemos, ainda tenho bons amigos e bons companheiros que continuam no PSDB. Então não dá para generalizar essa postura.

Eduardo Leite pode reconstruir o PSDB sobre novas bases?

Acho que tem chances. É um cara novo, representa uma tentativa pelo menos de renovação de quadros e dirigentes do partido. Lá na frente pode se tornar uma alternativa de poder que não seja tão fortemente vinculada a essa extrema direita e à extrema esquerda. É um nome mais moderado. Mas ainda é uma incógnita, apesar do bom trabalho que tem feito no governo do Rio Grande do Sul.

Como o senhor se define hoje do ponto de vista ideológico?

Dom Hélder Câmara foi arcebispo de Olinda e usou uma expressão certa vez: o homem precisa mudar muitas vezes na vida para continuar sendo o mesmo. E eu tive que mudar muitas vezes na vida para continuar sendo o mesmo. Por exemplo, quando [o então e ainda presidente nacional do PDT] Carlos Lupi me convidou a sair do PDT em 2009 para 2010, porque eu atrapalhava a formação de chapa… Fui para o PTB, onde disputei em 2010 a eleição para deputado federal. Depois fui acolhido no PSDB em 2012 e lá estou até hoje.

Mas onde o senhor se posiciona hoje? Esquerda? Centro-esquerda? Centro? Indeterminado?

Do ponto de vista dos valores de família, me considero um homem conservador. Sou membro de uma igreja protestante, a Presbiteriana, e esses valores familiares da doutrina cristã são inegociáveis para mim. Do ponto de vista da economia, sou um liberal. Não acredito num Estado estatizante, hipertrofiado, nas estatais… Fui eu quem fez a PPP da iluminação em Vila Velha. Acredito que a eficiência está bem afinada com o mercado. Mas, do ponto de vista social e do trabalho, sou um progressista. Sou um servidor da Justiça do Trabalho. Meu avô, Saturnino Rangel Mauro, foi o primeiro juiz classista da Justiça do Trabalho, representante dos empregados.

Quais são seus planos eleitorais?

Como eu disse, sou servidor de carreira da Justiça Federal do Trabalho. Desde 1994, sou analista judiciário concursado do Tribunal Regional do Trabalho. Dos 30 anos que sou servidor, 20 deles ei licenciado para exercer mandatos. Não tenho plano eleitoral, não. Meu foco hoje é no desenvolvimento da minha carreira na Justiça Federal, e não estou pensando em eleição. Mas é claro que temos pessoas com as quais nos identificamos, causas que nos são muito caras, e vamos continuar somando onde estivermos do ponto de vista dos princípios e valores que sempre defendemos em nossa vida.

O senhor tem feito algum movimento político em Vila Velha? Tem mantido sua militância ativa ou está jogando parado?

O meu horário de expediente é das 12h às 19h, então a parte da manhã eu tenho livre, mas sobra um pedaço pequeno. O tribunal é um ambiente sisudo para política. É difícil até atender um telefonema para tratar desse tipo de assunto político-partidário. Então isso ocorre mais nos fins de semana. Tem as pessoas que nos procuram e terminamos conversando.

O senhor ainda se considera aliado de Casagrande? Como avalia o governo dele?

Tenho boas relações com o Ricardo Ferraço. É inegável que o Casagrande tem realizado obras em todo o Estado, em Vila Velha inclusive, as obras de macrodrenagem são importantes. Ele ganhou apertado no ano ado, então já deu sinais de fadiga de material. Mas acho que tem mais acertado que errado no geral.

E como avalia a gestão de Arnaldinho em Vila Velha?

Tem sido um desastre, sobretudo para as pessoas mais simples da cidade. Ele veio no embalo da nossa istração, surfou nos contratos que deixamos encaminhados das obras e do financiamento internacional que assinei com o Fonplata [Fundo Financeiro para Desenvolvimento da Bacia do Prata], que não pudemos entregar devido à pandemia. Isso lhe permitiu começar o governo com um embalo interessante. Mas, ao longo da gestão, não apresentou nada além de perseguição às pessoas mais simples da cidade, que estão vivendo um horror.

* O padre Kelder Brandão usou essa expressão em referência à Prefeitura de Vila Velha durante a homilia celebrada por ele na manhã da última segunda-feira (17), no campinho do Convento da Penha, durante a Festa da Penha, para criticar a lei municipal de autoria da istração de Arnaldinho que limita a circulação de catadores de material reciclável em determinadas vias da cidade.