Coluna Vitor Vogas
As repercussões do projeto que proíbe agrotóxicos por via aérea no ES
Discordando de Iriny e Camila, Coser é contra medida, mas quer debate. Mazinho diz que vai matar projeto na CCJ. E mais: maconha medicinal pode ser votada hoje. Assembleia cria nove cargos. Sinais de afastamento entre Marcelo Santos e Renzo

Da esquerda para a direita: João Coser, Camila Valadão e Iriny Lopes. Crédito: Ellen Campanharo/Ales
O projeto de lei que visa proibir a aplicação aérea de agrotóxicos em todo o território capixaba – por meio de drones e aeronaves, por exemplo – é um daqueles casos não tão comuns de proposições que já nascem gerando um apaixonado debate. Protocolado no último dia 4 pelas deputadas Camila Valadão (PSol) e Iriny Lopes (PT), o projeto ainda nem sequer tramitou nas devidas comissões temáticas, mas já tem despertado uma “reação em cadeia de reações”, em sua maioria, contrárias à iniciativa, tanto na Assembleia como muito além do plenário.
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Como registrado aqui na última quinta-feira (19), até o vice-governador Ricardo Ferraço (MDB) publicou um vídeo no qual se posiciona veementemente contra o projeto, associado por ele a “retrocesso” e “negacionismo”. Nas redes sociais e na tribuna, uma fila de deputados já se manifestou contrariamente. No dia 19, citamos aqui, por exemplo, Sérgio Meneguelli (Republicanos), de Colatina, Lucas Scaramussa (Podemos), de Linhares, e Coronel Weliton (PTB), do Caparaó.
Mas, logo após a publicação do texto, outros deputados entraram em contato com a coluna para informar que também já haviam feito manifestações nesse sentido. Entre eles, Lucas Polese (PL), de Colatina, Adilson Espindula (PDT), de Santa Maria de Jetibá, Bruno Resende (União), de Cachoeiro, e Mazinho dos Anjos (PSDB), de Vitória mesmo, mas muito votado na Região Noroeste.
Este último foi além. Mazinho é presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Assembleia. À coluna, o deputado antecipou sua predeterminação de trabalhar pelo arquivamento do projeto na comissão.
Como presidente da CCJ, ele vai assumir a relatoria, apresentar parecer pela inconstitucionalidade da matéria e buscar convencer os colegas a seguir seu entendimento. “Vamos matar o projeto na CCJ”, adianta Mazinho, também classificando-o como “retrocesso para o agro capixaba”.
Coser também é contra o projeto, mas propõe audiência pública
Em outra vertente, a reação contrária que mais chama a atenção é a do deputado estadual João Coser (PT).
Além de membro titular da Comissão de Agricultura, Coser é aliado das duas proponentes do projeto, Iriny (PT) e Camila Valadão (PSol). Os três são colegas na Comissão de Direitos Humanos, presidida por Camila. O ex-prefeito de Vitória, no entanto, discorda do mérito do PL nº 828/2023:
“As deputadas conversaram comigo, me apresentaram suas justificativas, mas fui contrário à proposta. A minha questão central é a saúde e o bem-estar dos trabalhadores rurais, porque proibir a pulverização aérea vai aumentar o uso da pulverização costal, que expõe ainda mais o trabalhador rural”.
Mesmo sendo pessoalmente contra a iniciativa, Coser protocolou ofício solicitando a realização de audiência pública pela Comissão de Agricultura da Assembleia, para que o projeto possa ser melhor apresentado por suas autoras e debatido mais a fundo pelas partes interessadas.
“É importante abrir um espaço para que todos os setores envolvidos, sejam eles favoráveis ou não à pulverização aérea, tenham oportunidade de se manifestar e apresentar seus argumentos”, defende o petista, natural de Santa Teresa.
A data da audiência ainda será definida. O pedido de Coser será analisado pelo presidente da Comissão de Agricultura, Lucas Scaramussa.
Os principais argumentos a embasar a proposição de Iriny e Camila estão ligados à proteção do meio ambiente e à defesa da saúde coletiva dos trabalhadores rurais, em especial a dos pequenos agricultores. Segundo elas, ambos são muito prejudicados por esse método de pulverização de agrotóxicos, seus componentes e afins.
Os críticos à matéria argumentam, por sua vez, que a pulverização aérea é muito mais eficaz, além de mais econômica, permitindo o emprego de bem menos trabalhadores na aplicação de agrotóxicos e reduzindo o risco de contato direto e contaminação por tais produtos. Por esse prisma, ao contrário do que alegam as proponentes, essa técnica diminuiria danos ao meio ambiente e à saúde humana.
Segundo a assessoria de João Coser, a proibição de pulverização aérea de agrotóxicos está em debate em, pelo menos, outros dez estados. Atualmente, apenas o Ceará tem uma lei estadual com semelhante finalidade, em vigor desde 2021. Foi precisamente essa lei que inspirou a iniciativa de Iriny e Camila, conforme a justificativa do projeto das parlamentares.
Faes também se posiciona contra e pede derrubada
Na última quarta-feira (18), o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Espírito Santo (Faes), Júlio da Silva Rocha Júnior, enviou ofício aos gabinetes dos deputados estaduais pedindo a eles “para se posicionarem contra e derrubarem o PL nº 828/2023”, o qual, na visão da entidade, “representa um ataque, um retrocesso e vai completamente à contramão do avanço de inovações e de desenvolvimento da agricultura capixaba”.
A Faes reforça que as atividades de pulverização de defensivos agrícolas por aeronaves remotamente pilotadas (os drones) são regulamentadas, fiscalizadas e precedidas de diversas exigências e licenças ambientais.
A federação ainda destaca a eficácia de tais ferramentas no controle de pragas nas lavouras, “devido à rapidez no tratamento, menor custo e mitigação de riscos de contaminação ambiental e humana, já que reduz a quantidade de defensivos, [sendo] gastos 1/8 comparativamente com o Japão”.
Para a Faes, a pulverização via drones obedece a critérios de economicidade, segurança alimentar e sustentabilidade.
O deputado federal Evair de Melo (PP) também registrou sua posição contrária ao projeto. Natural de Venda Nova do Imigrante, ele é ex-presidente do Incaper.
Discordâncias entre Coser e Iriny/Camila
Essa não é a primeira vez que Coser diverge de Iriny e Camila Valadão, pontualmente, na análise do mérito de propostas em discussão no Parlamento Estadual. Juntos, os três formam uma bancada bem minoritária: num universo de 30 deputados, são os três únicos muito visivelmente identificados com o campo progressista de esquerda.
Coser e Iriny são os dois únicos integrantes da bancada do PT, liderada por Iriny. Mas, dependendo do projeto, o ex-prefeito de Vitória mantém posições de esquerda, pero no mucho, ou pelo menos não tanto quanto a sua colega petista e a psolista Camila Valadão. Ocasionalmente, dá dos pasitos al centro.
Um precedente, há poucos meses, foi a discussão sobre o projeto de lei do bolsonarista Delegado Danilo Bahiense (PL) com o objetivo de permitir que policiais aposentados, ao se retirarem do serviço, pudessem acautelar a arma de fogo que portavam em atividade.
Propriedade do Estado, a arma poderia ser levada pelo agente de segurança aposentado e ficar sob a sua guarda – mediante o pagamento de determinada quantia, se o Governo Estadual assim entendesse.
Coser apoiou o projeto. Iriny foi completamente contra. O governo Casagrande não encampou a iniciativa, mas ficou de construir com Bahiense uma solução alternativa, como baixar uma portaria específica sobre o tema.
Mesa Diretora cria mais cargos comissionados na estrutura da Casa
Na última segunda-feira (16), o plenário aprovou em regime de urgência, durante sessão extraordinária, projeto de resolução de autoria do presidente, Marcelo Santos (Podemos), que “transforma, extingue e cria cargos na estrutura organizacional da Assembleia Legislativa do Espírito Santo […]”.
Conforme consta na justificativa do projeto, as mudanças terão um custo adicional de R$ 28,5 mil por mês na folha de pagamento da Assembleia.
Até o fim do ano, o impacto total será de R$ 94,9 mil. Em 2024, será de R$ 379,9 mil.
Na prática, as mudanças aprovadas são as seguintes:
. Ficam criados 9 cargos comissionados de assessor júnior da Secretaria da Mesa. Cada um tem remuneração de R$ 3,5 mil, com jornada de 40 horas semanais, além dos benefícios como auxílio-alimentação de R$ 1,8 mil.
. A Secretaria de Comunicação Social é reestruturada, com seus quatro cargos de “coordenadores especiais” transformados em cargos de “supervisores”: o de Web, o de Rádio e TV, o Técnico Operacional o de Engenharia de TV e Rádio.
Com essa mudança, segundo a assessoria da Assembleia, os respectivos salários serão reduzidos, de R$ 8,2 mil (pagos aos coordenadores especiais da Casa) para R$ 5,3 mil (pagos aos supervisores).
. O cargo comissionado de coordenador especial de Contabilidade fica extinto. O cargo tinha remuneração de R$ 8,2 mil, sem gratificação. As funções do cargo serão acumuladas pelo coordenador do Setor de Contabilidade, a ser ocupado por um servidor efetivo, com gratificação de R$ 6,7 mil além do salário normal.
Explicação sumária e imprecisa
Como de praxe quando se trata de projetos de resolução – aqueles que mexem na estrutura interna da Assembleia –, esse projeto foi aprovado apressadamente, com explicações incompletas e, para dizer a verdade, incorretas, ao público que acompanhava a sessão extraordinária, tanto por parte de Marcelo como de Mazinho dos Anjos.
Ao explicar sumariamente o seu projeto, Marcelo disse: “Só para explicar pros colegas deputados, nós estamos eliminando cargos e funções que estão dentro da Casa para adequar, inclusive nas comissões. Cito, por exemplo, a comissão [de Turismo] do deputado Coronel Weliton”.
Na verdade, como consta na própria emenda do projeto, este extingue e cria cargos. Precisamente, extingue um cargo comissionado, mas cria outros nove. Saldo de oito a mais.
Já Mazinho, ao dar sumariamente seu parecer favorável à matéria como presidente da CCJ, afirmou: “O projeto é de autoria da Mesa Diretora. Não tem aumento de despesa”.
Não é bem assim.
Como extraído do próprio projeto e informado acima, a medida tem impacto de R$ 28,5 mil por mês e cerca de R$ 380 mil por ano.
Ora, a criação dos cargos pode até não vir a implicar um aumento da despesa total do Poder Legislativo, mas, para isso, esses R$ 380 mil por ano terão de ser realocados de outras despesas previstas no orçamento da Assembleia. Ou seja, para de fato não gastar mais com a medida, a Assembleia terá de cortar em outro lugar.
Maconha medicinal pode ir a votação nesta segunda-feira
Pode ser votado em plenário nesta segunda-feira (23), em regime de urgência, o projeto de lei do deputado estadual Bispo Alves (Republicanos) que institui uma política de distribuição gratuita de medicamentos à base do canabidiol, substância encontrada na maconha (Cannabis sativa), na rede pública estadual de saúde, para tratamento de diversas doenças.
Na última segunda-feira, o plenário aprovou requerimento de urgência apresentado pelo deputado Coronel Weliton (PTB), líder do bloco formado por Republicanos, PL e PTB. O projeto só não foi a votação ainda porque há vetos do governador Renato Casagrande (PSB) trancando a pauta, e o deputado Mazinho dos Anjos, presidente da CCJ, valeu-se do prazo regimental para opinar sobre eles.
Enquanto os vetos não forem votados, a pauta fica travada. Depois que forem votados, o projeto do canabidiol poderá, enfim, ser apreciado em plenário. Ele já tem parecer pela constitucionalidade, aprovado unanimemente na CCJ.
Servidores do Detran-ES terão auxílio fardamento
Também na última segunda-feira, o plenário aprovou dois projetos de lei do Executivo que beneficiam servidores estaduais.
O primeiro estende a funcionários do Detran-ES benefício concedido a agentes de segurança pública para custear a aquisição dos uniformes usados em serviço.
Professores sem bônus descontado em razão de licença por Covid
O segundo muda a forma de cálculo do tempo de serviço para concessão do bônus desempenho a professores da rede estadual. Agora, não serão mais descontadas licenças médicas tiradas por conta da Covid-19.
Sinais de afastamento entre Marcelo e Renzo Vasconcelos
Como já registramos aqui – e como o próprio presidente da Assembleia itiu –, Marcelo Santos chegou a manter tratativas avançadas para migrar para o PSD, se conseguisse se desfiliar do Podemos sem ter o mandato cassado por infidelidade partidária.
O presidente do PSD no Espírito Santo é o ex-deputado estadual Renzo Vasconcelos, que vinha mantendo bom diálogo com Marcelo. Mas há no ar um forte sinal de que os dois se distanciaram e de que as portas do PSD podem ter se fechado para Marcelo.
Na última quinta-feira (19), o presidente da Assembleia exonerou o servidor Fabricio Campostrini Batista.
Ele estava lotado no gabinete de Marcelo, como supervisor geral de gabinete parlamentar, com salário-base de R$ 4 mil por mês, mais benefícios.
Durante a legislatura ada quase inteira (2019-2022), Campostrini foi coordenador-geral do gabinete do então deputado Renzo Vasconcelos, com salário-base de R$ 8,7 mil. Em setembro deste ano, o aliado de Renzo foi “acolhido” por Marcelo. Mas a “acolhida” durou pouco.
Se a aproximação de Marcelo com o PSD tiver mesmo azedado, restam-lhe outras opções. Com recentes mudanças na divisão de poder no Podemos do Espírito Santo, o deputado decidiu ficar na sigla, ao menos por ora.
Mas uma opção quente para ele continua sendo o União Brasil, agora novamente sob a presidência estadual do secretário de Estado de Meio Ambiente, Felipe Rigoni.
