Coluna Vitor Vogas
Rigoni desiste de candidatura ao governo do ES. Saiba por quê
Coluna analisa a soma de fatores que levaram o deputado a desistir de tentar chegar ao Palácio Anchieta para ser candidato à reeleição na Câmara Federal

Deputado Federal Felipe Rigoni deixa o PSB. Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados
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O deputado federal Felipe Rigoni (União Brasil) desistiu de sua pré-candidatura ao governo do Espírito Santo. A informação foi confirmada pela assessoria de imprensa do deputado, em nota assinada por Rigoni e enviada um pouco depois das 17 horas desta quarta-feira (27). A especulação a respeito do recuo do deputado já era crescente nos últimos dias e, na manhã desta quarta, a decisão era dada como certa por fontes das mais diversas origens e procedências, incluindo operadores políticos do Palácio Anchieta e políticos que privam de excelente relação com o próprio Rigoni.
Adaptando os planos, Rigoni abandona a candidatura ao Palácio Anchieta para concorrer a mais um mandato na Câmara dos Deputados. Assim, o União Brasil, presidido por ele no Estado, fica sem um candidato ao governo nas eleições no Espírito Santo. E no momento não apoia ninguém, oficialmente, na corrida ao Palácio Anchieta.
Aventa-se a possibilidade de o presidente da Assembleia Legislativa, Erick Musso, também desistir da candidatura ao governo para ser candidato ao Senado, numa coligação entre seu Republicanos e o União Brasil de Rigoni exclusivamente na eleição para senador. Em fevereiro, Erick completou 35 anos, idade mínima exigida pela Constituição Federal (art. 14, § 3º, VI) para um cidadão brasileiro concorrer ao Senado.
Casagrande e Rigoni: reaproximação
No processo de reflexão de Rigoni, um ator influente entrou em campo. A convite de Renato Casagrande (PSB), o deputado foi ao encontro do governador duas vezes nas últimas semanas, para discutir o processo eleitoral, no qual Casagrande é candidato à reeleição. A segunda conversa é bem recente. Nos últimos dias, ambos têm se falado por telefone.
Fato é que houve uma reaproximação política entre ambos. Casagrande não chegou a pedir a Rigoni a retirada de sua pré-candidatura ao governo. Mas propôs ao jovem deputado uma reflexão sobre seu futuro político promissor e sobre suas reais probabilidades de êxito nesse pleito ao governo do Estado. A ponte entre eles foi reerguida, e o canal de diálogo, reaberto.
Pessoalmente, pelo que apurei, o próprio Casagrande já apostava que, até a próxima sexta-feira (29), um ou mais dos seus sete adversários eleitorais recuariam, a partir de uma análise fria, realista e pragmática sobre a própria viabilidade eleitoral.
Análise: as evidências que levaram Rigoni a recuar
Aos 27 anos, o engenheiro linharense com pós-graduação em Oxford se elegeu em 2018 defendendo a necessidade de se fazer políticas públicas e tomar decisões políticas com base em evidências científicas e empíricas. Ao longo do seu produtivo mandato na Câmara dos Deputados, mais que um lema, isso virou praticamente um mantra para ele.
Pois bem, se tiver parado para avaliar as evidências estatísticas (e na certa fez isso), Rigoni pôde colher, das pesquisas eleitorais, uma série de dados e evidências que de fato podem tê-lo motivado a repensar os planos originais: os números indicam que, se bancasse até o limite o projeto “governador aos 31 anos”, Rigoni poderia estar na verdade se jogando em uma candidatura kamikaze, com viabilidade limitada, e com isso interrompendo por conta própria uma trajetória ascendente no Congresso, sem ter por que ir para esse sacrifício voluntário…
O que meio mundo político capixaba se perguntava é: o que ele ganha com isso? Por que Rigoni teimaria em trocar um pássaro na mão por dois voando? Por que assumiria, sem precisar, o ônus de ficar pelo menos dois anos sem mandato (ou talvez quatro, pois qual cargo ele teria interesse em disputar nas eleições municipais de 2024?), cortando pela raiz um crescimento político certo em Brasília?
Há políticos que, mesmo com chances remotas de vitória, insistem em colocar o nome numa disputa majoritária para “perderem ganhando”, saírem maiores do que entraram e adquirirem visibilidade mirando na eleição seguinte. Não era o caso de Rigoni.
Histórico: ambições, protagonismo e pressa
De maneira precoce e surpreendente, o até então quase desconhecido linharense logrou a proeza de ser o segundo candidato a deputado federal mais votado do Espírito Santo, pelo PSB, em 2018, graças a uma campanha barata que soube usar com eficácia os recursos da comunicação digital, coordenada por Victor Casagrande, filho de Renato Casagrande e um dos melhores amigos de Rigoni.
Na Câmara, o novato não fez feio nem se intimidou por ter pouca idade nem por ser deficiente visual. Discorde-se o concorde-se com ele, o primeiro deputado cego do Brasil não se furtou a participar dos debates mais importantes travados no Congresso, tendo assumido protagonismo em alguns deles.
“Adotado” pelo então presidente da Câmara, Rodrigo Maia, relatou projetos importantes, como o que criou o novo marco do saneamento básico no Brasil. E tomou parte em discussões fundamentais, como a do financiamento da educação no país, a da agarrada reforma tributária e a da reforma da Previdência proposta pela equipe do ministro Paulo Guedes.
“Liberal por inteiro”, como se declara, na economia e nos costumes, Rigoni votou a favor do projeto de Guedes, o que o colocou em pé de guerra com o próprio partido. Após ter sido punido pela cúpula nacional do PSB, ficou inconformado e recorreu ao TSE, pedindo o reconhecimento da justa causa para trocar de sigla sem perder o mandato. Em 2021, teve o pedido acolhido.
Rigoni então já nutria planos ambiciosos de chegar ao Palácio Anchieta, sem esperar as eleições seguintes (na verdade, pouco depois de se eleger deputado, ele declarou à imprensa que seu sonho é se tornar presidente da República: definitivamente, ele não pensa pequeno).
Aprendendo a lição com sua agem traumática pelo PSB, Rigoni entendeu que, para concretizar seus planos audaciosos, precisava o mais rápido possível encontrar um partido para chamar de seu no Espírito Santo. Encontrou isso no União Brasil, legenda de direita resultante da fusão entre o DEM (antigo PFL) e o PSL (pelo qual Bolsonaro elegeu-se presidente em 2018).
No fim de 2021, sob as bênçãos do presidente nacional, Luciano Bivar, Rigoni ingressou na nova sigla. Na segunda semana de março, vencendo uma queda de braço com o ex-senador Ricardo Ferraço (que logo depois voltaria para o PSDB), o deputado garantiu para si o cargo de presidente estadual e o controle do União no Espírito Santo: um entrave a menos para a sua pré-candidatura ao governo. Pouco depois, em 14 de março, anunciou-a à imprensa capixaba.
E o fez ao estilo Rigoni: de modo bem audacioso. Mas talvez tenha ado um pouco do ponto dessa vez. O discurso impactante com que ele entrou na pré-campanha soou um tanto pretensioso: com 30 anos de idade e menos de quatro de vida pública, anunciou não só a necessidade de renovação política no Estado (até aí, ok), mas também “o fim do ciclo político de duas décadas de revezamento de Paulo Hartung e Casagrande no poder no Espírito Santo”.
Hartung, ao que tudo indica, já desencarnou de disputas eleitorais no seu estado. Mas Casagrande, como todos sabiam, seria (como agora é) candidato à reeleição. Na prática, Rigoni vaticinou, com sete meses de antecedência, a derrota do atual governador nas urnas… sem ter combinado com os eleitores capixabas.
Isolamento partidário e pesquisas ruins
De lá para cá, a pré-campanha de Rigoni não chegou a deslanchar nem a empolgar, nem política nem estatisticamente. No primeiro aspecto, o deputado estava isolado. Ok, com uma das maiores cotas do Fundo Eleitoral, o União Brasil tem dinheiro público que dava e sobrava para financiar sua campanha majoritária. Mas, contradizendo o nome, o União não se uniu a mais ninguém: até esta quarta, nem um partido sequer havia se coligado ao de Rigoni. Quase todos já correram para outros pré-candidatos.
Quanto às evidências estatísticas, pesquisas Ipec e Big Data publicadas em maio, respectivamente, pelos colegas dos sites A Gazeta e Folha Vitória, indicavam uma estagnação de Rigoni em um patamar longe de animador: 2% e 3% das intenções de voto na estimulada, respectivamente.
Não era só uma questão de largar muito de baixo. Era também olhar para cima e avaliar o tamanho da montanha que ele precisaria escalar, em uma campanha de tiro curtíssimo (estamos a pouco mais de dois meses do 1º turno): as mesmas pesquisas evidenciam que essa disputa tem um absoluto favorito: Casagrande, que marcou, respectivamente, 42%e 44% das intenções de voto. Uma coisa é você partir com 3% em uma disputa pulverizada; outra é largar com 3% numa luta de Davi contra Golias.
Pode-se acenar com o poder da equipe de Rigoni em usar as suas redes sociais e argumentar que ele poderia repetir o case de sua eleição a deputado em 2018. Mas convenhamos: é muito diferente. Uma coisa é usar as mídias digitais para se popularizar em tempo recorde e alcançar seu objetivo numa campanha proporcional em que você pode se eleger com 50 mil votos ou até menos; outra coisa é fiar-se nas redes sociais numa campanha majoritária em que, para ser bem-sucedido, você precisa de pelo menos 1 milhão de votos. Redes sociais não fazem milagres.
Faixa da direita congestionada
Por último, mas não menos importante, Rigoni não estaria lutando só contra a máquina do governo estadual. Dentro da própria faixa em que ele concorreria (a do centro da pista para a direita), existe, como já assinalei aqui, um excesso de candidatos que é flagrante e, sinceramente, não muito inteligente, na medida em que só beneficia o próprio Casagrande.
Enquanto este eia solitário e tranquilão na faixa do centro para a esquerda (e ainda mantém uns aliados de direita para “roubar” uns votos do outro lado), Rigoni precisava se acotovelar na luta por espaço com ninguém menos que Manato (PL), Erick Musso (Republicanos), Guerino Zanon (PSD), Aridelmo Teixeira (Novo) e Audifax Barcelos (Rede). É gente demais disputando com um governo que, como evidenciam as mesmas pesquisas citadas acima, não está mal avaliado pelos capixabas de modo geral.
Em meio a essa polifonia de candidatos do centro à extrema-direita, qual é o discurso que restava a Rigoni? Qual é o filão em que ele poderia entrar? Que faixa do eleitorado ele poderia conquistar em cerca de 45 dias de campanha oficial?
E se ele “descer” para deputado?
Por outro lado, voltando ao “futuro promissor” de Rigoni, ao “descer” para deputado federal, na certa ele desagrada aos seus pré-candidatos ao mesmo cargo que aceitaram entrar no União Brasil e compor a chapa a convite dele mesmo (a exemplo do médico Gustavo Peixoto e do jornalista Wesley Sathler).
Ingressando nessa chapa (sem ele, pouco competitiva), Rigoni a automaticamente a ser o puxador de votos e favorito absoluto para ser o candidato a deputado federal eleito pelo União Brasil, que dificilmente fará um segundo no Espírito Santo. Nesse caso, os demais pré-candidatos podem se sentir ludibriados, concluindo que no fim das contas trabalharão para reeleger Rigoni (o que não era o combinado no início). Isso é algo que o deputado terá que resolver com o seu grupo.
Mas o fato é: trocando uma candidatura ao governo pela candidatura à reeleição, Rigoni troca uma quase certeza de derrota por uma altíssima probabilidade de vitória. E, em vez de queimar por vontade própria uma ascendente carreira política, tem tudo para seguir em plena ascensão.
Se já fez um mandato respeitável em sua primeira quadra na Câmara, tem tudo para exercer um segundo ainda mais vistoso, projetando-se, aí sim, para voos mais ousados. É jovem, não lhe faltarão oportunidades para disputar cargos no Executivo em pleitos futuros. Tempo é o que não lhe falta para chegar ao Palácio Anchieta… e quiçá um dia, como sonha, ao Palácio do Planalto.
Atualização
Na primeira versão desta coluna, publicada pouco antes das 17 horas, eu havia escrito que Rigoni estava a um o de desistir da pré-candidatura ao governo, que o projeto estava sob reavaliação e que a decisão poderia ser anunciada nas próximas horas ou dias. O título original era “Rigoni balança e pode desistir da candidatura ao governo”. Como o anúncio oficial, confirmando o prognóstico da coluna, foi feito logo após a publicação, atualizei o texto e o título. As razões expostas são as mesmas.
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