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Coluna Vitor Vogas

O ensurdecedor silêncio de Paulo Hartung sobre o 2º turno no ES

Enquanto ex-governador prefere calar sobre a disputa entre Casagrande e Manato, sobram especulações acerca de uma possível participação a distância, sem deixar suas digitais 

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Casagrande, Hartung e Manato

A esta altura do 2º turno, de Muqui a Mucurici, quase todo mundo que tem alguma relevância política no Espírito Santo já se posicionou sobre a eleição a governador, manifestando apoio ou a Renato Casagrande (PSB) ou a Carlos Manato (PL). Em meio a essa polifonia de vozes políticas, um silêncio ruidoso tem martelado nos ouvidos dos capixabas – ou, pelo menos, de todos que têm acompanhado de perto esta eleição: o que emana do ex-governador Paulo Hartung (sem partido).

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Na primeira disputa ao Palácio Anchieta decidida no 2º turno em 28 anos de história, ele, que já ocupou o Palácio por três mandatos e que é, sem grande controvérsia, a mais relevante figura política do Espírito Santo neste século, tem preferido manter-se silente e pessoalmente distante em relação ao pleito (frisemos o “pessoalmente”). 

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Nem adianta tentar. Todos os contatos feitos por esta coluna desde o início do 2º turno, por telefone ou mensagem de texto, nem sequer foram respondidos por sua assessoria. A ordem é mesmo calar. 

Toda essa quietude, é claro, só inflama as especulações. Há grupos que, sem brincadeira, estão fazendo até bolão sobre como Hartung vai se posicionar e, antes de tudo, se vai mesmo marcar posição. 

Do lado de Casagrande, alguns aliados do atual governador estão convencidos de que Hartung, na verdade, estaria colaborando com a campanha adversária, do ex-deputado federal Carlos Manato (PL), em seu velho estilo: sem aparecer e operando por intermédio de terceiros. 

Por esse ângulo, dizem, tirar Casagrande e seu grupo do Palácio Anchieta seria prioridade absoluta para o ex-governador, nem que isso signifique dar uma forcinha discreta para eleger um ex-deputado apoiado por um presidente de extrema-direita que ele muito criticou desde que ainda era governador. 

Como eu disse, estamos aqui no campo das especulações. Mas alguns indícios há, sobretudo quando olhamos com atenção o rol de colaboradores postados ao redor de Manato.

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A fala de Herkenhoff, Guerino, Aridelmo…

“O Paulo entrou de vez na campanha”, disse a este colunista um apoiador do atual chefe do Executivo estadual, ao ler a notícia de que o advogado e ex-secretário estadual de Segurança Pública Henrique Herkenhoff gravara um depoimento, usado pela campanha de Manato nas redes sociais e no horário eleitoral, atestando, como autor da ação do MPF que culminou com a extinção da Le Cocq, que Manato nunca chegou a ser suspeito de participação em atividades ilegais da organização. 

No cosmo político capixaba, a órbita de Herkenhoff certamente está mais próxima à do planeta PH que à do planeta Casagrande. No início de 2013, metade do primeiro governo Casagrande, ele deu lugar a André Garcia no comando da Secretaria de Estado de Segurança Pública, sob circunstâncias não plenamente esclarecidas por ninguém na época. No ano seguinte, foi advogado eleitoral de Hartung na duríssima campanha em que este, derrotando Casagrande, voltou ao Palácio Anchieta. 

É um exemplo, mas pode-se contrapor que Herkenhoff não é político, tem perfil muito mais técnico e, no depoimento em questão, chega a dizer que não está pedindo votos para Manato.

Ora, se o ex-desembargador federal não chega a ser um aliado inquestionável de Hartung, o mesmo não se pode dizer de outros soldados incorporados à linha de frente de Manato no 2º turno, começando pelo pelotão dos ex-candidatos derrotados no 1º turno. 

Como candidato ao governo, Guerino Zanon (PSD) guinou ao bolsonarismo e evitou qualquer associação de sua imagem com a de Paulo Hartung em todo o 1º turno. Mas ambos são aliados antigos, desde o primeiro governo de Hartung (2003-2006). 

Foi com o apoio do então governador que o ex-prefeito de Linhares tornou-se presidente da Assembleia, em 2007. E, por duas ocasiões, Hartung puxou o aliado para ser seu secretário estadual de Esportes.

Além disso, a campanha de Guerino contou com a atuação, na retaguarda, de Neivaldo Bragato e José Carlos da Fonseca Junior, conhecidos no meio político capixaba como discretos braços operacionais de Hartung.

> A batalha dos números de urna entre Casagrande e Manato   

Por sua vez, Aridelmo Teixeira foi candidato ao governo estadual em 2018 (pelo PTB) contra Casagrande “para defender o legado de Paulo Hartung”, como afirmou inúmeras vezes naquela eleição e também nesta, em entrevista à TV Capixaba. 

Um momento icônico e meio cômico da campanha de 2018 se deu no debate final da TV Gazeta no 1º turno. Sarcasticamente, Casagrande disse que não era Aridelmo quem falava por si, mas alguém que falava por ele, “através de um ponto”. Aridelmo levou ao pé da letra e ficou a exibir seus ouvidos vazios para as câmeras. 

Quanto a Audifax, de 2015 para cá, esteve muito mais próximo de Hartung que de Casagrande, com quem já não mantinha boa relação antes mesmo da eleição. 

O chamado de Vitor de Angelo 

Voltando a Hartung, enquanto alguns aliados de Casagrande estão convictos de que ele “está do lado de lá”, outros conservam a esperança de que o ex-governador ainda possa dar alguma palavra pública contrária à possível eleição de Manato, com base naquele argumento, mantido pela campanha do governador, de que eventual chegada do adversário e seu grupo ao poder representaria o regresso do Espírito Santo à era pré-2003, marcada por desmandos do crime organizado e corrosão das instituições estaduais. 

Por essa perspectiva, tais apoiadores de Casagrande entendem que também seria do interesse de Hartung ajudar a evitar esse “risco” de regressão e de desmanche da obra de reconstrução do Estado da qual ele teria sido o engenheiro-chefe. 

Nesse sentido, creio oportuno retomar uma declaração dada pelo coordenador da campanha de Casagrande, Vitor de Angelo, em entrevista à coluna publicada no dia 6 de outubro. A fala pode ser entendida como uma provocação a Hartung para que o ex-governador saia da moita:

“Esse [Hartung] é um nome que está associado, junto ao governador Casagrande e a tantos outros, numa construção coletiva de fortalecimento das instituições e da democracia no nosso estado. Então ele certamente está olhando para cá, imagino que com preocupação. […] Agora estamos diante de uma ameaça que ultraa a política, como era também aquela ameaça de 28 anos atrás. […] Acho que ele, como esse ator e certamente como observador da política, tem a liberdade de se manifestar. […] Cada um saberá depois de que lado da história do Espírito Santo ficou neste momento.”

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Minha conclusão

É evidente que, como todo cidadão, Paulo César Hartung Gomes tem total direito de manter seu voto em sigilo e não tem a menor obrigação de se posicionar a favor de lado A ou B.

A rigor, ele possui motivos pessoais e políticos de sobra para não declarar apoio nem a Casagrande nem a Manato. 

No caso de Casagrande, pela campanha muito pesada travada contra ele em 2014, com direito a acusações que atingiram pessoalmente a sua esposa, dona Cristina Gomes; 

No de Manato, por conta das suspeitas envolvendo a participação direta ou indireta do então deputado federal na sangrenta greve da PMES em fevereiro de 2017, deflagrada de maneira covarde enquanto ele estava “fora de combate”, ando por cirurgia de remoção de um tumor cancerígena na bexiga em um hospital de São Paulo. 

Enfim, não sou ninguém na fila do pão da política capixaba (aliás, só escrevo sobre a padaria…). Mas acho, apenas acho, que, num momento tão importante para a história do Espírito Santo, seria bom que os capixabas pudessem ouvir uma palavra daquele que, por tanto tempo, foi o dono da padaria.

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E a eleição presidencial?

Aí a história se mantém, ou seja, o mesmo silêncio. Hartung não se posicionou até agora nem a favor de Bolsonaro (o que considero completamente impossível) nem de Lula (difícil, mas não de todo impossível). 

Ainda na cadeira de governador, antes e durante a eleição de 2018, PH criticou bastante os dois lados, considerados por ele dois extremos que seriam faces da mesma moeda: populismo de direita versus populismo de esquerda. 

Por outro lado, Hartung construiu sua história política na luta contra a ditadura militar, pela redemocratização e pela preservação dos valores e das instituições democráticas do país. Apoiadores de Lula sustentam que é isso que está em jogo agora.

Em 2018, o candidato de Hartung, Geraldo Alckmin (então no PSDB, agora vice de Lula no PSB de Casagrande), ficou no 1º turno, espremido pela polarização entre o lulopetismo e o bolsonarismo. Agora se deu algo parecido: no 1º turno, ele apostou na 3ª via, que teve o mesmo fim. 

No dia 10 de junho, Hartung foi um dos cerca de 300 signatários de um manifesto intitulado “A melhor via para o Brasil”, em apoio à candidatura da Simone Tebet (MDB). No 2º turno, a senadora apoia Lula. 

Aceno de Manato

No debate com Casagrande promovido pela Rede Vitória na última quarta-feira (19), Manato fez o que pode ser entendido como uma ceno a Hartung, ou, no mínimo, uma fala de solidariedade: 

“O senhor fez tanto de 2011 a 2014 que perdeu a eleição para o Paulo Hartung”, disse ele com ironia, dirigindo-se a Casagrande. “E o senhor começou a perder a eleição quando começou a ofender a família do Paulo Hartung.”

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Vitor Vogas

Nascido no Rio de Janeiro e criado no Espírito Santo, Vitor Vogas tem 39 anos. Formado em Comunicação Social pela Ufes (2007), dedicou toda a sua carreira ao jornalismo político e já cobriu várias eleições. Trabalhou na Rede Gazeta de 2008 a 2011 e de 2014 a 2021, como repórter e colunista da editoria de Política do jornal A Gazeta, além de participações como comentarista na rádio CBN Vitória. Desde março de 2022, atua nos veículos da Rede Capixaba: a TV Capixaba, a Rádio BandNews FM e o Portal ES360. E-mail do colunista: [email protected]

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