Coluna Vitor Vogas
Da esquerda à direita: a cara ideológica do próximo governo Casagrande

Renato Casagrande e Ricardo Ferraço. Foto: assessoria da campanha de Casagrande
Como defendido aqui na coluna de ontem, o movimento de Casagrande em direção à centro-direita durante a campanha pela reeleição deve se refletir em seu próximo governo e, de modo mais específico, na composição da equipe que vai governar com ele a partir de janeiro. Sumariamente, deverá ser um governo mais ao centro, com espaço mais ou menos equivalente para forças de esquerda e de direita. Ou seja, a esquerda (incluindo o PSB) deve perder espaço; a direita tende a ganhar.
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A síntese desse equilíbrio se encontra na própria chapa Renato/Ricardo: centro-esquerda/centro-direita. Simbolicamente, o próprio vice-governador será a cara da direita no governo e dará a cara da direita no governo.
Não por acaso, notadamente durante o 2º turno, Casagrande fez questão de dar destaque a Ricardo, anunciando – quando o próprio Ricardo não o fazia – que seu vice cuidaria pessoalmente de áreas como o desenvolvimento econômico e ações na agricultura.
Longe de ser um vice decorativo, Ricardo deverá mesmo ser coprotagonista do governo. É consenso que ele será o encarregado de fazer a interlocução com o meio empresarial, mais simpático a ele que a Casagrande, buscando firmar parcerias e atrair novos negócios para o Espírito Santo.
Aliás, uma das grandes fragilidades do atual governo constatadas tardiamente pela campanha de Casagrande, mas a tempo de evitar o pior, foi no relacionamento com o empresariado capixaba, formado majoritariamente por pessoas de direita que votaram em peso em Bolsonaro, não simpatizam com a esquerda e detestam o PT.
Já no 2º turno, para conter o desmoronamento da ponte, Ricardo jogou um papel decisivo, assumindo pessoalmente essa interlocução. Foi quase como se, para os empresários, o candidato a governador fosse Ricardo.
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Também não sem motivo, esse protagonismo a ser exercido por Ricardo no governo já começa a se manifestar agora, na montagem da próxima equipe. É voz corrente que Casagrande está dividindo a tarefa com seu futuro vice, ou seja, Ricardo está tendo voz ativa nas escolhas, ou, pelo menos, em parte delas. Há quem chegue a dizer que, nessa escalação, existe a “cota do Ricardo”: alguns dos secretários serão escolhas pessoais do vice-governador eleito (naturalmente, chanceladas por Casagrande). A tendência é que isso dê feições ainda mais de direita ao mais alto escalão do próximo governo.
A mesma tendência é indicada por alguns dos nomes que, no mercado político, são considerados certos na formação da equipe, como Felipe Rigoni (possível futuro secretário de Ciência e Tecnologia) e Renzo Vasconcelos (na briga para ser secretário de Agricultura).
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Por vontade de Casagrande, Alexandre Ramalho também pode voltar para o governo (embora o próprio não queira saber mais da Secretaria de Segurança Pública). Caso Ramalho não retorne, Gilson Daniel é quem pode voltar (ele quer gerir a Agricultura ou o Desenvolvimento Urbano).
O ponto central é: são todos políticos de direita. Rigoni com seu liberalismo econômico; Gilson e Ramalho não só votaram em Bolsonaro como entraram na campanha pelo voto Casanaro.
Na mesma batida, secretários com trabalho técnico reconhecido e aprovado por Casagrande, mas extremamente identificados com a esquerda, ou sairão do governo ou poderão perder espaço na futura equipe.
Nésio e De Angelo
Uma baixa certa, já noticiada aqui, é a de Nésio Fernandes na Saúde. Em princípios de outubro, logo na primeira semana do 2º turno, atendendo a um pedido expresso de prefeitos aliados a Casagrande, o secretário foi estrategicamente tirado de cena.
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Havia, sim, arestas não aparadas e problemas de relacionamento com prefeitos, mas as “férias forçadas” do secretário também obedeceram executada às pressas no 2º turno de atenuar a identificação de Casagrande com a esquerda, a fim de escapar da arapuca eleitoral armada contra ele por Manato. E, talvez mais que qualquer outro secretário com atuação destacada, Nésio era “a cara da esquerda” no governo (muito mais que Casagrande, aliás).
Tomando ao pé da letra as respectivas siglas partidárias, se o governador pode ser considerado um “socialista”, Nésio é, literalmente, um “comunista”, filiado que é ao PCdoB. Pelo partido, chegou a ser candidato a deputado estadual em Tocantins, sem sucesso nas urnas, antes de ser convidado por Casagrande para a Sesa, no fim de 2018. Sem esconder sua militância política (e sem motivo para escondê-la), Nésio apoiou candidatos de esquerda na última eleição municipal. Entrou pessoalmente, por exemplo, na campanha do petista João Coser em Vitória, em 2020.
Também por essa identificação com a esquerda, mas esquerda raiz mesmo, Nésio foi sacrificado na campanha e, como já se sabe desde o 2º turno, suas férias são definitivas: apesar do trabalho muito bem avaliado pelo governador, ele não voltará para a equipe. A aposta é que ele seja convidado para exercer alguma função técnica no Ministério da Saúde no governo Lula (eleito, afinal de contas, também pelo PCdoB, na Federação Brasil da Esperança).
Pelo mesmo motivo, Vitor de Angelo, coordenador político da campanha de Casagrande no 1º turno, perdeu protagonismo no 2º. Ninguém fala isso às escâncaras, mas, na prática, ele perdeu o posto. Colaboradores de Casagrande consideram que ele cumpriu outro papel, importante e bem executado, na mobilização de entidades e movimentos ligados à educação. Mas deixou de ser “o” coordenador.
Assim como Nésio, Vitor é muito associado à esquerda por seus posicionamentos e sua militância política, embora não tenha filiação partidária. E, não por outra razão, Vitor é outro secretário que, mesmo tendo o trabalho aprovado por Casagrande do ponto de vista técnico, poderá perder o cargo nessa reformulação da equipe. É possível que o governador o convide para assumir outra função. Mas, diferentemente de Nésio, a mudança de Vitor não é certa.
Fato é que o próximo governo Casagrande não será mais um prédio com síndico do PSB e muitos andares ocupados pelo partido, alguns apartamentos para o centro e um puxadinho para a direita. Será um grande condomínio político-ideológico. Só o síndico é que não vai mudar.
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