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Coluna Vitor Vogas

Análise: por que Casagrande larga com tamanha vantagem na eleição?

Coluna deste domingo disseca, ponto a ponto, os fatores que explicam o amplo favoritismo do atual governador, proporcional ao desafio de seus principais desafiantes na corrida ao Palácio Anchieta

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A pesquisa Ipec publicada por A Gazeta na última quarta-feira (17) revela não só o favoritismo do governador Renato Casagrande (PSB) na largada oficial da corrida rumo ao Palácio Anchieta como, na mesma medida, o tamanho do desafio dos seus principais desafiantes, proporcional ao tamanho da distância que os separa, no momento, do atual ocupante do cargo. É sobre esse desafio comum a todos que pretendo me deter aqui hoje.

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Só para recapitular: com 52% das intenções de voto estimuladas de acordo com o Ipec, o atual governador inicia a campanha oficial com o dobro das intenções somadas de todos os seus oponentes, os quais, juntos, totalizam 26% da preferência indicada pelos entrevistados: Manato (10%), Audifax (7%) e Guerino (5%), além de 4% para os demais. (10 + 7 + 5 + 4 = 26 = 52/2)

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Como já observado aqui, favoritismo não é certeza de vitória; o quadro pode mudar; a tendência de hoje pode ser revertida amanhã; em eleição, quase tudo pode acontecer. Mas, diante desses números, a empreitada de Manato, Audifax e Guerino certmente não é fácil. Concentro-me nos três porque são os únicos que, realisticamente, reúnem condições práticas de crescer a ponto de incomodar Casagrande no decorrer do processo, até o dia 2 de outubro.

Os bons índices de Casagrande

A primeira grande dificuldade diz respeito ao patamar de aprovação do atual governo. Se Casagrande estivesse mal avaliado, politicamente fragilizado etc., seria bem mais simples o trabalho dos seus desafiantes – como mais simples é a tarefa de qualquer um que tente desbancar um governante ruim que pleiteia a reeleição. Traduzindo para termos “absolutistas”, é muito mais fácil depor um rei fraco. Mas não é o caso de Casagrande no momento.

Numa democracia, a força de um governante é medida em função do seu apoio popular. E, de acordo com a pesquisa Ipec, 49% dos capixabas avaliam o governo do socialista como bom ou ótimo. Na pesquisa anterior do mesmo instituto para a Rede Gazeta, publicada no início de maio, a istração Casagrande já estava bem avaliada. Desde então, houve, por exemplo, a Operação Decanter – que levou à prisão o ex-secretário estadual da Fazenda Rogélio Pegoretti (PSB) –, mas a aprovação do governo manteve-se sólida, no mesmo nível.

Na verdade, até melhorou um pouco, dentro da margem erro: de 47% para 49%. A imagem do governador foi preservada. Sua reprovação segue baixinha, ando de 15% para 16%, índice de dar inveja a Jair Bolsonaro. O quadro, portanto, praticamente não sofreu oscilações no último estágio pré-campanha.

Rejeição istrável

Além disso, de modo geral, a pesquisa Ipec não traz nenhum número particularmente ruim para Casagrande, daqueles de lhe tirar o sono.

É fato que ele atrai a maior rejeição entre os sete competidores. Mas, para quem já ocupa o cargo – e na verdade está prestes a encerrar o seu segundo governo –, os 24% que dizem não votar no socialista em hipótese alguma não chegam a ser um número espantoso, absurdo, anormal. Está dentro do istrável. Há quatro anos sem mandato, Manato é rejeitado por 19%.

E mais: da mesma forma que é até certo ponto esperado que o candidato à reeleição largue na frente, por conta da elevada exposição conferida pelo exercício do mandato, também se pode considerar relativamente natural que ele sofra uma rejeição maior que a dos seus adversários, exatamente pelo mesmo motivo.

São as duas faces do exercício do mandato, com seu bônus e seu ônus político-eleitoral: quem é menos conhecido tende a largar com menos votos, mas também com rejeição mais baixa. Com quem tem maior recall, dá-se o contrário.

A coligação Godzilla

A outra faceta do desafio colocado diante de Manato, Audifax e Guerino diz respeito ao gigantismo da coligação de Casagrande se comparada às dos três oponentes. Encaremos os fatos: na desgastante etapa de pré-campanha, o movimento de Casagrande – obviamente ajudado pelo privilégio de já estar pilotando a máquina, com suas benesses e a expectativa de poder que vem com ela – foi de longe o mais bem-sucedido, em termos de resultados práticos.

Como um buraco negro, ou um campo gravitacional fortíssimo, a coligação liderada pelo PSB atraiu e engoliu quase todas as maiores forças políticas do Espírito Santo, da esquerda à direita, sem “obedecer” a critérios ideológicos. Não sobrou muita coisa para os demais.

Existem mais de 30 partidos registrados no TSE, mas falemos francamente: relevantes mesmo, não chegam a 20. Dentre estes, quase todos os partidos que são alguém na fila do pão político brasileiro se inclinaram para Casagrande. No total, sua coligação reúne 11 siglas – e, afora o pequeno Pros, não são partidecos quaisquer.

Quase todos integram a “Big League”, o pelotão de elite do sistema partidário brasileiro. Além do PSB, estão lá, por exemplo, o PT (na federação formada com PCdoB e PV), o PSDB (com o Cidadania), o MDB, o PDT, o Progressistas…

Para se ter uma ideia, Casagrande pôde se dar ao luxo de descartar o tempo de TV e rádio do Podemos – dada a regra que só permite a um candidato usar o tempo dos seis partidos ou federações de sua coligação com as maiores bancadas na Câmara Federal. Para qualquer outro candidato (incluindo Manato, Audifax e Guerino), os segundos e recursos do Podemos seriam preciosos. Estão lá “desperdiçados” na coligação palaciana, sem serventia alguma para Casagrande, que está podendo “esbanjar” nesse aspecto.

Para piorar (para os demais), o União Brasil de Rigoni e o Republicanos de Erick Musso, dois partidos de maior porte que poderiam fazer grande diferença para um lado ou para outro, meio que lavaram as mãos, ou melhor, largaram de mão a eleição para governador: foram lá formar sua coligação com os pequenos PSC e Patriota, válida tão somente na eleição para o Senado, levando seu tempo de TV e recursos do Fundo Eleitoral apenas para a campanha de Erick ao Senado e para nenhum candidato ao governo estadual – em acordo de paz costurado por baixo dos panos com o próprio governador.

Assim, do ponto de vista das alianças partidárias – e do exército de cabos eleitorais mobilizados por cada um desses partidos –, a disputa ganhou contornos de um Golias (ou Godzilla) contra alguns Davis.

Enquanto Casagrande pode esbanjar com seus 11 partidos (quase todos de porte robusto), a coligação de Guerino tem o seu PSD (partido médio) e os minúsculos DC e PMB; a de Audifax conjuga quatro partidos de pequeno porte (Federação Rede/Psol, Avante e Solidariedade); Manato ficou com seu PL, partido que muito cresceu com o ingresso de Bolsonaro, além do mediano PTB, mas é só isso mesmo. É o bastante para colocá-los no radar e lhes dar viabilidade eleitoral. Mas de novo: a disparidade é grande.

“The Big House Show”, em breve na sua TV

Tal discrepância reflete-se também, proporcionalmente, na divisão do tempo do horário eleitoral de rádio e TV. A vantagem matemática a favor de Casagrande é muito similar àquela referente às intenções de voto na pesquisa Ipec. Em cada bloco de 10 minutos (600 segundos), seu programa ocupará, sozinho, 6 minutos e 14 segundos (ou 374 segundos), o que “come” quase dois terços do bloco. Portanto, também aqui, Casagrande tem quase o dobro da soma de todos os adversários. O horário eleitoral será quase “The Big House Show”.

Quantos à distribuição das inserções eleitorais (“comerciais” de 30 segundos nos intervalos da programação), o atual governador terá 611 das 980 veiculadas ao longo do 1º turno na campanha para o Executivo estadual. Novamente, quase dois terços do total.

A “blindagem” ideológica (por incoerente que seja…)

Finalmente, do ponto de vista ideológico, a coligação pilotada por Casagrande virou um tanque blindado dos dois lados: à esquerda, com a Federação “Lula Lá/Ele Não” formada por PT, PCdoB e Cidadania; à direita, com aliados que manifestamente compõem o time “Bolsonaro/Ele Sim”, a exemplo do centrãozista PP de Arthur Lira e Ciro Nogueira.

O próprio PSDB, do candidato a vice de Casagrande, Ricardo Ferraço, pode ser parcialmente incluído nesse segundo lado. Nacionalmente multifacetado, tem se convertido aqui no Espírito Santo em um partido cada vez mais à direita, sob a condução do deputado estadual Vandinho Leite.

Então, na base de apoio de Casagrande, você encontra, digamos, de um Perly Cipriano, que chegou a doar dinheiro do próprio bolso para ajudar Lula na pior, a um Vandinho Leite, presidente estadual do PSDB, que execra o ex-presidente e não vota nele de jeito nenhum. O próprio Ricardo, se bem que apoia Simone Tebet (MDB) para a Presidência, está bem mais à direita que Casagrande.

Em tempo: Casagrande apoia Lula.

Mas, ao mesmo tempo, sua ampla aliança inclui candidatos que apoiam a sua reeleição no Anchieta e a de Bolsonaro no Planalto, naquilo que a colega de A Gazeta Letícia Gonçalves espirituosamente chamou de voto “Bolso Grande”.

Não faltam exemplos no palanque do governador: os deputados federais do PP Neucimar Fraga e Da Vitória, assim como o Coronel Ramalho (Podemos), também candidato a federal, só para citar alguns bolsonaristas inveterados que apoiam o socialista na eleição estadual (e não veem nenhuma incoerência nisso).

Na manhã deste sábado (20), por exemplo, Casagrande esteve ao lado do ex-prefeito de Vitória João Coser (PT) no lançamento da candidatura deste a deputado estadual. Foi uma grande festa petista, no clube do Sindibancários, que contou ainda com a presença dos secretários de Estado mais à esquerda, como o de Educação, Vitor de Angelo, o de Cultura, Fabrício Noronha, e o de Saúde, Nésio Fernandes (PCdoB), além do sub de Saúde, Luiz Carlos Reblin (PT).

Que ninguém se espante se amanhã, em algum ato de campanha, Casagrande dividir palanque com Da Vitória, Neucimar e Ramalho – como aliás chegou a fazer diversas vezes em eventos do governo Estado afora, durante o período pré-eleitoral.

É incoerente? É. É politicamente contraditório? É. É um autêntico “balaio de gatos”, como chamaria o velho Max Mauro (cujo filho, aliás, dessa vez também está no balaio)? Sim, senhor(a), com certeza. Pode-se criticar Casagrande por tudo isso e, já que estou sincerão neste texto, também eu o faço aqui: coerência mandou lembranças, pois é um governador muito crítico a Bolsonaro que não se furta a aceitar de bom grado apoio de bolsonaristas.

Porém, diz um velho ditado que “em eleição, não se escolhe apoio”. E, para ganhar uma disputa como essa, é preciso manter boa dose de pragmatismo.

Muito bem, sendo estritamente pragmático, o movimento de Casagrande não deixa de ser inteligente, pois, como eu disse, ele blindou-se dos dois lados:

Se o criticarem por ter o PT na coligação e estar apoiando Lula, ele pode simplesmente dar um o para o lado e mostrar: “Mas vejam quem é meu vice-governador. E ali atrás, ó, naquele canto do palanque, tem o PP, tem até o Podemos que por pouco não lançou o Moro…”

“Ah, mas você está se curvando ao bolsonarismo, fazendo concessões demais a apoiadores do presidente”, poderão confrontá-lo outros.

“Mas meu candidato à Presidência é Lula e vejam ali, no fundo do meu palanque, o PT, o PCdoB…”

Casagrande deixou não só poucos partidos, tempo de TV etc. aos adversários. Deixou pouca margem de manobra retórica.

Por mais incoerente que seja essa sua estratégia…

Adendo

Com todo o respeito a Capitão Sousa (PSTU), Cláudio Paiva (PRTB) e mesmo Aridelmo Teixeira (Novo) – atrás de Sousa na sondagem do Ipec –, os três podem e vão contribuir para o debate eleitoral, mas seu teto de crescimento é muito baixo, até em função da pequenez de seus partidos. Sousa e Paiva nem sequer figurarão no horário eleitoral. Aridelmo terá bem pouco tempo e, sem alianças políticas, o Novo só lançou uma candidata a deputada federal.

Vitor Vogas

Nascido no Rio de Janeiro e criado no Espírito Santo, Vitor Vogas tem 39 anos. Formado em Comunicação Social pela Ufes (2007), dedicou toda a sua carreira ao jornalismo político e já cobriu várias eleições. Trabalhou na Rede Gazeta de 2008 a 2011 e de 2014 a 2021, como repórter e colunista da editoria de Política do jornal A Gazeta, além de participações como comentarista na rádio CBN Vitória. Desde março de 2022, atua nos veículos da Rede Capixaba: a TV Capixaba, a Rádio BandNews FM e o Portal ES360. E-mail do colunista: [email protected]

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