Coluna Vitor Vogas
Volta triunfal: Casagrande dá cargo para velho aliado no governo
Após ar oito anos inelegível e recuperar os direitos políticos, Frei Paulão é reabilitado pelo governador e agora vai rezar a cartilha do Detran-ES

Frei Paulão (à esquerda) cumprimenta Casagrande (ao centro). Crédito: Reprodução Facebook
Prefeito de Muqui de 2001 a 2008, secretário estadual de Cultura em 2011 e quase subsecretário de Aquicultura e Pesca em 2019, José Paulo Viçosi, o Frei Paulão (PSB), está de volta ao Governo Estadual. Ele foi nomeado pelo governador Renato Casagrande (PSB) para exercer o cargo comissionado de diretor de Segurança no Trânsito, no segundo escalão do Detran-ES, órgão comandado por outro correligionário, o ex-deputado federal Givaldo Vieira (PSB).
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Aos 62 anos, Frei Paulão acaba de recuperar o pleno gozo dos direitos políticos, no último domingo (30), após ar oito anos sem poder disputar eleições por ter sido enquadrado na Lei da Ficha Limpa. O ex-prefeito tornou-se inelegível por ter tido contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), no contexto da Máfia dos Sanguessugas.
O órgão identificou irregularidades em um convênio celebrado pela Prefeitura de Muqui com o Fundo Nacional de Saúde (Funasa) para a aquisição de ambulâncias. Isso em 2004, último ano do primeiro mandato de Paulão como prefeito da cidade. A condenação foi confirmada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Como se não bastasse, em outra frente, o aliado de Casagrande também teve contas dos tempos de prefeito rejeitadas pela Câmara Municipal de Muqui, no ano de 2015.
Como explica o próprio Frei Paulão, os oito anos de inelegibilidade, contados desde a rejeição das suas contas, expiraram no último domingo (30). Desde então, ele voltou a ser considerado ficha limpa pela Justiça Eleitoral: à luz da legislação brasileira, está autorizado a voltar a disputar mandatos.
A Lei da Ficha Limpa é federal e não impede quem nela se enquadre de ocupar cargos comissionados em governos estaduais. O problema adicional para Frei Paulão foi uma lei estadual sancionada em 2012 pelo próprio Casagrande, seu parceiro político, no primeiro governo do PSB no Espírito Santo. A Lei 9.891 estendeu os efeitos da Ficha Limpa para a nomeação de servidores na estrutura do Governo do Estado.
Assim, pelos critérios vigentes desde então, pessoas consideradas inelegíveis não podem ocupar cargos ou funções de confiança na istração pública direta e indireta no Espírito Santo, tanto no Poder Executivo como no Legislativo.
Era o caso de Frei Paulão.
Bateu na primeira trave
Por esse motivo, em janeiro de 2019, o ex-prefeito de Muqui bateu na trave pela primeira vez no Governo Estadual. Era o comecinho da segunda istração de Casagrande, e Frei Paulão chegou a ser nomeado pelo governador como subsecretário de Aquicultura e Pesca, no dia 9 daquele mês.
À época, a imprensa local tratou de “lembrar” o governo Casagrande da lei estadual editada pelo próprio governador em 2012, contrariada pela nomeação do ex-prefeito, àquela altura ainda inelegível.
Para evitar um constrangimento ainda maior e não levar o governo a violar a própria legislação, Frei Paulão acabou recusando publicamente o convite, “devido às dúvidas legais surgidas em torno do meu nome”, como informou, em nota, no dia 17 de janeiro de 2019. “Eu não sabia da lei estadual”, disse à coluna nesta quarta-feira (2).
Com a porta fechada no governo, Paulão então foi acolhido como assessor parlamentar do deputado federal Ted Conti (também do PSB e, aliás, também muquiense), ficando lotado em seu gabinete de abril de 2021 a 29 de março do ano ado. No dia seguinte, migrou para o gabinete de Paulo Foletto (adivinhem o partido), quando esse retomou o mandato na Câmara Federal. Ficou no cargo até 31 de janeiro deste ano (quando acabou o mandato de Foletto na legislatura 2019-2023). Seu salário bruto era de R$ 4.173,30.
Bateu na segunda trave
Já em fevereiro deste ano, Frei Paulão bateu na outra trave. Como relata o próprio ex-prefeito, os oito anos de inelegibilidade por conta da condenação no TCU completaram-se no dia 10 de dezembro do ano ado. Liberado dessa primeira amarra, ele chegou a ser nomeado por Casagrande, no dia 6 de fevereiro, para o cargo comissionado de diretor técnico do Detran-ES. No entanto, não chegou a tomar posse, pois ainda persistia a outra trava: o prazo de oito anos a contar da rejeição de contas na Câmara de Muqui.
Vencido esse derradeiro prazo no último domingo, o governador não perdeu tempo, chutando logo a bola para as redes dessa vez: três dias depois da liberação, o Diário Oficial trouxe o ato de nomeação do fidelíssimo aliado do governador, como diretor de Segurança no Trânsito do Detran. É o mesmo cargo para o qual ele chegara a ser nomeado em fevereiro, mas que mudou de nomenclatura por meio de decreto baixado em abril. Para exercê-lo, o ex-prefeito terá remuneração de R$ 9.095,88 por mês, além de vale-alimentação de R$ 600,00.
Como prova a insistência de Casagrande, em seguidas tentativas de levar Paulão de volta para sua equipe, o governador faz questão de prestigiar e reabilitar politicamente o aliado, após o cumprimento da “quarentena forçada”. Os dois inclusive conversaram ontem (1º). Frei Paulão comemora:
“Agora estou reabilitado nas duas frentes. Não há mais nenhum impedimento. O governador me fez o convite pessoalmente e aceitei para, com minha experiência e meu conhecimento, dar a minha contribuição para melhorar o trânsito no Espírito Santo. Tenho conhecimento, disposição e bagagem para contribuir.” O ex-prefeito diz manter excelente relacionamento com o diretor-geral do órgão, Givaldo Vieira.
Sobre suas atribuições específicas no cargo, Paulão afirma que ainda traçará um planejamento com Givaldo, mas que sua atuação será relacionada a “sinalização vertical e horizontal, convênios com municípios e, principalmente, educação no trânsito”.
O ex-prefeito dará expediente na sede do Detran-ES, localizada na Avenida Fernando Ferrari, em frente ao campus de Goiabeiras da Ufes. Nos fins de semana, voltará para Muqui, município do sul do Estado, com 13.745 habitantes (Censo/2022).
Para poder tomar posse, ele precisou apresentar mais de 20 documentos, entre os quais as certidões de “nada consta” emitidas pelo Tribunal de Contas do Estado (TCES) e pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE-ES).
Planos eleitorais
Considerado um companheiro muito querido, político carismático e muito bom de voto por correligionários no PSB, Frei Paulão, agora novamente “elegível”, volta a nutrir aspirações eleitorais. Por sinal, mesmo após a rejeição das contas pelo TCU, ele chegou a disputar e vencer novamente a eleição para prefeito de Muqui em 2016. Ganhou, mas não levou. Como estava enquadrado na Lei da Ficha Limpa, foi impedido de assumir pela Justiça Eleitoral.
Frei Paulão tem história no PSB. Atualmente, é o 2º secretário de Finanças do Diretório Estadual. Filiado no ano 2000 ao partido de Casagrande, ele nunca pertenceu a outra sigla. Um colega dele nas fileiras socialistas o define como um “fenômeno eleitoral” em seu reduto, concentrado em Muqui e adjacências: “Em Muqui ele é o cara”.
Sem falsa modéstia, o próprio Paulão dá números que confirmam o bom desempenho nas urnas: “Disputei seis eleições em Muqui. Ganhei cinco”. Quatro foram disputadas por ele mesmo (ganhou em 2000 e 2004; perdeu em 2012; ganhou sem levar em 2016).
Em 2008, o ex-prefeito lançou e apoiou seu sucessor, Nicolau Neto (PSB), que era seu secretário de Planejamento. Já na última disputa municipal, seu apoio pessoal foi decisivo para o triunfo do atual prefeito, o ex-vereador Cacalo (PSB), destacando-se na campanha como o principal cabo eleitoral do afilhado político.
Com lealdade a Casagrande e ao partido, Paulão não ficou parado nesses últimos seis meses em que esteve sem cargo algum. Usou esse tempo para ajudar a construir as chapas do PSB e de partidos aliados para as próximas eleições em municípios do Caparaó e da região sul em geral.
Agora, a dúvida que fica – inclusive dentro do PSB – é quem será o candidato da sigla a prefeito de Muqui no ano que vem: o atual prefeito, Cacalo, em tese tem a preferência para concorrer à reeleição. Em tese.
Frei Paulão até tenta disfarçar a vontade acumulada de voltar a disputar a prefeitura, agora que não encontra impedimentos. Tenta sem muito sucesso: “Estou apto para isso. Essa discussão ainda não entrou em mim, mas quem indica a preferência é o povo. Tenho um bom relacionamento com Cacalo e disposição para as duas coisas: disputar a prefeitura ou apoiá-lo”.
Ficou ruim para o Cacalo.
Atribuições oficiais
Segundo a assessoria do Detran-ES, como diretor de Segurança no Trânsito do Detran-ES, Frei Paulão terá entre suas competências:
“Prover, planejar, coordenar, controlar, executar e avaliar o funcionamento e os resultados das atividades técnicas do Detran/ES nas áreas de Engenharia, Educação e Segurança de Trânsito, compreendendo estudos, pesquisas e projetos de sinalização e geometria viária, estatísticas de ocorrências de trânsito e planejamento e execução de atividades de fiscalização de trânsito, visando à consecução dos objetivos delegados pelo diretor-geral”.
