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Coluna Vitor Vogas

Vereador do PT em Cariacica sairá do partido e já tem a porta aberta

André Lopes recebeu carta branca de Jack Rocha para se desfiliar e justa causa reconhecida por juíza eleitoral. Seu destino já está bem encaminhado

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André Lopes ao lado de Lula. Foto: Reprodução Facebook

Aos 35 anos, o vereador André Lopes sairá do PT, onde milita desde os 14. Atualmente, ele é o único vereador do partido de Lula em Cariacica e um dos dois únicos em toda a Região Metropolitana da Grande Vitória. A partir da formalização da saída, restará apenas Karla Coser, vereadora de Vitória, como representante do Partido dos Trabalhadores nas Câmaras Municipais da região.

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A desfiliação de André é uma questão de tempo. Para ele sair sem risco de perder o mandato, a própria direção estadual do PT já lhe abriu a porta, em decisão de março. E em outra, ainda mais recente, a Justiça Estadual a escancarou para ele.

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Sem espaço nem ambiente no PT, André já estava decidido a se desfiliar há algum tempo. Desde 2020, nutre profundos desentendimentos com o grupo político que comanda a legenda no Espírito Santo: a corrente interna encabeçada pelo deputado estadual João Coser e, destacadamente, a da deputada federal Jack Rocha, presidente do partido no Espírito Santo desde 2019.

A princípio, à luz da legislação eleitoral, o mandato de um vereador ou de um deputado não pertence ao mandatário, mas ao partido pelo qual se elegeu. Assim, vereadores não podem se desfiliar sem justa causa, a não ser no período da “janela partidária”, aberta durante um mês, a sete meses da eleição municipal. Se saírem fora do prazo, correm o risco de ter o mandato cassado pela Justiça Eleitoral por infidelidade partidária. A ação de perda do mandato pode ser ajuizada pela direção do partido, pelo suplente do vereador ou pelo Ministério Público.

No caso concreto, mesmo decidido a sair, André inicialmente só poderia fazê-lo em março do ano que vem, quando se abrirá a próxima janela partidária, precedente ao próximo pleito municipal.

Contudo, a partir de um acordo político costurado pelos respectivos advogados, a Executiva Estadual do PT concedeu ao vereador no dia 14 de março uma “carta de anuência”, a qual, em termos legais, equivale a uma liberação, uma “carta branca” para ele se desfiliar, com a garantia formal de que a direção partidária não vai reclamar o mandato à Justiça Eleitoral.

De posse do documento, o vereador moveu uma ação no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-ES), pedindo o reconhecimento legal de justa causa para sair do PT sem realmente correr nenhum risco de cassação.

Na “ação declaratória de justa causa para desfiliação partidária”, ele também alega ter sido vítima de “grave discriminação política pessoal” de parte da direção do PT no Espírito Santo – uma das hipóteses itidas pela lei eleitoral como “justa causa” para desfiliação de vereadores e deputados a qualquer tempo.

No tribunal, a relatora da ação de André Lopes é a juíza de 1º grau Isabella Rossi Naumann Chaves. No último dia 12, acolhendo um pedido da defesa do vereador, representado pelo advogado Fernando Dilen, a juíza reconheceu liminarmente (em caráter de urgência) a justa causa para ele se desfiliar, antes mesmo da análise de mérito.

Como relatora da ação, a magistrada ainda vai formular e apresentar seu voto aos colegas no Pleno do TRE-ES, que ainda vai julgar o mérito da causa de André Lopes. Tecnicamente, porém, com essa decisão liminar, o vereador já pode se desfiliar do PT hoje mesmo se assim quiser, encaminhando o ofício correspondente ao partido.

Entretanto, por extrema precaução, ele só pretende fazer isso após o julgamento do mérito, na expectativa de que o colegiado do tribunal confirme o reconhecimento da justa causa. Como por ora ele só tem nas mãos uma autorização liminar, que em tese pode ser revertida, receia que o seu suplente ou o Ministério Público ingressem com pedido de cassação caso ele formalize sua desfiliação munido apenas de uma decisão provisória.

De fato, há precedentes de vereadores que saíram da sigla de origem respaldados por uma carta de anuência fornecida pela direção estadual e, mesmo assim, sofreram ação de perda do mandato movida pelo respectivo suplente. Em Vitória, o vereador Luiz Emanuel saiu do Cidadania em dezembro após receber da direção estadual da sigla uma carta de anuência. Não conformado, seu primeiro suplente, o ex-vereador Leonil Dias (Cidadania), pediu o mandato ao TRE-ES.

Advogado: “Já pode sair amanhã”

Apesar dos cuidados redobrados de André Lopes, seu advogado já não tem nenhuma dúvida quanto ao êxito da causa. Fernando Dilen assegura que o vereador vai sair do PT e está convicto de que o julgamento no Pleno do TRE-ES só vai confirmar a decisão liminar já expedida – até por conta da carta de anuência, maior trunfo na manga dos dois.

“Ele já está livre para buscar outro partido. Já pode ingressar em uma nova agremiação sem o risco de perder o mandato. Mas, por uma questão de precaução jurídica, vamos aguardar o Ministério Público se manifestar para formalizar a saída dele do PT. De todo modo, ele já está livre para sair. Pode fazê-lo amanhã, se quiser. Já está tudo alinhado com a direção do partido. É só uma questão de botar no papel”, explica Dilen.

O novo destino

Como seguro morreu de velho, André Lopes prefere esperar – mas não parado. Enquanto aguarda a conclusão de um julgamento que tende a lhe ser favorável no TRE-ES, tem recebido convites e negociado com outros dirigentes a sua transferência partidária. Duas coisas são certas:

A primeira é que, após dois mandatos seguidos na Câmara de Cariacica, ele disputará a próxima eleição municipal.

A segunda é que, apesar das rixas locais com adversários internos no PT, ele segue apoiando o governo Lula e militando no campo de centro-esquerda. É justamente para uma sigla desse campo que o vereador pretende migrar. Em seu horizonte, os destinos preferenciais são o PDT e o PSB – hoje um o à frente.

No ano ado, André apoiou fortemente a reeleição de Renato Casagrande (PSB) e ajudou a organizar a campanha do governador em Cariacica.

André x Jack Rocha: da união decisiva à decisão de se desunirem

Como registra a relatora do processo movido por André Lopes, o vereador e os atuais dirigentes do PT enfrentam “crise política”, e não é de hoje.

André é presidente do PT em Cariacica – cargo do qual também está se despedindo. No multissegmentado universo petista, pertence a um pequeno agrupamento chamado “Na Luta, Ruas e Redes”. Embora bem modesto, esse grupo cumpriu um papel decisivo na definição da acirradíssima disputa pela presidência estadual do PT no último congresso estadual da sigla, realizado em 2019.

Na ocasião, a presidência foi disputada por Jack Rocha, da corrente CNB, aliada no processo à Alternativa Socialista, de João Coser, contra o deputado federal Helder Salomão, apoiado por outras tendências. Na votação dos convencionais, a eleição foi decidida voto a voto.

Nesse contexto, o pequeno agrupamento de André tornou-se o fiel da balança, e seus pouquíssimos votos aram a valer ouro. Na linha de chegada, André levou seus votos para Jack Rocha, em um movimento determinante para sua vitória sobre Helder, garantindo-a por margem mínima.

Com uma aliança tão decisiva, tudo levava a crer que os grupos de Jack e André manteriam a parceria na istração da primeira. Ledo engano.

Logo no início da atual gestão do Diretório Estadual, os dois lados aram a se desentender. O vereador de Cariacica alega ter sido excluído da condução do Diretório, onde as poucas cadeiras a que seu grupo tinha direito teriam sido tolhidas.

Ele também ficou insatisfeito com a escolha da educadora Célia Tavares, aliada de Helder Salomão, para concorrer a prefeita de Cariacica em 2020, em detrimento dele próprio, que aspirava à legenda.

No ápice das divergências internas, André também acabou alijado do processo eleitoral de 2022. Apresentava-se como pré-candidato a deputado estadual, mas, em convenção estadual realizada no começo de agosto, a direção do partido nem sequer o incluiu na chapa do PT, sob ruidosos protestos do seu grupo.

Para culminar, desde o ano ado, o segundo do seu atual mandato na Câmara, André ou a se considerar membro da base e a votar como aliado do prefeito de Cariacica, Euclério Sampaio (União Brasil). No PT, entretanto – sobretudo no grupo de Helder e Célia –, o sentimento predominante é de oposição ao atual prefeito, visando ao lançamento de candidatura própria contra ele em 2024.

Na soma dos fatores, o melhor caminho para os dois lados foi mesmo o do divórcio amigável na Justiça.

Por que pediu se não é pra sair logo?

Este é só um pormenor no quadro maior, mas uma questão jurídica que fica é: se André Lopes não tinha tanta urgência em sair do PT e prefere esperar o julgamento do mérito da ação no TRE-ES para fazê-lo, por que então ele pediu o reconhecimento liminar da justa causa?

Em seu despacho, a própria juíza Isabella Chaves argumenta que a concessão da liminar é importante para que André não se prejudique politicamente e tenha assim tempo hábil para preparar sua próxima candidatura.

Afinal, o timing da Justiça não costuma ser o da política.

“No que toca ao perigo da demora, [a defesa] sustenta que a não concessão da tutela antecipada significaria dano irreversível à participação do Autor nas eleições de 2024, haja vista alegar que os pretendentes ao cargo de Vereadores já estão formando grupos visando ao próximo pleito. […] E o perigo da demora pode ser caracterizado em razão da importância da construção de uma identidade política junto ao eleitor, que tem no tempo fator essencial, especialmente se isso se der às vésperas de um ano eleitoral, de modo que eventual demora na entrega jurisdicional pode causar ao pretenso candidato dano irreparável”, avalia a relatora da ação.