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Coluna Vitor Vogas

Troca no Turismo: preocupações e alerta sobre critérios de Casagrande

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Ao centro, Casagrande e, à direita dele, Weverson Meireles. Crédito: Hélio Filho/Secom

Digamo-lo desde já: apesar da pouquíssima experiência como gestor público, o jornalista Philipe Lemos (PDT) pode surpreender positivamente e realizar um bom trabalho, a partir de dezembro, como secretário estadual de Turismo. Tem a torcida de todos, inclusive a nossa, para que de fato dê conta da altíssima responsabilidade que lhe será delegada. Mas é fato que a repentina troca no comando da Secretaria de Estado do Turismo (Setur) não foi bem recebida, de modo geral, nem por integrantes do setor nem por colaboradores do próprio governo. 

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Dentro e fora da istração estadual, o inesperado anúncio do governador Renato Casagrande (PSB) causou surpresa para alguns, preocupação para outros e extrema apreensão para outros mais, não tanto por causa do substituto escolhido, mas pela imprevista saída do ainda secretário Weverson Meireles (PDT), pelo momento em que a troca é efetuada e pelos critérios que presidiram a tomada de decisão do governador.

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Respondendo pela pasta desde janeiro, Weverson era um secretário muito bem avaliado em geral, tanto por representantes do trade turístico capixaba como por sua equipe na Setur, por colegas no governo e pelo próprio chefe. Casagrande não tinha a menor intenção de o substituir agora. “Ele foi breve, mas extremamente produtivo”, atesta o presidente do Conselho Estadual de Turismo do Espírito Santo (Contures), José Olavo Medici Macedo.

Quanto ao timing da decisão, parece que não poderia ter sido escolhida pior hora para a substituição, se levados em conta unicamente os interesses específicos do setor e a necessidade de desenvolvimento da atividade turística estadual – fatores que, no plano ideal, são os únicos que realmente deveriam ser considerados na escalação do secretário responsável por conduzir as políticas voltadas para a área. 

Após anos e anos patinando, o turismo no Espírito Santo tem tudo para crescer (e precisa mesmo, urgentemente). Responsável por 6,9% do PIB capixaba, a área emprega 180 mil pessoas no Estado, segundo dados do Instituto Jones dos Santos Neves. Há no ar um conjunto de sinais de que as autoridades políticas capixabas enfim atentaram para a importância do setor como ferramenta de desenvolvimento econômico e estão sinceramente empenhadas em conferir à atividade a dimensão que ela merece.

Por uma enorme ironia que não ou despercebida pela coluna, a última segunda-feira (13), primeiro dia útil após o anúncio de Casagrande, foi o ápice da agem de Weverson, o Breve, pela Setur, e provavelmente o dia mais importante para a cadeia do turismo no Espírito Santo em muitos anos (sem exagero). 

De manhã, ao lado de Casagrande, um sorridente Weverson fez entregas há muito esperadas, em cerimônia no Palácio Anchieta, diante de empresários do setor, políticos, representantes da Findes, da Fecomércio, da Fetransportes e do Sebrae-ES. À tarde, a Assembleia aprovou o projeto de lei mais importante para o segmento turístico capixaba em décadas, formulado com a participação decisiva do atual secretário (mais detalhes abaixo).

Analisando pura e friamente o momento, é um contrassenso que esse mesmo secretário tenha sido demitido por antecipação e esteja, de certa forma, fazendo hora extra no cargo até 30 de novembro.

Por fim, as verdadeiras razões que orientaram a decisão de Casagrande não apenas preocupam como acendem um alerta geral. 

Como explicamos aqui, a troca de guarda será feita em atendimento a um pedido do prefeito Sérgio Vidigal (PDT) – o mesmo que havia respondido pela indicação de Weverson em dezembro ado. Ele precisa urgentemente voltar a contar com seu braço direito ao seu lado, na Prefeitura da Serra, a fim de se preparar para adentrar o próximo processo eleitoral. Casagrande aquiesceu.

Normalmente, fora do período de desincompatibilização, um chefe do Poder Executivo troca peças do seu primeiro escalão por estar insatisfeito com o desempenho de quem cai, por buscar um outro estilo ou uma nova abordagem para a pasta, por querer dar um rumo diferente para a área, ou até para absorver um novo partido no governo ou mudar a distribuição de forças dentro da sua equipe. Nada disso se viu aqui.

O governador simplesmente trocou um secretário de Estado, em uma área estratégica para a economia estadual, para atender a uma necessidade urgente, de cunho político-eleitoral, de um aliado em apuros. 

É preciso ponderar, é claro: não se trata de um aliado qualquer. Vidigal é antigo aliado de Casagrande e líder regional de uma das maiores forças partidárias do Espírito Santo. Seu PDT é parceiro histórico do PSB e estratégico para o grupo liderado pelo governador alcançar vitórias nas urnas no próximo pleito municipal. 

Mas fica aquela constatação incômoda de que a propensão de Casagrande a fazer concessões do tipo a aliados, por questões meramente eleitorais, é maior do que se imaginava. Está elástica demais, a ponto de ele mudar sem hesitar, ante o apelo de um parceiro, o secretário encarregado de conduzir uma área que, se antes já era importante, agora faz-se mais vital que nunca para os interesses econômicos do Estado. 

Ficou parecendo algo banal, como se estivessem mudando um vaso de lugar ou a posição de um livro na prateleira. 

E restou aquela inquietação: até que ponto o governador está disposto a conceder politicamente e renunciar ainda mais a critérios técnicos para socorrer aliados e preservar alianças? Se cedeu aqui, onde mais poderá ceder? 

A apreensão dentro do governo

Weverson vinha tendo um bom desempenho e sendo bem avaliado internamente. Mostrava muito entusiasmo com o trabalho desenvolvido na Setur.

Servidores da secretaria estão preocupadíssimos com a troca.

Na verdade, até nos altos escalões do governo, ninguém entendeu muito bem a mudança, ainda mais no momento em que se dá. O anúncio gerou incompreensão e apreensão. Muitos receiam que haja descontinuidade das políticas e desaquecimento das turbinas, num momento em que estas já estavam aquecidas e a nave, pronta para decolar. 

O próximo secretário precisará de tempo para tomar pé de tudo e se entrosar com a equipe – a qual, ao que tudo indica, não será modificada (vide nota abaixo). 

É sem dúvida um movimento temerário e muito arriscado, em um momento ruim.

O turismo, mais que nunca, precisa pocar no Espírito Santo. Por isso, os projetos e políticas da Setur precisam deslanchar. Em que pese a redução do orçamento da pasta no ano que vem, a avaliação de agentes do governo é que isso de fato estava começando a ocorrer. 

Nos seus 10 meses e meio como secretário, o trabalho de Weverson vinha agradando internamente, inclusive ao chefe, que fez questão de reconhecê-lo de público no evento no Palácio Anchieta na última segunda-feira: “Weverson está concluindo um trabalho bem-sucedido”.

O próprio evento de segunda, prestigiado por representantes do trade turístico capixaba e das federações empresariais, foi uma prova de que a Setur, sob a direção de Weverson, vinha fazendo entregas importantes.

Diante do empresariado, o secretário lançou com o governador a “Rota Estratégica para o Futuro do Espírito Santo – Turismo 2035”, grande plano para o setor. A “Rota” foi encabeçada pela Findes, em parceria com a Setur, e sua elaboração começou no governo ado. O mérito de Weverson neste caso foi garantir a finalização.

Na mesma segunda-feira, a Assembleia aprovou, com folga, o projeto mandado por Casagrande que institui a Política de Turismo Sustentável do Espírito Santo, o Plano de Desenvolvimento Sustentável do Turismo e o Sistema Estadual de Turismo. O projeto atualiza a legislação estadual sobre o setor, alinhando-o às práticas de sustentabilidade, governança e responsabilidade social. A lei em vigor, pasmem, é de 1975.

Em paralelo, o Espírito Santo acaba de ser indicado como um dos três finalistas de uma categoria do Prêmio Nacional do Turismo, principal premiação da área no Brasil, organizada pelo Ministério do Turismo. A entrega será em Brasília no dia 15 de dezembro, durante o Salão Nacional do Turismo.

Além disso, como o próprio governador não cessa de repetir, o crescimento e a qualificação dos serviços turísticos no Espírito Santo são a principal esperança do Estado para repor eventual perda arrecadatória nos primeiros anos de vigência da reforma tributária e compensar, por exemplo, o fim dos incentivos fiscais, que serão extintos em definitivo em 2032. Neste momento, o Governo do Estado não pode se dar ao luxo de patinar nem de andar para trás na Setur.

No evento de segunda no Palácio, o presidente da Fecomércio, Idalberto Moro, fez discurso na mesma linha: “O turismo será um alavancador da economia do Espírito Santo, principalmente na década de 2030, quando os incentivos fiscais deixarem de ter importância”.

O chefe do governo fazer loas a um secretário que se despede (ou é despedido) do cargo é a regra, por uma questão de cortesia. Mas a coluna apurou que as laudas de Casagrande a Weverson são sinceras: ele estava mesmo curtindo o trabalho do jovem dirigente do PDT à frente da Setur.

E não só ele. Colhemos as impressões de agentes do setor e ouvimos o presidente do Conselho Estadual de Turismo do Espírito Santo (Contures), José Olavo Medici Macedo. Veja abaixo o que ele diz:

“Troca constante incomoda. Mas não há risco de descontinuidade”

No último governo Casagrande, pelo menos três secretários aram pela Setur. No atual, em menos de um ano, já vamos para o segundo. Isso dá, em média, um novo secretário a cada ano. José Olavo reconhece que essa mudança constante de secretários não é confortável para o setor.

José Olavo Medici Macedo é o presidente do Conselho Estadual de Turismo do Espírito Santo (Contures) no biênio 2023/2024. Crédito: Hélio Filho/Secom

Dono de uma empresa de eventos há quase 30 anos, o presidente do Contures diz avaliar como “excelente” o trabalho de Weverson. 

“Foi um cara que entendeu as nossas necessidades e que deu voz ao setor. Está em tudo quanto é lugar. Tem uma equipe técnica muito boa, é preciso dizer isso. Foi ível, sempre de portas abertas. E foi nos pontos que a gente precisava.”

José Olavo destaca como exemplo o projeto de lei estadual aprovado na segunda na Assembleia. “Isso estava travado há muitos anos. Neste ano, dissemos que a lei tinha que sair. E ele foi determinante para isso. Foi extremamente sensível aos pontos que a gente precisava trabalhar.”

Sobre Philipe Lemos, Olavo diz não conhecer o trabalho dele como gestor da área e, portanto, não poder fazer uma avaliação. Afirma, porém, que sua expectativa é muito positiva:

“Não conheço Philipe como gestor, mas é uma pessoa que tem tudo também para tocar esse barco. É um cara novo, de cabeça aberta. Está numa pasta municipal de Cultura e Turismo na Serra. Isso é importante porque ele já tem noção do que é o turismo efetivamente. Ele terá um grande apoio do Weverson. Minha expectativa é muito boa.”

Para Olavo, independentemente da pessoa à frente, o mais importante é que a Setur ofereça as ferramentas públicas para o crescimento do turismo, a exemplo da lei citada. E isso, completa, já vem sendo feito: 

“No Contures e no trade como um todo, trabalhamos para termos ferramentas para não mudarmos o rumo das políticas quando acontecer esse tipo de situação. É um trabalho de formiguinha que temos feito junto à Setur. E esses instrumentos estão sendo construídos. A lei recém-aprovada será o principal deles, definindo o papel da Setur, o do Contures, estabelecendo a estrada por onde o gestor público deve trilhar. Por isso não tememos risco de descontinuidade [com a mudança de secretário], absolutamente. Agora já atravessamos a ponte. Não tem mais volta!”, exclama, otimista.

Desafio e “prova de fogo”

Convenhamos: o governador escolheu Philipe Lemos meio de olhos fechados, sem também ter lá muitas referências sobre o trabalho dele na Serra. Em entrevistas, tem dito que aposta no perfil, na juventude e no “dinamismo” do jornalista – descrito por ele assim mesmo, como uma pessoa “dinâmica”.

Já a auxiliares, Casagrande tem dito que a ascensão a secretário estadual de Turismo será um grande desafio para Philipe e seu maior teste até agora em sua recém-inaugurada trajetória na istração pública. 

Será mesmo uma prova de fogo para o jornalista. 

Vidigal também pode ter buscado blindar Philipe

Na Serra, Philipe vinha sendo fritado por alguns vereadores da base do prefeito, incluindo o presidente da Câmara, Saulinho da Academia (PDT). 

A pressão direta de vereadores sobre secretários municipais costuma ser de fato muito grande (ainda mais na Câmara da Serra). Muitos deles se consideram e agem como “donos” ou “prefeitos” das respectivas comunidades. E, sem nenhuma experiência política, Philipe não teria couro curtido o bastante para lidar com esse tipo de pressão, beirando o assédio e até ataques a ele. 

Por isso, alguns acreditam que a ida de Philipe para o Governo do Estado no lugar de Weverson também tenha sido um modo encontrado por Vidigal para protegê-lo politicamente. Na Setur ele vai sofrer pressões? Sim, é claro que vai, de gente muito mais poderosa política (deputados, prefeitos) e economicamente (empresários riquíssimos do segmento). 

Mas é uma pressão de outra ordem. Não é aquela relação direta e paroquial de vereadores, barganhando no varejo.  

Xambinho: “Deixou legado”

Na última segunda-feira, logo após a aprovação do projeto de lei do turismo, o deputado estadual Alexandre Xambinho defendeu o pupilo de Vidigal que se despede da Setur: “Weverson, no pouco tempo que ou no Governo do Estado, deixou o seu legado”.

Xambinho vai assumir o controle do Podemos na Serra. No município, o partido de Gilson Daniel está fechado com Sérgio Vidigal. O próprio Gilson e outros líderes estaduais do Podemos têm feito gestões para filiar Philipe ao Podemos.

Expor(-se) e vender(-se)

No evento de segunda no Palácio Anchieta, o presidente do Contures, José Olavo, fez um discurso mais breve que a agem de Weverson pela Setur, mas bem marcante em função do entusiasmo. “Produto exposto é produto vendido!”, ensinou à plateia. “Temos que expor o turismo do Espírito Santo!”

Philipe Lemos com certeza encontra bastante exposição nas mídias sociais, onde tem uma legião de seguidores. Agora caberá a ele expor e vender as atrações turísticas do Espírito Santo. Boa sorte.

Errata

Originalmente, publicamos esta coluna na quarta-feira (15) com a informação de que Philipe teria de assumir a Setur com a “porteira fechada”, ou seja, sem poder substituir nenhum ocupante de cargo comissionado indicado pelo PDT. Na realidade, ele terá autonomia para preencher os cargos de confiança diretamente subordinados ao secretário, em diálogo com Weverson, Vidigal e o PDT (já que a secretaria é “cota” do partido no governo Casagrande).