Coluna Vitor Vogas
Caso Armandinho: autor da denúncia acusa suplente de armar contra ele
Em depoimento à Corregedoria da Câmara de Vitória, Sandro da Rocha aponta assessor de Chico Hosken como quem o teria enganado. Mas processo contra Armandinho vai seguir

Sandro da Rocha depõe à Corregedoria da Câmara de Vitória. Crédito: Vitor Vogas
O autor do pedido de cassação de Armandinho Fontoura (Podemos) na Corregedoria da Câmara de Vitória, Sandro da Rocha, fez, em depoimento ao mesmo órgão na tarde de ontem (26), o que não havia feito até então: apontou (literalmente, com o dedo) a pessoa que pediu a ele para a representação contra Armandinho: Washington Bermudes, assessor de gabinete do vereador Chico Hosken (Podemos), primeiro suplente de Armandinho e, desde janeiro, substituto na Câmara do vereador preso e afastado.
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Respondendo a uma pergunta direta do corregedor-geral da Casa, Leonardo Monjardim (Patriota), Sandro apontou e nominou Washington como a pessoa que levou para ele o documento. O assessor acompanhou a oitiva de Sandro de dentro do plenário, sentado ao lado do próprio Chico Hosken. Ambos preferiram não dar declarações à coluna após o depoimento, dizendo que se manifestarão no momento oportuno.
Morador de Bairro República e dono de uma empresa no ramo de alimentação, Sandro afirma ter sido enganado pelo assessor de Chico Hosken. Segundo ele, o assessor, residente no mesmo bairro, o teria levado a acreditar que o documento que ele estava assinando não ava de um requerimento para realização de uma audiência pública relacionada à prisão de Armandinho, decretada em 15 de dezembro pelo ministro Alexandre de Moraes. Essa foi a versão mantida por Sandro diante da Corregedoria.
Na verdade, como frisou o corregedor-geral, Sandro mudou de versão algumas vezes nas últimas três semanas. No dia 5, ao aparecer de surpresa em outra reunião da Corregedoria, o empresário chegou ao plenário afirmando que não tinha assinado nada. Na mesma reunião, declarou que a pela metade o documento (teria parado no meio da ).
Depois, ou a itir que assinou o documento, pensando se tratar de requerimento para a audiência pública, mas sem individualizar quem o teria induzido a erro. Ontem, diante dos membros da Corregedoria, sustentou a última versão, acrescentando, porém, a informação crucial de que foi o assessor de Chico Hosken quem o abordou para pedir sua .
No último dia 12, Sandro chegou a protocolar na Câmara uma declaração redigida de próprio punho, na qual pediu à Corregedoria para retirar seu nome da denúncia em face de Armandinho e investigar a armação alegada por ele. Segundo Sandro, ele também registrou, ontem, um Boletim de Ocorrência relativo ao episódio – à coluna, acrescentou que o registro foi lavrado na Delegacia de Goiabeiras.
Entretanto, enganado ou não, induzido a erro ou não, autor consciente ou involuntário da denúncia, Sandro objetivamente assinou a representação e é portanto, tecnicamente, o seu autor material, conforme concluem tanto Monjardim quanto a vereadora Karla Coser (PT), relatora do processo no órgão.
Ambos, aliás, saíram do depoimento do empresário ainda mais convencidos disso, já que, embora alegue ter sido enganado, Sandro não negou ter assinado o documento a pedido de Washington.
Para Monjardim e Karla, a autoria da denúncia está configurada, tendo sido confirmada pelo próprio dono da . Os outros pré-requisitos legais para aceitação da denúncia, previstos no Código de Ética da Câmara, também foram preenchidos. “O ato jurídico é perfeito”, disse Karla. Por isso, como enfatizou Monjardim, a Corregedoria decidiu dar prosseguimento normal ao processo por quebra de decoro parlamentar já aberto contra Armandinho. E já está correndo o prazo para a defesa do vereador afastado apresentar suas razões preliminares.
“O que eu precisava saber é se você [Sandro] é o autor da representação. Isso é fato. Você inclusive ite isso. Os pré-requisitos foram cumpridos. Senão hoje nós estaríamos arquivando o processo de forma até rápida. Mas hoje a gente não discute mais a questão da autoria. A autoria está consolidada”, declarou Monjardim ao próprio Sandro.
No fim da oitiva, o corregedor-geral foi ainda mais enfático, em meio a protestos (educados) de Sandro:
“Você confirma que é o autor. Você pode não ter tido a intenção ou ter sido induzido, mas o ato você cometeu. Quando você diz ‘retire meu nome’, não cabe mais retirar o nome. O ato já está consolidado.”
“Em nenhum momento afirmei ser o autor”, protestou o empresário.
“Pode ser um autor manipulado ou um autor ameaçado, tem várias hipóteses que talvez a gente nunca descubra, mas todos os pré-requisitos foram cumpridos, inclusive o de autoria, confirmada hoje pelo senhor. O que o senhor está dizendo não anula a autoria. Intenção é uma coisa, autoria é outra”, replicou Monjardim.
“Enquanto corregedor-geral, quero aprofundar a investigação, para a gente minimamente, com muita clareza, dar uma resposta à sociedade. O ato que o senhor praticou é muito grave. Quero anunciar que, com a declaração do senhor Sandro, entendo que o processo continua tramitando”, concluiu o corregedor-geral.
Seguindo linha similar, Karla sublinhou a estranheza gerada pelo fato de Sandro ter demorado tanto para contestar a própria autoria da denúncia e de somente ontem ter ido à polícia.
“Quando você teve oportunidade de denunciar à polícia uma possível falsidade ideológica, você desistiu naquele momento. Se você foi de fato enganado, você teria que denunciar à polícia. Nós na Corregedoria não temos condições de investigar quem está com a verdade. Sandro, te respeito imensamente, mas você fez um ato jurídico perfeito: assinou um documento que dá legitimidade à representação. Já superamos essa condição, porque você não apresenta provas de que o que está dizendo é a verdade.”

No canto inferior esquerdo da foto, Chico Hosken e Washington Bermudes assistem ao depoimento de Sandro da Rocha, no fundo do plenário da Câmara de Vitória. Crédito: Vitor Vogas
Versão de Sandro não colou…
Entre os membros da Corregedoria que lhe tomaram o depoimento, a versão de Sandro sobre o “requerimento para uma audiência pública” pareceu não encontrar a menor aceitação. Tanto Monjardim como Karla Coser e André Brandino (PSC) fizeram ao empresário perguntas que, na formulação e no tom, denotaram incredulidade quanto a dois aspectos:
Primeiro, que um empresário escolarizado e vivido tenha mesmo aceitado um documento sem conhecer o seu teor e, pior, sem nem ao menos ter lido o que estava a firmar.
Segundo, que um homem politizado, que se declara ex-líder comunitário, desconheça que a realização de uma audiência pública pela Câmara de Vitória independe da de um cidadão avulso.
O mais enfático com relação a isso foi André Brandino:
“O senhor Sandro é uma pessoa escolarizada e politizada. Pegar uma folha sem ler e a gente faz com uma pessoa de confiança. Então essa pessoa que fez isso com o senhor no mínimo tinha a confiança do senhor. Querendo ou não, o senhor conhece como funcionam os trâmites políticos. O que o levou a entender que somente a do senhor seria necessário para fazer uma audiência pública? Uma pessoa politizada já deve maldar quando se pede algo nesse sentido. Esta é minha interpretação. Foi o excesso de confiança que fez o senhor esse documento?”
“Fiz por uma questão de confiança”, respondeu Sandro. “Tanto é que não tenho cópia, não tenho nada. Sou da época em que a gente fazia política por política. Eu simplesmente acreditei. O meu erro foi não ter lido. E continuo afirmando: não tenho nada a ver com isso. Não fui coagido a nada. Sou um homem limpo e livre. Isto aqui é até deprimente, porque estou sendo arguido por algo que eu não fiz nem faria, porque não tem nada a ver com a minha conduta. Não tenho nenhuma motivação.”
Após a oitiva, Sandro reafirmou à coluna: “Nunca li o processo. Nunca tive o processo de cassação na minha mão. Nunca tive nada. Não tenho conhecimento de nada”.
Bastidores: amigo vira “advogado informal”, e rodinha após a audiência
O depoimento de Sandro durou pouco mais de uma hora. Além de martelar a tecla do “requerimento para audiência pública”, o depoente enfatizou que não tem nada contra Armandinho nem Chico Hosken e que nunca quis processar nem cassar ninguém. Tanto no depoimento como em entrevista à coluna, negou ter sido ameaçado, coagido ou pressionado por quem quer que seja, antes ou depois da apresentação da denúncia.
Sandro não se fez acompanhar de advogado. À coluna, disse que ainda pensa em constituir um representante legal. “Não fui orientado por ninguém. Não tenho advogado. Não posso botar alguém para me defender de uma coisa que não fiz. Tenho minha consciência limpa”, disse ele, interpelado por Karla.
Em vários momentos da audiência, ele não escondeu seu incômodo. “É insano! É ridículo!”, exclamou em dado momento. “Está sendo constrangedor, pelo amor de Deus”, reclamou, ao ser interrogado por Karla. “O que vocês puderem fazer para me prejudicar vocês vão fazer”, desabafou.
Na falta de um representante legal, Sandro pôde contar com um “advogado informal”. Amigo de Sandro, o também empresário Alessandro Potiguara acompanhou o depoimento no fundo do plenário.
Ele é o autor de um post e de um vídeo com depoimento de Sandro, feito no dia 5 de abril, sustentando a tese de que tudo não a de uma farsa da qual Sandro estaria sendo vítima. O material foi usado por Neno Bahia (Podemos), 2º suplente de Armandinho, em outra representação à Corregedoria, esta contra Chico Hosken. Nessa segunda denúncia – a qual Sandro disse desconhecer –, Sandro da Rocha e Alessandro Potiguara são indicados como testemunhas de acusação.
Potiguara foi responsável pelo momento mais insólito da sessão. Logo após Monjardim dar por encerrada a audiência, o amigo do depoente se aproximou da Mesa Diretora, pediu para usar a palavra e fez um discurso fora dos microfones em defesa de Sandro. Em seguida, Sandro, Potiguara, Karla Coser e Monjardim formaram uma rodinha e ficaram alguns minutos discutindo o caso ali mesmo, extraoficialmente.

Leonardo Monjardim conversa com Sandro da Rocha (ao centro) e com outros vereadores após a sessão da Corregedoria. Crédito: Vitor Vogas
A Mesa da sessão foi composta por Monjardim e Karla. Outros dois membros titulares também participaram: André Brandino e Davi Esmael (PSD). O último não formulou perguntas. O quinto membro efetivo, Luiz Emanuel Zouain (sem partido), não participou.
Além de Chico Hosken, também estavam em plenário os vereadores Dalto Neves (PDT), Aloísio Varejão (PSB), Maurício Leite (Cidadania) e Luiz Paulo Amorim (Solidariedade).
O presidente da Câmara, Leandro Piquet (Republicanos), chegou ao plenário por volta das 15h15, perto do fim dos trabalhos.
Chico Hosken e Washington Bermudes permaneceram sentados na última fila do plenário. Quando Sandro da Rocha apontou o assessor, o próprio declarou seu nome à Mesa, em alto e bom som.
Afinal, quem é Sandro da Rocha?
Pivô do processo contra Armandinho na Corregedoria da Câmara de Vitória e da confusão que virou este caso, Sandro Luiz da Rocha é um improvável protagonista sobre quem, na verdade, sabe-se muito pouco. Do dia 23 de março (data do protocolo da representação) ao dia 5 de abril, ele era praticamente só um nome na última página da denúncia.
No dia 5, começou a se revelar um pouco mais, quando apareceu de surpresa (e de bermudas) em outra reunião da Corregedoria no plenário. Ontem, em seu depoimento e em conversa com a coluna após a oitiva, ele deu mais detalhes sobre si.
Com 53 anos, Sandro da Rocha é morador de Bairro República e diz ter sido líder comunitário do bairro por cerca de dez anos, “de 1994 a 2005”. Ele é proprietário de uma empresa que fornece alimentação coletiva para outras empresas, chamada, segundo ele, “Mundo Brasa”. Até poucos anos atrás, era detentor de uma das franquias da rede de lojas de salgadinhos Zé Coxinha.
Sandro também é parceiro comercial da Liga Espírito-Santense das Escolas de Samba (Lieses), fornecendo alimentos para camarotes no carnaval. Foi nessa condição que, pouco antes da pandemia, chegou a fazer negócios com Armandinho. Segundo ele, sua empresa alimentou um camarote organizado pelo vereador no Sambão do Povo.
A relação com o vereador, segundo Sandro, foi apenas comercial. Mas ele disse conhecer Armandinho de longa data, pois este estudou por alguns anos com seu filho (na Escola Santa Bárbara, na Praia do Canto, conforme acrescentou à coluna).
Pelo trabalho relacionado ao carnaval, Sandro diz também conhecer há muitos anos Neno Bahia, segundo suplente de Armandinho e autor de representação na Corregedoria contra Chico Hosken, o primeiro suplente. Neno, segundo Sandro, é presidente de uma escola de samba de Itararé, na Grande Maruípe.
Sandro da Rocha tentou ser candidato a vereador de Vitória pelo PSB em 2020 (consta no site do TSE que ele teve o registro de candidatura negado). Conforme disse à Corregedoria, continua filiado ao partido. “Foi para compor chapa”, afirmou à coluna, acrescendo que se filiou “há uns três ou quatro anos”. Ainda segundo ele, essa foi a primeira e única eleição de que participou.
