Coluna Vitor Vogas
A bala de prata que Ferraço pode usar na presidência da eleição da Mesa
Entenda o preceito jurídico que pode ser evocado pelo presidente da sessão, às 15 horas, para embasar possível tentativa de transformar em secreta uma votação aberta e nominal

Theodorico Ferraço. Foto: Assembleia Legislativa
Com o acordo de bastidores firmado pelo Palácio Anchieta e por Marcelo Santos (Podemos) com Vandinho Leite (PSDB), levando-o a desistir de disputar a presidência da Assembleia, quem acaba isolado no processo, abandonado por Vandinho, é Theodorico Ferraço (PP). Além de assistir ao esfacelamento da sua chapa, Ferração terá de ver sua nêmesis política, Marcelo Santos, ascender ao topo do Poder Legislativo, lugar ocupado por ele de 2012 a 2017.
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Se tem um deputado que não estava na oposição ao governo Casagrande (PSB), mas com certeza vai entrar após esse processo (ou melhor, já entrou), é a águia de Cachoeiro de Itapemirim, independentemente dos seus laços sanguíneos com o vice-governador, Ricardo Ferraço (PSDB). Família, família, política à parte. Como disse o próprio deputado à coluna: “Ele [Ricardo] está cumprindo com suas obrigações de vice-governador e eu, com as minhas de deputado completamente independente”.
O maior dano colateral
Pode-se dizer que o pai de Ricardo Ferraço foi praticamente empurrado para a oposição, como ele mesmo afirmou à coluna. Também disse que o apoio de Casagrande a Marcelo foi, para ele, uma “declaração de guerra”. Para o Palácio Anchieta, o ingresso de Ferração na oposição é o maior dano colateral dessa eleição.
A possível bala de prata
Aos 85 anos, por ser o deputado mais idoso entre os 30 que hoje tomam posse às 10h, Ferraço é quem vai presidir a sessão da eleição da Mesa, às 15h. E que ninguém se surpreenda se ele lançar mão de alguma carta na manga ou bala de prata.
“Decidirei na hora”
Questionado pela coluna sobre como será sua condução, Ferraço respondeu: “Serei um juiz. Se levantarem alguma questão de ordem na sessão, decidirei na hora”.
Parecer técnico pedido por Ferraço
Aliás, se Marcelo tinha sobre a mesa de seu gabinete o “discurso de aclamação” ontem à noite, Ferraço tinha sobre a sua, na tarde da última segunda-feira (30), o Regimento Interno e a Constituição Estadual com anotações feitas por dois juristas recebidos por ele em seu gabinete.
Os dois, cujos nomes serão preservados, deram a Ferraço opiniões técnicas a pedido do deputado, apontando saídas jurídicas para ele.
Votação secreta x votação aberta
O Regimento Interno e a Constituição Estadual estabelecem votação aberta e nominal na eleição para a Mesa Diretora. Mas uma tentativa de proposta de votação secreta não está de todo descartada.
“Questão de ordem, presidente!”
Por exemplo, se um deputado da oposição apresentar do microfone de apartes uma questão de ordem a Ferraço, questionando-o sobre a possibilidade de votação secreta, o que o presidente da sessão dirá e fará?
“Inconstitucionalidade circunstancial”
A resposta, apurou a coluna, pode estar no artigo 53 da nossa Constituição Federal e sua interpretação pelo STF na perspectiva da “inconstitucionalidade circunstancial”, uma ideia que o ministro Luís Roberto Barroso importou dos Estados Unidos.
O artigo 53 da Constituição Federal é o que trata da inviolabilidade penal e civil de deputados e senadores por suas opiniões (preceito relativizado pelo STF em julgamentos recentes).
Em extrema simplificação, o conceito de “inconstitucionalidade circunstancial” se aplica a uma situação de fato específica cujas circunstâncias concretas tenham produzido uma norma inconstitucional. Determinado procedimento é constitucional, mas, à luz de certas circunstâncias extraordinárias, pode ser reconhecido como inconstitucional.
Se alguém realmente quiser evocar em plenário esse conceito para fundamentar uma proposta de votação secreta, um argumento que pode ser empregado é o de que o governador Renato Casagrande abriu precedente temerário e produziu circunstância nova e atípica (para não dizer inédita) ao se posicionar de maneira tão explícita acerca da decisão interna de outro Poder.
O argumento seria o de que o governador desta vez interferiu ostensivamente na liberdade de escolha dos deputados ao orientar publicamente sua base a votar em determinado candidato, gerando entre os parlamentares insegurança e medo de retaliação em caso de votação aberta e nominal (como prevê a Constituição Estadual).
Por essa via de interpretação, a circunstância excepcional criada pelo governador teria gerado a “inconstitucionalidade circunstancial” de uma norma prevista pela Constituição Estadual – logo constitucional, em princípio.
Dito de outro modo, uma norma constitucional teria se tornado, circunstancialmente, inconstitucional, na análise do caso concreto.
Uma pessoa ligada a Ferraço cita como evidência a entrevista do deputado Zé Preto para A Gazeta, publicada nesta terça-feira (31). Nela, o deputado novato do PL diz com todas as letras que votará em Marcelo simplesmente porque o governador assim pediu.
É aguardar e conferir, com enorme expectativa, o proceder de Ferraço na sessão.
