Mundo
Como surgiu e como funciona o colégio eleitoral nos EUA
Entenda os motivos de a eleição norte-americana ser indireta; e também veja como a descentralização pode atrasar a apuração
O sistema eleitoral norte-americano, baseado num colégio formado por delegados dos estados, foi criado no século 18 como forma de garantir a união das ex-colônias britânicas. Por exclusão, foi o compromisso encontrado pelos fundadores dos EUA para escolher o chefe do Executivo, numa época em que em nenhum país do mundo havia eleição direta. O sistema evidencia o pavor da escolha popular, especialmente se os 40 milhões de escravos algum dia tivessem poder de voto. O mecanismo também foi criado como uma espécie de fusível, capaz de evitar um curto circuito caso o povo escolhesse um líder populista.
A ideia também é que o colégio eleitoral mantenha o poder de estados que não teriam voz se a escolha fosse pelo voto popular – a eleição seria decidida nos grandes centros urbanos. Na prática, nas últimas décadas, o mecanismo acabou com a disputa na maioria dos estados. Redutos progressistas, como Califórnia e Nova York, viraram curral eleitoral dos democratas. Trincheiras do conservadorismo, como Oklahoma e Carolina do Sul, são dominadas pelos republicanos.
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Os estados-chave
Assim, o mecanismo concentrou a campanha em uma dúzia de estados-chave, ou estados-pêndulo, os “swuing states”, que oscilam entre um e outro partido, os únicos onde há realmente competição. Este ano, a lista de estados-chave cresce à medida que a popularidade de Trump cai. Em Flórida, Pensilvânia, Wisconsin, Michigan, Ohio e Carolina do Norte a disputa ainda é voto a voto. Mas agora, com as pesquisas apontando uma eleição apertada em estados conservadores, Arizona, Geórgia e Texas parecem ter entrado na campanha.
O colégio eleitoral também tem a vantagem da descentralização. Em caso de recontagem dos votos, o trabalho não é feito sobre a base nacional e pode ser cirurgicamente a um estado. Mas há problemas, que vão além de distorção óbvia da vontade popular – das últimas sete eleições, os republicanos tiveram mais votos em apenas uma, quando George W. Bush venceu John Kerry, em 2004.
O primeiro deles é a composição dos 538 eleitores. O número é calculado com base na população de cada estado e reflete a soma dos 100 senadores com os 435 deputados, mais os 3 representantes de Washington DC. A primeira dor de cabeça é que cada um dos 538 eleitores é um sujeito de carne e osso que deposita o voto escrito em papel, para presidente e vice-presidente, um mês após a eleição, em local determinado em cada estado.
O método não é à prova de falhas e depende do humor do cidadão na hora de votar. Muitas vezes o sujeito, como forma de protestos, escreve um nome qualquer na cédula. O fenômeno era raro. Desde 1948, havia acontecido oito vezes. Na eleição ada, em 2016, porém, dez indivíduos não votaram em Trump ou Hillary – sete votos foram validados, incluindo três que votaram no ex-secretário de Estado Colin Powell. Em uma disputa acirrada, esse tipo de gracinha pode fazer o resultado parar nos tribunais.
Pode empatar…
Outro risco do colégio eleitoral é o de empate – já que o número de eleitores é par. A probabilidade é estimada em menos de 1%, mas considerada um desastre de proporções épicas. Caso ocorra, o resultado só será definido na posse do próximo Congresso, dois meses depois da eleição. A Câmara dos Deputados escolhe o presidente e o Senado, o vice. Neste cenário, a indefinição poderia afetar os mercados e desestabilizar a maior economia do mundo, já que abre espaço para a eleição de presidente e vice de partidos opostos – caso republicanos e democratas cada um dominem, cada um, uma das Casas do Congresso.
Descentralização
Além de indireta, a eleição americana é descentralizada. Como não existe um órgão federal que padronize as regras, cada condado cria sua norma. Assim, são mais de 3 mil eleições ocorrendo ao mesmo tempo nos 50 estados. Para os eleitores, é uma bagunça. Em alguns lugares, o voto é em papel. Em outros, eletrônico. Em 33 Estados há leis que obrigam o eleitor a apresentar algum tipo de documento com foto. No Arizona, muitas vezes basta um comprovante de residência com a carteira de motorista.
As vantagens de um processo ultracentralizado é a facilidade de recontar os votos, caso seja necessário, e dificultar a ação de hackers. Especialistas dizem que, embora estados e condados estejam mais vulneráveis a um ataque cibernético, o fato de as eleições serem tão descentralizadas complica o objetivo.
Alguns estados permitem, inclusive, que o voto seja enviado pelo correio. Estima-se que os eleitores que votarão por correio em 2020 seja o maior da história. Em nove estados, este será o método exclusivo de votação. O presidente Donald Trump, crítico ao sistema, chegou a afirmar que o resultado poderia demorar “meses” para ser inteiramente divulgado.
