Dia a dia
Escola aciona Samu e polícia para conter surto de criança autista em Vila Velha
Emanuely Bertoldi, mãe da criança, conta que a mudança da diretoria da escola tem tornado cada vez mais difícil a inclusão social
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Um novo episódio mostra como a escola UMEF Marina Barcellos Silveira, em Vila Velha, está com dificuldades para promover e manter a inclusão social. Dias atrás, a suspensão de um aluno com Transtorno de Espectro Autista foi alvo de muitas queixas por parte da mãe do estudante. Agora, a coordenação da escola está envolvida em um outro caso: ela acionou Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e a Polícia Militar para controlar o surto de uma criança de 11 anos também diagnosticada com o mesmo transtorno. A Secretaria Municipal de Educação não se pronunciou sobre o caso.
Para Emanuely Bertoldi, mãe da criança, a mudança da diretoria da escola tem tornado cada vez mais difícil a relação com os alunos necessitados de algum atendimento especial. O surto e o acionamento do SAMU e da PM foi antecedido por outra decisão da diretoria: a determinação de que o menino aria a frequentar presencialmente o ambiente escolar apenas duas vezes por semana. E mesmo acompanhado da cuidadora e da psicopedagoga, as atividades ficam restritas a, no máximo, 30 minutos.
“Eu sempre fico na escola acompanhando meu filho. Agora, ele só pode frequentar quarta e quinta-feira. Ele é uma criança que gosta de atividades físicas, mas não ele não está liberado para fazer aula de educação física junto com a turma. Quando ele me questiona o motivo, eu fico sem saber o que responder. Meu filho também não consegue entrar na sala de aula. Em reunião, eu já sugeri que ele fizesse educação física com a turma, para ele conhecer os coleguinhas e, quem sabe assim, conseguir entrar em sala de aula”, diz a mãe.
Na última quarta-feira, após 20 minutos de atividades, o menino quis ir embora. Ao se aproximar do portão da escola, a criança viu que outros alunos estavam na quadra e quis se juntar a eles. Por não poder participar, o menino entrou em surto. “Ele não sabe lidar com as emoções dele. Essa é a forma que ele se expressa. Ele derrubou lixeiras e estava mesmo agressivo. Mas essa não foi a primeira vez que isso aconteceu. Eu sempre consigo contornar a situação. Ele chegou a me morder, mas quando ele começa a chorar, é sinal que está ando e eu vou conseguir colocar ele no carro. Mas, dessa vez, a coordenadora saiu trancando as salas, a quadra e nenhuma professora ou cuidadora me ajudou. Elas simplesmente me avisaram que haviam chamado a Polícia Militar e o SAMU”, relata.
Ainda segundo a mãe, o policial, ao ver que se tratava de uma criança autista em surto, se limitou a coletar os dados dela e foi embora. Já os funcionários do SAMU se viram na necessidade de conter o menino e levá-lo para o Hospital Estadual Infantil e Maternidade Alzir Bernardino Alves (Himaba). Acompanhado de Emanuely, a criança ficou internada até o início da tarde desta sexta-feira (6).
De acordo com a mãe da criança, ao chegar no hospital, o menino se lembrou de experiências já adas no local e entrou em novo surto. Para ser contido, os profissionais de saúde chegaram a amarrá-lo na cama: da boca aos pés. A alta só veio nesta sexta-feira, quando a criança finalmente pôde ir para casa e ser amparada por sua família.
“Meu filho é uma criança com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Eu faço tudo por ele. Se eu não zelar por ele, quem vai? Eu larguei meu emprego para poder estar por perto sempre. Tem horas que eu canso, claro. Mas eu vou sempre lutar pelos direitos dele. E eu não vou mais levá-lo para essa escola. Imagina o trauma em uma criança de 11 anos ar por tudo isso. Nós já fizemos reuniões com a diretoria, já nos pediram novas chances, mas agora não dá mais”, desabafa Emanuely.
Sobre o acionamento do SAMU para atendimento, está no procedimento de resguardo ao aluno que está em surto, aos demais alunos que ficam acuados e aos profissionais de educação. Os pais são sempre acionados e acompanham o procedimento de acolhimento da equipe médica ou técnica, até a unidade de saúde.
NOTA DA PMVV
A rede municipal de Vila Velha possui 110 escolas entre educação básica e fundamental. Todas as escolas possuem profissionais treinados, capacitados, com atuação e experiência de anos, na educação de crianças e jovens convencionais e especiais.
Apenas na escola citada começou, na última semana, um movimento de reclamação contra a atual direção e os profissionais de ensino. Movimento iniciado por uma mãe que teve todo amparo para sanar quaisquer dúvidas sobre medidas istrativas escolares. O histórico do filho, inclusive, foi levantado com todas as ocorrências e apresentado. Nessa sexta-feira (6) a mãe de um aluno, a Vanessa Dias os, tinha uma reunião com o secretário de Educação e não compareceu.
BANIDO DA NATAÇÃO
Outra mãe nada satisfeita com a educação especial ofertada pela escola Marina Barcellos Silveira é a Maria Meire Miranda dos Santos. Mãe de um aluno de 12 anos também diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA) severo. Ele também só pode frequentar a escola de forma presencial duas vezes por semana. Além do ensino regular, o adolescente frequentava a aula de natação oferecida pela escola em parceria com a Associação de Moradores de Araçás.
A mãe define como “grosseiro” o modo como o professor tratava a criança. “Eu sempre acompanhava as aulas. E até as outras mães estavam notando a forma com que ele falava com meu filho. O professor alega que meu filho tirava a roupa, mas isso só aconteceu uma vez. Reclamava também que ele batia muito as pernas e os braços. Dizia que meu filho ia se afogar, mas ele é totalmente capaz, ele gostava muito das aulas”, frisa Maria Meire.
O menino acabou sendo banido das aulas de natação, com a justificativa que o comportamento dele era inapropriado, mesmo com laudos de Transtorno do Espectro Autista (TEA) severo. A mãe conta que não é a primeira vez que tem problemas com a escola. O corpo docente já foi alertado sobre o fato de o menino não ar ser tocado. Apesar disso, Maria Meire relata já ter se deparado com quatro cuidadoras segurando o garoto na escola. “Ele não é agressivo. Eu tenho uma filha de 1 ano e ele não faz nada com ela. Ele só anda muito de um lado para o outro. Ele está com o tratamento todo direitinho, toma todos os remédios e faz todo o acompanhamento necessário. Mesmo assim, a escola não facilita essa inclusão, coloca empecilhos em tudo”, diz Maria Meire.
SUSPENSÃO APÓS SURTO
Também nesta semana, na segunda-feira, a mãe de uma criança de 9 anos diagnosticado com o Transtorno do Espectro Autista (TEA) denunciou que o filho foi suspenso da escola onde estuda por um surto em decorrência de bullying sofrido por ele. O caso aconteceu na mesma escola. A mãe do aluno, Vanessa Dias os, afirma ter se surpreendido ao ser chamada na escola e receber a suspensão do filho. “Os coleguinhas fizeram umas brincadeiras e ele não gostou. Ele pediu que parassem. Eles não pararam com a brincadeira de mau gosto. E nenhum professor e nem mesmo a professora de educação especial interviu para que não acontecesse o pior, que é uma crise”, cont.
Segundo a mãe, o menino perdeu o controle emocional e entrou em crise. A diretora da escola entrou em contato com os pais para buscar o aluno. Ele foi suspenso das atividades escolares. Inconformada com a situação, Vanessa buscou a Defensoria Pública e o Ministério Público. Também entrou em contato com o prefeito do município, Arnaldinho Borgo, por meio das redes sociais.
“Espero que essa seja a oportunidade de mudar a realidade da educação especial em Vila Velha. Mudanças precisam acontecer urgente. Isso não acontece só com meu filho. Eu espero ter os retornos dos órgãos competentes e que eles apurem as infrações cometidas por esses profissionais da escola”, desabafou Vanessa.
Mesmo com o fim da suspensão, Vanessa não quer que o filho retorne à escola. Para ela, esse retorno às aulas presenciais só se tornará possível com a mudança do programa didático dos profissionais com as crianças do ensino especial.
A UMEF Marina Barcellos Silveira não atendeu à reportagem do Portal ES360. A Secretaria Municipal de Educação de Vila Velha, até o momento, também não se manifestou. O SAMU também foi demandado para responder sobre a ocorrência, mas ainda não obtivemos respostas. quando houver a manifestação da escola, da secretaria e do SAMU, esse texto será atualizado.
NOTA DA SECRETARIA DE VILA VELHA SOBRE O CASO DE SEGUNDA-FEIRA
Todas as escolas municipais que tem matriculado alunos público-alvo da educação especial possuem professores e cuidadores para realizar o atendimento necessário conforme lei. O aluno, filho da Vanessa, é acompanhado durante todo seu período de permanência na escola por um profissional especializado.
Na segunda-feira (2), o aluno teve um surto e agrediu fisicamente um aluno e verbalmente os profissionais. A escola, como procedimento oficial, entrou em contato com os responsáveis para que fossem até o local. A cuidadora estava próxima ao aluno durante todo o período e não houve situação de bullying no momento citado.
Todas as penalidades do corpo discente são aplicadas de acordo com o Regimento Escolar e em conformidade com o Estatuto da Criança e do Adolescente. Obedecendo uma ordem de acordo com a gravidade, frequência e reincidência.
No caso desse aluno, a suspensão foi dada após vários registros de violência verbal e física com profissionais da escola e outros alunos. Os pais já foram chamados até a escola para reuniões anteriormente. A Secretaria de Educação faz o acompanhamento dos casos, que estão todos registrados no Sistema de Gestão Escolar.
Sobre casos de bullying:
A Secretaria Municipal de Educação trabalha de forma preventiva nas unidades de ensino da rede municipal conscientizando os alunos acerca do tema durante o ano letivo. Em caso de solicitação da escola e necessidade de se trabalhar mais intensificamente o combate ao bullying, a Equipe Multiprofissional (formada por psicólogos, assistente social e fonoaudiólogo), realiza grupos de apoio com os alunos e desenvolve dinâmicas, oficinas e rodas de conversa. Também é conversado individualmente com os envolvidos e, se tiver necessidade, a equipe faz o encaminhamento para a Unidade de Saúde.
