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Coluna Vitor Vogas

Por que as pesquisas eleitorais estão dando resultados tão diferentes?

Em entrevista ao EStúdio 360, o cientista político Fernando Pignaton chama atenção para a falta do Censo 2020, que gera distorções nas amostragens, além do “voto envergonhado” em Lula e da possível abstenção por medo da violência política

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Lula e Bolsonaro: disputa na eleição. Fotos: Redes sociais e flickr Palácio do Planalto

Qualquer brasileiro minimamente atento ao processo eleitoral com certeza já notou uma questão que tem gerado debate e inquietação: a diferença dos resultados de pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República. Mesmo entre os institutos mais renomados, tem havido variação considerável na aferição do desempenho de Lula (PT) e de Bolsonaro (PL). Para explicar essa discrepância, o EStúdio 360 Segunda Edição entrevistou, na última quarta-feira (21), o cientista político Fernando Pignaton.

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Segundo ele, uma primeira possível explicação está na não realização do Censo 2020. Devido à falta de dados oficiais e recentes sobre o perfil sociodemográfico brasileiro, cada instituto está utilizando o próprio banco de dados, baseando-se em estimativas.

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Ao realizar uma pesquisa eleitoral – ou qualquer levantamento que vise descobrir como os brasileiros opinam sobre determinado assunto –, os institutos trabalham por amostragem, que são como uma “maquete” da população brasileira, conforme a analogia feita por Pignaton.

Isso significa que, ao definir o corpo de entrevistados, cada instituto procura reproduzir, em menor escala, o retrato demográfico do país, respeitando as proporções de cada estrato na totalidade da população, de acordo com critérios como gênero, renda, escolaridade, religião e região de moradia.

Assim – e estes são números aleatórios, só para exemplificar –, se as mulheres representam 55% da população brasileira, 55% dos entrevistados na sondagem terão que ser mulheres. Se 40% da população brasileira reside no Sudeste, esse terá que ser o percentual de moradores da região no rol de entrevistados. Da mesma forma, se metade da população ganha até dois salários mínimos, metade dos respondentes deverão pertencer a essa faixa de renda.

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O problema, destaca Pignaton, é que o tamanho dos segmentos sociodemográficos está variando de um instituto para o outro, devido à falta de dados confiáveis que poderiam ser oferecidos pelo IBGE por meio do Censo 2020. Para repetir a metáfora do cientista, a “maquete” de alguns institutos (não se pode dizer ao certo quais) está ficando distorcida: uma “sala” está ficando menor do que deveria, um “quarto” maior do que caberia…

A proporção de cada estrato social influencia o resultado da sondagem, o que é particularmente sensível quando se trata do recorte por renda. Independentemente da divisão, todos os institutos convergem na conclusão de que os brasileiros mais pobres tendem a dar mais votos para Lula, enquanto Bolsonaro tem melhor desempenho entre eleitores de mais alta renda.

Ora, se determinado instituto entende, em boa-fé, que pessoas que ganham até um salário mínimo correspondem a 50% da população brasileira, a pesquisa desse instituto dará a Lula determinado resultado. Se outro instituto considera, também em boa-fé, que esse estrato de mais baixa renda não a de 30% da população total, o resultado de Lula nesse levantamento será pior que na pesquisa do primeiro. E o mesmo se aplica a Bolsonaro, com relação aos eleitores de maior poder aquisitivo.

Esse é um fator que pode nos ajudar a entender as variações entre os levantamentos dos diversos institutos ao longo do processo.

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“Voto envergonhado” e abstenção por medo

Mas há, ainda segundo Pignaton, dois fatores que podem produzir diferenças entre os resultados das pesquisas a serem publicadas no próximo sábado (5), véspera do 1º turno, e os resultados efetivamente colhidos das urnas no domingo (6).

O primeiro deles é um possível “voto oculto”, ou “envergonhado” – fenômeno do qual Bolsonaro beneficiou-se na eleição de 2018. Desta vez, no entanto, o beneficiado seria Lula (PT).

Para Pignaton, muitos eleitores que rejeitam acima de tudo a hipótese de reeleição de Bolsonaro, mas que não são exatamente fãs de Lula, podem estar engolindo em seco e se dispondo a votar no petista por eliminação, isto é, escolhendo aquele que consideram “o menos ruim dos dois” (Ciro infarta nesta hora).

Mas, ao serem entrevistados por institutos, alguns dos donos desse “voto encabulado” podem estar omitindo, ou ocultando, o voto em Lula, por vergonha de declarar o voto em um candidato sobre o qual também mantêm ressalvas.

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O segundo e último fator – e neste o cientista político coloca grande ênfase – é que a abstenção no próximo domingo pode ser bastante expressiva, acima da média de cerca de 20% observada nos últimos pleitos.

Isso em função dos muitos crimes com motivação política praticados no país inteiro nos últimos tempos, ou melhor, os muitos crimes de ódio noticiados no decurso da atual campanha, de ameaças verbais a assassinatos, neste quadro de radicalização da disputa política nacional que vivemos pelo menos desde 2014.

Para Pignaton, é possível que muitos eleitores deixem de ir votar no domingo por temerem sofrer algum tipo de violência literalmente a caminho do local de votação, ou mesmo na seção eleitoral. Nesse caso, completa o cientista político, o maior beneficiário seria Bolsonaro, pois a maior parte dos que se absteriam de votar por esse motivo seriam eleitores tendentes a votar em Lula.

Pignaton destaca que tal situação é uma ameaça à democracia. “Não é issível que eleitores deixem de votar, neste cenário de violência política exacerbada, por medo de saírem de casa para exercitar o seu direito.”

Além do alerta, ele faz uma conclamação às forças de segurança pública responsáveis por garantir a paz e a normalidade na realização do pleito:

“É preciso garantir a todos o livre exercício do direito ao voto.”

Confira abaixo a entrevista completa de Fernando Pignaton ao EStúdio 360 Segunda Edição.

Vitor Vogas

Nascido no Rio de Janeiro e criado no Espírito Santo, Vitor Vogas tem 39 anos. Formado em Comunicação Social pela Ufes (2007), dedicou toda a sua carreira ao jornalismo político e já cobriu várias eleições. Trabalhou na Rede Gazeta de 2008 a 2011 e de 2014 a 2021, como repórter e colunista da editoria de Política do jornal A Gazeta, além de participações como comentarista na rádio CBN Vitória. Desde março de 2022, atua nos veículos da Rede Capixaba: a TV Capixaba, a Rádio BandNews FM e o Portal ES360. E-mail do colunista: [email protected]

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