fbpx

Coluna Vitor Vogas

Entrevista com Contarato: “Minha candidatura não tem mais volta”

Senador afirma que “ordem para recuar” está “fora de cogitação” e endossa críticas da presidente do PT-ES ao governo Casagrande: “Nota A em saúde fiscal, mas indiferente à dor da população?”

Publicado

em

Senador Fabiano Contarato (PT) é calouro do curso noturno de Filosofia, no CCHN, Ufes. Foto: Vitor Vogas

O local da conversa com a coluna não poderia ser mais simbólico: um modesto banquinho localizado entre o IC-II e o IC-III, precisamente no coração do Centro de Ciências Humanas e Naturais (CCHN) da Ufes. Ali, o senador Fabiano Contarato (PT), professor de Direito antes de entrar na política, voltou aos “bancos acadêmicos”, mas agora novamente como aluno: após fazer o Enem no ano ado, candidatou-se a uma vaga via Sisu e foi eleito entre os calouros do curso de Filosofia.

> Quer receber as principais notícias do ES360 no WhatsApp? Clique aqui e entre na nossa comunidade!

Na noite da última quinta (19), após cerca de dois meses “mergulhado” (não só nos livros) e sem aparições públicas como pré-candidato a governador, o senador escapuliu no meio de uma aula para nos atender e concedeu a importante entrevista que segue abaixo. Dela, apreendemos que sua pré-candidatura deixou de existir somente no “mundo das ideias” (Platão) e hoje existe também no “mundo sensível” (Aristóteles): o da realidade inteligível, concreta e material.

Receba as notícias da coluna no grupo de Whatsapp do Vítor Vogas.

Quando indagado sobre o tema, o senador exibe uma segurança antes não demonstrada por ele: “Na minha concepção, não tem mais volta. Essa é uma pré-candidatura que será efetivada”, afirma, incisivo, frisando que o projeto é endossado não só pela direção estadual do PT como também pelo ex-presidente Lula e pela presidente nacional da sigla, Gleisi Hoffmann.

Contarato reconhece que, se houver decisão nacional nesse sentido, ele não terá escolha senão retirar a candidatura. Mas é categórico em dizer que tal hipótese não está mais no horizonte dele e do PT:

“Isso para mim está fora de cogitação. Na minha concepção, não vai acontecer”.

A preparação para o vestibular mais difícil de sua vida já tem data para começar de fato: no dia 11 de junho, em local a definir, será realizado um grande evento de lançamento de sua pré-candidatura pelo PT, e depois ele ará a percorrer o Estado.

Na entrevista, Contarato também endossa as críticas agudas desferidas em 21 de abril pela presidente estadual da legenda, Jackeline Rocha, ao governo de Renato Casagrande (PSB): “Não tenho dúvida de que o atual governo deixa muito a desejar na área social. Acho, com todo o respeito, que você ficar se vangloriando com uma saúde fiscal, uma nota A em saúde fiscal, a troco de quê? Tem nota A em saúde fiscal, mas fica indiferente à dor da população?”

Esperando que o senador não tenho recebido falta do professor de História da Filosofia nem perdido sua “nota A” na disciplina por culpa do colunista, apresento aos leitores as respostas dele na íntegra:

Na última vez em que nos falamos, no dia 11 de março, o senhor me disse que estava animado para ser candidato a governador, porém, se houvesse uma decisão superior, da cúpula nacional do PT, no sentido de apoiar a reeleição do atual governador e retirar sua candidatura, o senhor acataria essa resolução na mesma hora. Naquele momento, o senhor pareceu meio relutante. ados esses dois meses, mudou essa atitude? A sua candidatura ganhou força?

Eu não tenho dúvida. Aquele era um contexto. Depois daquele momento eu tive reuniões com o próprio presidente Lula, com a presidente Gleisi [a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann], com a Executiva do partido no Espírito Santo. Em nenhum momento está se cogitando essa hipótese. Hoje eu vejo como uma pré-candidatura com grandes possibilidades de se tornar uma candidatura, sim. Estamos trabalhando para isso, e estou muito animado. Acho que o Espírito Santo merece essa pré-candidatura. O PT do Espírito Santo está aguerrido e animado com essa pré-candidatura para que possamos apresentar um programa de governo para o Estado.

O senhor acha que a construção da sua candidatura já ou do ponto sem volta?

Na minha concepção, não tem mais volta. Essa é uma pré-candidatura que será efetivada.

É irreversível?

Sim.

Hoje o senhor vislumbra no horizonte alguma possibilidade real de a direção nacional do PT intervir nisso e determinar a retirada?

Não acredito que isso virá a acontecer, pelas conversas que tenho tido e pelo que ouço efetivamente. Em todos os encontros que tive tanto nacionalmente como dentro do PT estadual, isso para mim está fora de cogitação. Na minha concepção, isso não vai acontecer.

Em pesquisa eleitoral realizada pelo instituto Ipec e publicada no dia 2 de maio pelo jornal A Gazeta, o senhor apareceu relativamente bem. O atual governador larga bem à frente, com 42% das intenções de voto na estimulada, mas o senhor aparece em segundo, já na casa de dois dígitos, empatado com Manato (PL), ambos com 11%. Isso o estimula a seguir na disputa?

Perfeitamente, me motiva muito mais. O resultado dessa pesquisa foi muito positivo. Temos um mandato que é um mandato progressista, é um mandato de enfrentamento, pelo fortalecimento da democracia e da educação. Esse governo federal, em plena pandemia, cortou 22% do orçamento da Saúde. Também cortou o da Educação e o da Ciência e Tecnologia. E fez um aporte de 23% para o Ministério da Defesa. A população capixaba precisa saber disso. Então, o embate que estamos fazendo no Senado tem sido de bastante coragem, e isso está repercutindo. E nós temos o Espírito Santo com esse perfil de um espectro de eleitores bolsonaristas. Então, sem lançar oficialmente uma pré-candidatura, já aparecer em segundo lugar nas pesquisas nos motiva muito a manter esse caminho. E eu agradeço à população capixaba.

Por falar em “lançar oficialmente”, a militância está animada, os dirigentes estaduais do PT estão dando entrevistas sobre a sua pré-candidatura e, no entanto, o senhor não está aparecendo na condição de pré-candidato a governador, pelo menos publicamente. Por que isso? E quando é que o senhor pretende ir para a rua como pré-candidato?

Na verdade, eu solicitei ao próprio partido um evento de lançamento da pré-candidatura, que vai ocorrer no dia 11 de junho, em local a estabelecer. E, a partir daí, faremos uma caravana pelo interior do Estado, com a realização de plenárias. Mas as reuniões eu estou fazendo, sim. É porque não posso abandonar o mandato. Então, no tempo que tenho disponível, tenho me reunido com sindicatos, com a sociedade civil, com o próprio partido para a gente formar esse conjunto de instituições, sejam do âmbito estadual ou não, para lançar essa pré-candidatura.

Então, a partir do dia 11 de junho, o senhor pretende aparecer mais como pré-candidato?

Perfeito.

E o senhor pretende tirar uma licença do mandato para se dedicar à campanha?

Não. Eu não vejo necessidade, mesmo porque hoje o Senado ainda funciona de forma híbrida. Posso estar aqui a semana toda, participando das votações do Senado, então acho que isso não vai interferir no mandato. Dá para conciliar as duas coisas perfeitamente.

Com o próprio ex-presidente Lula, o senhor já chegou a falar especificamente sobre a sua pré-candidatura?

Já falei, e ele já me desejou boa sorte e me mandou tocar. Não tem problema nenhum. Em nenhum momento ele chegou para mim e falou “não vai ter”. Ele me mandou tocar a pré-candidatura normalmente e disse que o PT no Espírito Santo tem um pré-candidato a governador.

Ele lhe deu o sinal verde?

Sim, taxativamente.

A Gleisi também?

Sim. Em nenhum momento um deles chegou para mim e disse para eu não me lançar. Acredito, sim, que a direção nacional tende a convalidar o que a estadual fizer.

Hipoteticamente, porém, se vier lá na frente uma ordem de recuo, o senhor ficará sem escolha, certo?

A gente tem que acolher, né? Mas eu não trabalho com essa possibilidade. E acredito que, nacionalmente, isso não vai acontecer.

Em recente entrevista para mim, a presidente estadual do PT, Jackeline Rocha, fez algumas críticas contundentes ao governo Casagrande, principalmente na área social. O senhor concorda com essa avaliação da Jackeline de que a atual istração estadual deixa muito a desejar com relação à falta de políticas públicas?

Eu não tenho dúvida disso. Acho, com todo o respeito, que você ficar se vangloriando com uma saúde fiscal, uma nota A em saúde fiscal, a troco de quê? Tem nota A em saúde fiscal, mas fica indiferente à dor da população? Basta você ver: aumentou o número de pessoas desempregadas, a uberização das relações trabalhistas. As pessoas estão sendo despejadas de suas casas, não têm onde morar. Aumentou o número de pessoas em situação de rua. Então a saúde social tem que acompanhar a saúde fiscal. Eu penso que o governo podia, sim, ter uma marca muito mais voltada para o campo social.

É o que o senhor pretende priorizar na sua campanha?

Sim. A priorização do aspecto social e a efetivação dos direitos já existentes, porque não basta você falar para a população que ela tem direito à saúde se as pessoas estão morrendo nos corredores dos hospitais públicos, mesmo antes da pandemia. Então o que o governo do Estado pode fazer para dar efetividade a isso? E são direitos sociais assegurados pela Constituição. Educação, por exemplo: você sabe, estamos aqui na universidade, e o ensino nas universidades públicas é de excelência, assim como nos institutos federais. Agora, para você chegar a uma universidade, você precisa ter uma educação básica muito boa, e essa não é a realidade do Brasil, muito menos do Espírito Santo. Valorização dos professores. Ora, isso não é só conversa porque sou pré-candidato não, mas você falar que um professor tem que trabalhar 25 horas semanais ganhando pouco mais que um salário mínimo, não tem como… E o principal destinatário não é o professor. É o aluno que está lá, é a família. Então, nesse lado social, eu tenho uma vertente muito mais forte. É claro que você tem que estimular o pequeno empreendedor, para você gerar emprego e alavancar a economia, não tenha dúvida disso. Mas um olhar muito mais social é o que proponho.

O senhor deve atrair naturalmente os votos dos eleitores que já votam no PT, que seguirão com o senhor, por exemplo, porque votam no Lula. Mas isso tem um teto. O que pretende fazer para atrair votos dos eleitores não petistas e, principalmente, dos antipetistas? Como “furar a bolha”?

Vitor, você me fez lembrar que eu fui convidado para ir no programa Roda Vida [da TV Cultura]. Estávamos eu e o senador Alessandro Vieira. E chegou um determinado momento em que os entrevistadores lá começaram a falar de partidos do Centrão. Citaram até um partido: o PP. E a crítica estava sendo muito contundente, e eu fui o primeiro a defender. Eu fui o primeiro a defender porque aprendi isto no banco da faculdade: você não pode responsabilizar objetivamente todo mundo por fazer parte de uma sigla partidária. Eu não posso criminalizar o PP, Partido Progressista, como não posso criminalizar o Partido dos Trabalhadores. O eleitor tem que entender que o voto tem um preço muito grande e que não vai ser uma sigla partidária que vai mudar o comportamento daquele parlamentar. É claro que você tem a base aliada dentro dos limites do estatuto do partido. Mas você pode ter certeza que o Partido dos Trabalhadores é o partido comprometido com as causas sociais. Só não reconhece isso quem é ingrato, com todo o respeito. Quando eu fiz a Escola Técnica, só havia uma Escola Técnica. O governo do PT fez 22 institutos federais. O pobre teve direito a entrar aqui na universidade, com a lei de cotas, Prouni, Fies, Sisu e inúmeros programas que foram implementados para dar dignidade à população mais pobre. Tivemos o Ciência sem Fronteiras! Quando é que o pobre ia estudar fora, fazer intercâmbio? Então só não reconhece isso quem não quer. Contra esses fatos não há argumento. Agora mostre o que o governo federal atual fez e mostre o legado do Partido dos Trabalhadores. Eu não tenho dúvida de que foi um legado que reduziu a desigualdade, o abismo entre os pobres e a concentração de renda nas mãos de tão poucos.

O senhor concorda com a avaliação da presidente do PT-ES, Jackeline Rocha, de que é possível se coligar e formar uma aliança, no plano local, com os partidos de Guerino Zanon (PSD) e de Audifax Barcelos (Rede), ambos também pré-candidatos a governador?

Acho extremamente positivo. É a mesma coisa quando se questiona a aliança do PT com o Alckmin [PSB]. Esse é um momento tão grave para o país que é necessário você unir um campo que defende a democracia, que defende o fortalecimento das instituições. Eu repudio qualquer vinculação com o atual presidente e com candidatos desse campo. Agora, candidatos como Audifax Barcelos e Guerino, não vejo dificuldade. Acho que é um campo democrático e que só tem a agregar.

Mas o senhor acha factível uma aliança com um desses dois pré-candidatos, ou mesmo com ambos?

Acho perfeitamente possível e factível.

O senhor vai conversar com eles?

Se depender de mim, não vejo problema nenhum.

E quanto a eleição ao Senado? Hoje, nas discussões internas do PT-ES, há dois pré-candidatos mais consolidados que disputam a legenda: a ex-secretária de Educação de Cariacica Célia Tavares e o ex-reitor aqui da Ufes Reinaldo Centoducatte. O senhor tem preferência por algum dos dois?

Na verdade, o PT tem seis pré-candidatos ao Senado. Eu espero que isso se resolva internamente, para que não haja necessidade de fazer votação. Acho que se chegará a um consenso.  O partido tem maturidade suficiente para isso. Os dois que estão sendo mais cotados, que são a professora Célia e o professor Reinaldo, são nomes extremamente qualificados. A Célia tem um perfil voltado mais para a educação básica, e o Reinaldo, para o ensino superior. Mas qualquer que seja o candidato, o PT terá um candidato extremamente competitivo e qualificado, que vai dignificar bastante o Senado Federal.

Vitor Vogas

Nascido no Rio de Janeiro e criado no Espírito Santo, Vitor Vogas tem 39 anos. Formado em Comunicação Social pela Ufes (2007), dedicou toda a sua carreira ao jornalismo político e já cobriu várias eleições. Trabalhou na Rede Gazeta de 2008 a 2011 e de 2014 a 2021, como repórter e colunista da editoria de Política do jornal A Gazeta, além de participações como comentarista na rádio CBN Vitória. Desde março de 2022, atua nos veículos da Rede Capixaba: a TV Capixaba, a Rádio BandNews FM e o Portal ES360. E-mail do colunista: [email protected]

Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do ES360.