Coluna Vitor Vogas
Arnaldinho x Ricardo: as armas de cada um em sua disputa particular
Dado o tiro de largada, cada um dos dois a a lutar com as próprias armas, sem agredir o outro, pelo lugar de candidato de Casagrande a governador

Arnaldinho e Ricardo Ferraço manuseiam pistolas compradas pelo Governo do Estado para a Guarda Municipal de Vila Velha (25/04/2025). Foto: Léo Júnior/Vice-Governadoria
> Quer receber as principais notícias do ES360 no WhatsApp? Clique aqui e entre na nossa comunidade!
“A paz armada de Arnaldinho, Casagrande e Ricardo Ferraço em Vila Velha”. Foi este o título com que abri a análise publicada aqui na última sexta-feira (23), a respeito de uma “harmonização pública”, com gestos e fotos emblemáticas, entre o prefeito de Vila Velha, o governador e o vice-governador, durante as festividades pelo aniversário de 490 anos da primeira capital do Espírito Santo. Sim, o título foi intencionalmente ambíguo.
“Paz armada”, por um lado, porque foi “montada”, “construída”, “estabelecida” pelo trio em questão. Mas “paz armada”, também, remontando a conceitos da Guerra Fria, devido ao pacto de “não agressão mútua” e de “coexistência pacífica”, para evitar a “mútua destruição assegurada”, firmado entre duas potências fortemente armadas: Ricardo Ferraço (MDB) e Arnaldinho (sem partido), pré-candidatos declarados a governador do Espírito Santo.
Longe de sugerir qualquer tipo de conflito ou belicosidade entre eles, o que quero dizer é que, dado o tiro de largada, cada um dos dois a a lutar com as próprias armas, sem agredir o outro, para chegar a um lugar que só um poderá ocupar: o de candidato apoiado pelo governador e seu numeroso grupo político.
E quais são as principais armas de cada um dos postulantes?
As singularidades
As de Arnaldinho, certamente, são sua juventude (41 anos, ante os 61 de Ricardo), seu momento de plena ascensão, sua altíssima popularidade (ao menos em Vila Velha, onde já foi testada e confirmada pelas urnas), seu elevado índice de aprovação no segundo maior colégio eleitoral do Espírito Santo (atrás da Serra), seu perfil moderno, muito atento e atuante nas redes sociais, e a aposta total na prevalência do anseio por renovação política por parte do eleitorado capixaba, ante a iminência do fim do ciclo de 24 anos de Casagrande e Paulo Hartung a se revezar no poder. Tal ideia de renovação seria melhor representada por ele do que por Ricardo.
> Renzo sobre Arnaldinho no PSD: “Não tem nem ‘eventual’, quanto mais filiação…”
Podemos acrescentar outro ponto, de ordem muito mais subjetiva. Desde que adentrou a Prefeitura de Vila Velha, em 2021, Arnaldinho se estabeleceu, indiscutivelmente, como um fenômeno de carisma. Quem ainda duvida disso precisa ver, por exemplo, o recente vídeo do prefeito dançando funk no palco montado em Vila Velha por ocasião dos festejos de aniversário da cidade, para delírio do público. Ou o vídeo do início do ano em que o prefeito aparece tocando um instrumento de percussão, no palco da arena na praia que recebeu a programação de verão da cidade, enquanto é ovacionado pela multidão. Mais pareceram gritos de torcida organizada, em espontânea homenagem ao alcaide. “É o melhor prefeito do Brasil!”, entoaram os populares, após um palavrão que não posso reproduzir aqui.
Carisma não faz um bom governante – ao contrário, às vezes pode ocultar problemas e erros… Mas na certa ajuda qualquer um a vencer uma eleição.
Por sua vez, Ricardo tem como armas principais, antes de tudo, a posição privilegiada ocupada hoje por ele – como primeiro na linha sucessória, assumirá o cargo de governador em abril, com a provável renúncia de Casagrande para disputar o Senado –, o fato de que ele, nesse caso, já estará no cargo e pleiteando a reeleição – o que facilitará sumamente o discurso de que é “corresponsável” pelas realizações do atual governo, mais ainda se a máquina seguir rodando bem com ele à frente –, a convicção de que Ricardo herdará em boa parte o capital político de Casagrande e se beneficiará diretamente dos altos índices de aprovação do governo, a aposta na tese da “renovação segura, dosada pela experiência”…
Outras armas pessoais são seu currículo, sua capacidade técnica já testada em inúmeras áreas, o fato de conhecer como poucos a máquina pública estadual, a larga rede de apoios (de prefeitos, deputados etc., que dependem do Governo do Estado e devem se aproximar, por gravidade, daquele que estiver na cadeira) e a grande coalizão de forças políticas e partidárias que tende a ser montada ao seu redor, tendo por fiador Casagrande.
Tal coalizão já está em princípio de montagem, vide a manifestação explícita de apoio do Podemos e de todos os prefeitos do partido, a recentíssima adesão da portentosa Federação União Progressista, o engajamento em sua pré-campanha de agentes políticos influentes como o deputado federal Gilson Daniel (Podemos) e o presidente da Assembleia Legislativa, Marcelo Santos (União).
> Da Vitória quer ser candidato a governador, se Ricardo não deslanchar
Isso e o fato de que, diferentemente de Arnaldinho, Ricardo tem muito pouco a perder. Sim, se for preterido de novo ou até se amargar uma derrota nas urnas, o vice-governador ficará com o indelével estigma “daquele que duas vezes chegou tão perto, mas não se elegeu governador”… Mas, entrando na última quadra de sua longa trajetória política, após cerca de 40 anos praticamente emendando mandatos, poderá até, se quiser, ir amarrar o burro na sombra…
Arnaldinho, não. O jovem prefeito tem altas aspirações. Como ele mesmo sugeriu, em mensagem prenhe de duplo sentido, num post em homenagem a Vila Velha: “É sobre até onde podemos chegar”. Ora, se o prefeito disputar a eleição a qualquer custo e perder a disputa, ficará pelo menos quatro anos sem mandato, em plena forma política. Voltará para o fim da fila e terá de aguardar nova chance até 2030.

Foto: Léo Júnior/Vice-Governadoria
As similaridades
Em muitos aspectos, como se deduz dos destaques acima, Arnaldinho e Ricardo podem ser tomados como opostos: as maiores vantagens de um são as maiores fraquezas do outro.
Mas há também pontos em comum, tanto nos traços pessoais como nas estratégias eleitorais desenhadas por ambos para se viabilizarem.
Tanto Arnaldinho como Ricardo se apresentam – e assim farão nos próximos meses, em sua disputa particular – como políticos e gestores públicos que têm por marca o dinamismo gerencial, o foco nas entregas para a população, a capacidade de diálogo com as mais diversas forças políticas e segmentos da sociedade civil, a energia e a disposição para o trabalho que os tornam governantes “infatigáveis”.
> A paz Armada de Arnaldinho, Casagrande e Ricardo Ferraço em Vila Velha
Ricardo tem a fama de workahoolic. Em Arnaldinho, essa ideia de “energia inesgotável” ainda é realçada por ser ele um atleta amador, que corre (com a esposa), pedala, atira, joga bola, “bate o escanteio e corre para cabecear”… Todas essas características são atestadas por aliados e assessores que colaboram diretamente com eles. Acrescente-se a capacidade de formar equipes e o equilíbrio das contas públicas – ostentada pela gestão de Arnaldinho em Vila Velha; ainda mais destacável no caso do Governo do Estado.
Na esfera pessoal e comportamental, os dois seguramente investirão no “bom-mocismo” e “bom caratismo”, reforçando aquela imagem que tanto agrada à tradicional família capixaba: homens de família, dedicados à esposa, devotados aos filhos. Bons pais e bons maridos. No campo religioso, os dois são católicos. De fato, historicamente, são políticos classificáveis como “conservadores”. Não precisam ficar “lembrando isso” a todo instante, no discurso, para atingir o numeroso eleitorado conservador capixaba. Sua imagem pública, por si, cumpre tal objetivo.
São ativos que os dois certamente explorarão ao máximo – aliás, já estão a fazê-lo – nessa prévia da pré-campanha, antessala preparatória, volta de apresentação e aquecimento para a corrida de verdade.
Os dois por enquanto estão limpando e calibrando suas armas.

Foto: Reprodução Instagram
> Arnaldinho abraçou o Paulo? Hartung volta a “chacoalhar” a política do ES
O dilema de fundo ideológico
Ideologicamente, estamos diante de algo curioso – e os dois, possivelmente, de um dilema. A história de Ricardo e Arnaldinho os posiciona a ambos muito mais no hemisfério direito do espectro ideológico. Longe de serem radicais de direita ou simpáticos à extrema-direita que tanta força ganhou no país nos últimos anos… mas, definitivamente, bem distantes da esquerda. “Centro-direita” seria uma boa definição para os dois.
Mas Arnaldinho, sempre que indagado sobre isso, prefere definir-se como um político de centro. Ricardo, por sua vez, preside no Espírito Santo o MDB, melhor representação do centro no tabuleiro partidário brasileiro. Ao ser questionado sobre o tema, o vice-governador indica não estar nem um pouco interessado nessa polarização ideológica e não ter a menor intenção de fazer uma campanha a governador contaminada pelo debate nacional. Quer evitar rótulos e tratar do Espírito Santo. Também Arnaldinho, toda vez que surge o tema, prefere deslizar e ressaltar sua capacidade de fazer políticas tanto de esquerda como de direita e de manter um diálogo produtivo com todos os lados.
Ora esse “distanciamento” pode surtir efeito se, desta vez, a polarização ideológica nacional não acabar inundando as disputas regionais como se deu em 2018 e 2022. Se o grau de influência desse fator se mantiver em 2026 como nas últimas duas eleições gerais ou até se acentuar, pode chegar um momento em que a aparente “neutralidade” restará insustentável, obrigando-os a se posicionar: direita ou esquerda? Os dois poderão se ver forçados a assumir um lado e até a defesa de um candidato à Presidência contra outro – agradando a boa parte do eleitorado, mas despertando a rejeição de outro.
O que piora a sinuca de bico é que, nesse aspecto, o principal aliado de ambos, Casagrande, não joga no mesmo campo que eles. O governador e seu partido, o PSB, estão muito mais à esquerda de Ricardo e de Arnaldinho. No momento, nenhum problema: o vice de Arnaldinho, Cael Linhalis, é do PSB, foi indicado por Casagrande e ará a governar Vila Velha em abril se o prefeito renunciar para se candidatar a governador.
Quanto a Ricardo, bem, ele é o segundo na hierarquia de um governo do próprio PSB, deseja (e hoje possui) o apoio eleitoral do partido, tanto que se fez presente, na mesa de autoridades, durante o congresso estadual dos socialistas, em Vitória, no mês de abril, com a presença do prefeito de Recife, João Campos.
A conferir como eles se portarão quando estivermos mais perto da campanha, ou melhor, se a disputa presidencial influirá a ponto de forçá-los a rever sua posição… e sua autodefinição.
LEIA TAMBÉM
> Os planos de Kassab para Paulo Hartung em sua chegada ao PSD
> Paulo Hartung defende “um desses jovens talentosos” para governador do ES
> As condições de Marcelo Santos para apoiar Ricardo Ferraço até o fim
