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Coluna Vitor Vogas

Vereador de Vitória se livra de processo de cassação do mandato

Por unanimidade, Corregedoria da Câmara decidiu arquivar denúncia contra Chico Hosken, que tinha sido acusado de armar para cassar Armandinho

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Vereador Chico Hosken assumiu mandato em janeiro no lugar de Armandinho. Crédito: reprodução Facebook

“Está sepultada qualquer acusação que paira contra o Chico”, anunciou o corregedor-geral da Câmara de Vitória, Leonardo Monjardim (Patriota), antes mesmo do encerramento da votação. “Chico sai daqui com a alma lavada”, completou, após a votação. “Chico está livre dessa brincadeira”, decretou Luiz Emanuel (Republicanos), ao registrar seu voto. “Hoje se encerra uma agonia para o vereador Chico”, fez eco Davi Esmael (PSD).

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As declarações falam por si. O vereador Chico Hosken (Podemos) está oficialmente livre do processo por quebra de decoro parlamentar aberto contra ele em abril pela Corregedoria da Câmara de Vitória. Em reunião realizada na tarde desta terça-feira (13), os cinco membros do órgão disciplinar votaram à unanimidade pelo arquivamento do processo no qual Neno Bahia (Podemos), substituto imediato de Chico, pedia a cassação do vereador.

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O processo instaurado contra Chico tem conexão direta com outro em tramitação na Corregedoria, em face do vereador afastado Armandinho Fontoura (Podemos). Preso desde 15 de dezembro, Armandinho foi substituído na Câmara em janeiro por Chico, seu 1º suplente. Em março, o empresário Sandro da Rocha (PSB) representou contra Armandinho na Corregedoria, pedindo a sua cassação. Em abril, foi a vez de Neno Bahia, 2º suplente de Armandinho, representar contra Chico.

A trama é incrivelmente rocambolesca, mas, basicamente, Neno, o 2º suplente, acusou Chico, o 1º suplente, de ter armado contra Armandinho, usando um assessor parlamentar chamado Washinton Bermudes para enganar Sandro da Rocha e induzir o empresário a protocolar na Corregedoria o pedido de cassação de Armandinho. Ou seja, por intermédio de um assessor, Chico teria usado Sandro para pedir a cassação de Armandinho sem precisar aparecer.

Não colou na Corregedoria.

O voto norteador do “livramento” de Chico foi o do relator do processo, André Brandino (PSC), que opinou pela inissibilidade e pelo arquivamento da representação contra o colega, por absoluta carência de fundamentos e de “justa causa para a instauração de processo istrativo disciplinar”.

O relator entendeu que, na peça acusatória, o autor da denúncia não imputou nenhum fato diretamente a Chico Hosken, mas somente ao assessor lotado no gabinete dele. Assim, já na origem do processo, não teria sido cumprido um dos requisitos básicos para a issão de uma denúncia como essa, discriminado no Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara de Vitória (Art. 27, II).

O voto de Brandino pelo arquivamento foi acompanhado pelos outros quatro membros da Corregedoria: Monjardim, Luiz Emanuel, Davi Esmael e Karla Coser (PT).

Chico: “Aliviado”

Por telefone, Chico comemorou a decisão:

“Sempre estive tranquilo porque tinha certeza de que não tinha feito nada e que foi uma coisa baseada em suposições. Na verdade, esse processo nem deveria ter sido itido na origem, pois não tinha um porquê, não tinha uma motivação. Foi um equívoco. Com certeza estou aliviado, como qualquer um ficaria. Seria uma injustiça muito grande levarem isso adiante sem eu dever nada”, desabafou.

Inversão: corregedor na berlinda

Por sinal, a sessão da Corregedoria para apreciar o caso de Chico Hosken foi marcada por muitos questionamentos, vindos de toda parte, a uma decisão anterior tomada pelo chefe do órgão, Leonardo Monjardim, e fundamental para que o processo chegasse a esse ponto.

Conforme prevê o Código de Ética da Câmara, quando uma representação por quebra de decoro é protocolada contra um vereador, cabe ao corregedor-geral tomar individualmente uma primeira decisão, relativa à issibilidade da denúncia.

Nessa fase preliminar, ele deve avaliar exclusivamente se a denúncia atende a todos os requisitos básicos estabelecidos pelo Código de Ética – sendo um deles a identificação dos fatos imputados ao vereador denunciado que possam configurar quebra de decoro e dar ensejo à cassação. Se o corregedor entender que sim, ite a denúncia e deflagra o processo no órgão. Do contrário, arquiva a representação de ofício, matando-a na origem.

No caso concreto, no fim de abril, Monjardim decidiu aceitar a denúncia de Neno Bahia contra Chico. Na sessão de hoje, em dado momento, pareceu que era o corregedor-geral quem estava no banco dos acusados, tal o volume dos questionamentos relativos a essa decisão inicial.

Dos colegas Karla Coser e Davi Esmael, do advogado de Chico Hosken e do próprio André Brandino, em trecho de seu relatório, Monjardim ouviu que essa representação nem deveria ter sido aceita por ele, para começo de discussão, por ausência de imputação de fato ao vereador acusado.

“Grave erro”: os protestos do advogado

Pedindo permissão para fazer uma breve defesa oral antes da leitura do relatório, o advogado de Chico, Marcos Daniel Coutinho, fez uma fala incisiva. Chamando a decisão de Monjardim de “grave erro democrático”, o defensor destacou os danos irreversíveis à reputação do seu cliente, ainda que ele viesse a ser inocentado, pelo simples fato de ter se tornado réu em processo de cassação sem a menor necessidade.

“Para quem tem moral, para quem tem honra e para quem tem ética, o bem mais valioso é o nosso nome, é a nossa reputação. Para quem tem moral, para quem tem honra, para quem tem ética, responder a um processo é uma agressão. A abertura desse processo já é uma agressão que talvez nem a inissibilidade vai remediar. O estrago que isso faz é irremediável. Não se pode abrir um processo de cassação contra um vereador de qualquer forma.”

Para o advogado, Chico sofreu prejuízo incalculável à própria honra a partir do momento em que ou a responder a processo disciplinar tão somente porque o corregedor decidiu receber uma “denúncia feita de qualquer maneira”. Segundo ele, a issão de tal denúncia abriu um precedente perigoso que pode se voltar contra outros parlamentares: “Hoje quem está sendo vítima desse tipo de agressão é o vereador Chico, mas amanhã pode ser qualquer um”.

Ainda apontando o dedo para Monjardim, o advogado afirmou que a denúncia de Neno não continha nenhuma imputação a Chico, nem mínima prova do que se acusava, e que foi o próprio Monjardim, na análise preliminar de issibilidade, quem realizou deduções e direcionou para Chico, de maneira ilegal, uma acusação que na verdade era contra um assessor:

“A denúncia tem que ter imputação ao vereador. No parecer de issibilidade inicial, foi dito algo que não constava na representação, algo que o Sandro [da Rocha] não falou: que o Washington teria agido sob as ordens de Chico. O Sandro não fala isso, o Neno não escreve isso na sua representação. Mas, quando se vai itir a representação, então se conclui que o Washinton teria agido a mando de Chico. E aí se comete um erro democrático grave, porque a função do corregedor que está aqui hoje para julgar o Chico precisa ser isenta e imparcial. E, a partir do momento que complementamos uma acusação, incluindo conclusões que não existem nela, eu então desço da minha posição de imparcialidade e o então a auxiliar o processo de representação.”

Davi e Karla: rara concordância

Em raríssimo consenso – pois eles quase sempre discordam, e a petista fez até piada com isso –, Karla Coser e Davi Esmael seguiram a mesma linha do advogado, embora com palavras mais comedidas:

“Individualmente, discordei da issibilidade. Acho que nem deveria ter sido itido. Era evidente que Chico não estava sendo acusado de absolutamente nada. Não há imputação de absolutamente nada”, sustentou Davi.

Karla concordou: “A denúncia do Neno não tem conexão com o vereador, mas com um servidor. Acredito que hoje a gente encerra esse capítulo para o Chico, não sem custo pessoal, político e financeiro inclusive. Ao mesmo tempo, damos à sociedade uma resposta de que nosso trabalho na Corregedoria está sendo feito com o maior esmero”.

As farpas no relatório de Brandino

Em seu parecer, Brandino deixou indiretas para Monjardim, sem nominá-lo, também contestando a aceitação da denúncia na análise inicial.

“Insta ressaltar que, antes da deflagração de qualquer procedimento disciplinar, é imprescindível a realização de um juízo de issibilidade adequado, com a escolha do instrumento de atuação disciplinar apropriado e o devido processo legal. […] É igualmente vital assegurar que as acusações de quebra de decoro sejam tratadas com a devida diligência e precisão, para evitar a trivialização desta séria infração e a diminuição de sua gravidade, ou até mesmo a sua possível utilização como manobra política ou até mesmo midiática.”

Assim como o advogado de Chico, Brandino alertou para a abertura de um precedente temerário na Câmara de Vitória e insinuou que Monjardim não foi suficientemente rigoroso em seu juízo inicial quanto ao cumprimento das exigências para issibilidade da denúncia:

“Adicionalmente, devemos estar atentos ao perigo de estabelecer um precedente indesejável. Iniciar procedimentos por quebra de decoro com base em acusações infundadas ou politicamente motivadas pode pavimentar o caminho para o abuso desses procedimentos no futuro. Isso poderia resultar em uma situação em que os procedimentos por quebra de decoro são utilizados como uma arma de luta política, em vez de um meio de preservar a integridade e a honra do Poder Legislativo. Portanto, é imprescindível que mantenhamos um alto nível de exigência e rigor ao lidar com acusações de quebra de decoro parlamentar.”

A “defesa” de Monjardim

Em sua defesa, Monjardim se manteve firme em sua tese contrária. Na visão do corregedor-geral, o recebimento da denúncia, com a consequente abertura do processo, foi exatamente o que proporcionou a Chico a oportunidade de exercitar seu direito à ampla defesa e de provar a sua inocência de maneira pública e inequívoca.

“Hoje o Chico pode dizer que ou por este processo, apresentou a sua defesa, e hoje ele tem, com legitimidade, pela Corregedoria, a apuração dos fatos e uma decisão. Você imagina receber uma denúncia dessas e de repente engavetar sem antes… Ficaria a dúvida! O Chico é o culpado, mas protegido pelos seus colegas de uma forma corporativa, como já vimos diversos exemplos Brasil afora, ou realmente ele tem a oportunidade de usar o contraditório e a ampla defesa?”

“Motivações políticas”

O relatório de Brandino também foi interessante por colocar no papel algo que está bem evidente desde o início desta novela com múltiplas camadas: as motivações políticas por trás de ambas as representações (contra Chico, mas também contra Armandinho).

“É importante notar que as alegações de quebra de decoro parlamentar parecem ter surgido em um momento estratégico, pouco antes das próximas eleições municipais. Além disso, as alegações foram feitas por adversários políticos conhecidos do parlamentar em questão. Esses fatores sugerem que o processo pode estar sendo usado como uma ferramenta para ganhar vantagem política, em vez de uma resposta a uma preocupação genuína com a conduta do parlamentar.”

O relator ainda advertiu para o risco de criação de factoides contra adversários por agentes políticos e/ou potenciais candidatos, em busca de maior atenção midiática e engajamento de seguidores nas redes sociais:

“É de saber comum que a força política saiu das ruas, ou, pelo menos como forma inicial, de organização, para entrar aos celulares, na internet. Não é incomum buscar-se ‘engajamento’ – peço licença para usar o termo das redes sociais – até mesmo em discussões políticas. Com essa nova realidade, como está sendo chamada a era pós-Covid-19, devemos ainda atentar para esta nova possibilidade: a utilização de um pedido de investigação, um processo de quebra de decoro, como forma de perseguição política sendo alavancada pelas redes sociais, pela internet.”