Dia a dia
Se governo não agir, desemprego dobra no país
É o que aponta estudo feito por pesquisadores do Ibre/FGV
A crise do coronavírus deixará até 12,6 milhões desempregados e provocará contração recorde de quase 15% na renda dos trabalhadores, caso o governo não amplie os instrumentos de transferência de renda à população e de ajuda a empresas para que mantenham empregos. Os números constam de um estudo dos pesquisadores do Ibre/FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) Silvia Matos, Luana Miranda, Livio Ribeiro, Vilma Pinto, Paulo Peruchetti e Tiago Martins. O estudo foi divulgado pela Folha de S. Paulo.
Mesmo com as medidas já anunciadas para garantir renda extra a trabalhadores formais e informais, que somam R$ 170 bilhões, a massa salarial deve cair 5,2%, retração recorde da série iniciada em 2003. Sem essas medidas, a queda seria de 10,3%.
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No cenário considerado mais factível pelos pesquisadores, há retração de 3,4% no PIB (Produto Interno Bruto) e de 6,7% nas horas trabalhadas e na população ocupada —com a perda de cerca de 6 milhões de empregos. O desemprego terminaria o ano no patamar recorde de 17,8%.
O cenário mais pessimista mantém a expectativa para a maior parte dos setores, mas sinaliza uma piora mais profunda no setor de serviços.
Nesse caso, a massa salarial cai 13,8%, mesmo considerando as medidas já anunciadas pelo governo, com redução de 13,5% na população ocupada e nas horas trabalhadas de todos os setores, número compatível com uma retração do PIB de 7%. A taxa de desemprego iria para 23,8% —seriam 12,6 milhões de novos desempregados no país.
Ou seja, mais que o dobro do registrado antes da pandemia.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente Jair Bolsonaro, durante entrega do Plano mais Brasil. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil Brasilia-DF
Nos dois cenários, o encolhimento da população ocupada é recorde para a série elaborada com dados a partir de 1982. Os piores resultados anteriores foram as retrações de cerca de 2% em 1990 e 2016.
De acordo com a pesquisadora Silvia Matos, a queda do PIB de 3,4% é praticamente a mesma registrada em 2015 e 2016, mas a destruição de empregos, no Brasil e em outros países, não será comparável a nenhuma outra recessão dos últimos 40 anos.
“Há uma discrepância entre PIB e emprego como nunca vimos. Estou menos preocupada com PIB e mais preocupada com renda. O choque de emprego não tem como evitar. Já observamos em outros países. A questão é dar compensação de renda para amenizar esse choque severo.”
“A gente já ou por quedas de PIB similares, mas a destruição de renda será muito maior. Vai ter de compensar isso, porque não tem como as pessoas procurarem emprego”, diz ela.
A pesquisadora diz que a população ocupada no setor de serviços cresceu praticamente em todos os anos considerando a série histórica iniciada em 1995, exceto em 2016, quando ficou estável, pois a informalidade ajudou a compensar a perda de vagas formais em outras crises. Desta vez, porém, o informal tende a sofrer mais que o formal.
“No período recessivo recente aumentou a informalidade, houve uma válvula de escape para garantir emprego. Neste momento, a natureza do choque não permite isso. Não tem muito o que fazer para preservar esses empregos. Tem de preservar a renda.”
A lista de medidas anunciadas pelo governo nesse sentido, utilizada pelos pesquisadores para calcular o quanto isso irá minimizar o impacto na renda, são o auxílio financeiro para trabalhadores informais (coronavoucher), a ampliação do Bolsa Família, o programa antidesemprego (redução proporcional de salários e jornada de trabalho) e as transferências do PIS/Pasep para o FGTS.
Na análise do impacto por trimestre foi incluída ainda a antecipação em alguns meses de pagamentos do 13º do INSS e do abono salarial, de quase R$ 60 bilhões.
Segundo a pesquisadora Vilma Pinto, o auxílio para informais de R$ 600 é inferior à renda média do trabalhador sem carteira, de R$ 1.464 pelos dados do IBGE. No caso dos formais, o programa antidesemprego prevê compensação até o valor do seguro-desemprego, que não chega a R$ 2.000, abaixo da média dos salários com carteira (R$ 2.881).
“A compensação é parcial, tanto no formal como no informal. Então tem essa queda na massa de salários”, diz.
Ela afirma que o cálculo considera o número do governo para o programa de combate ao desemprego de trabalhadores formais, mas que não há garantia de adesão das empresas, nem de que elas conseguirão sobreviver por tempo suficiente para superar a crise.
Silvia Matos afirma não ser possível calcular no momento o valor necessário para garantir a estabilidade da renda, o que vai depender da duração da crise e do perfil dos trabalhadores mais afetados. Ela diz ainda que é importante a sinalização do governo de que haverá recursos suficientes para garantir a sobrevivência das empresas e dos funcionários.
“Isso não volta enquanto a gente não tiver uma vacina, não tiver clareza. A travessia pode ser longa. É importante ter uma artilharia pesada neste primeiro momento”, diz.
“O empresário pode tomar a decisão de fechar seus negócios se não tiver garantia. O único capaz de dar a mínima segurança é o governo. Depois a gente pensa no fiscal. Vamos ar por essa travessia com o menor aumento de desigualdade possível. Tentar amenizar o choque na renda das famílias. É isso que é possível.”
