Dia a dia
Algumas espécies sumiram do rio Doce após chegada da lama
Por 12 meses, pesquisadores monitoraram o rio, o litoral capixaba e o parque de Abrolhos para detalhar o impacto dos rejeitos na fauna e flora das regiões
Um estudo mais longo e completo até o momento mostra a redução da biodiversidade aquática no rio Doce, no Parque Nacional de Abrolhos e em parte do litoral do Espírito Santo, provocada pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), que fez chegar toneladas de rejeitos de minério ao rio e à costa capixaba, há quatro anos.
Realizada pela Rede Rio Doce Mar (RRDM) — grupo de apoio às ações de reparação dos impactos causados pelo rompimento da barragem –, a pesquisa monitorou cerca de 200 pontos afetados pela lama de rejeitos, entre os meses de setembro de 2018 e de 2019. A intenção do estudo é dimensionar o impacto da chegada da lama para a fauna e a flora da região entre a foz do rio Doce e a área entre Guarapari e Porto Seguro, na Bahia.
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O monitoramento incluiu análises desde micro-organismos até baleias. A qualidade da água, a presença de sedimentos, as alterações de marés e ondas, e a situação dos mangues e restingas também foram analisados, explicou o Joca Thomé, representante da Câmara Técnica de Conservação e Biodiversidade — CTBio.
O estudo envolveu cerca de 500 pesquisadores de 28 instituições de ensino e pesquisa de todo o país.
Concentração de rejeitos
Os resultados preliminares indicam que a concentração de rejeitos varia de acordo com as épocas de seca ou cheia do rio Doce e seus afluentes. “A região capixaba do rio Doce recebeu uma carga de milhões de toneladas de minério, com alto índice de metais pesados. E, hoje, a tendência é de declínio desses índices. Apenas metais como cádmio, chumbo e arsênio continuam variando, o que exige monitoramento constante”, acrescenta Joca Thomé.
Contudo, apesar da redução gradual do índice de alguns metais pesados, várias espécies de plantas e animais desapareceram. “O relatório mostra que toda a cadeia alimentar está contaminada. Antes, existiam 40 espécies de zooplânctons e, hoje só conseguimos encontrar 20 espécies”, alerta o especialista.
O representante da CTBio não deixa dúvidas sobre a dimensão do impacto e das transformações que estão ocorrendo nos ecossistemas. “Ainda vamos emitir um parecer sobre a situação da biodiversidade. Mas, é consenso que o impacto ambiental foi significativo. Algumas espécies já não são mais encontradas”, acrescenta.
Segundo a Fundação Renova, os relatórios do estudo serão avaliados durante os próximos dois meses. A partir desta análise, a forma de continuidade dos estudos e monitoramento será definida. As definições das próximas ações estarão baseadas conforme a versão final do relatório.
Samarco quer liberar pesca, mas Justiça vai avaliar
A Justiça Federal de Linhares realizou na última terça-feira uma audiência para verificar a necessidade de manutenção da proibição da pesca no rio Doce e em parte do litoral capixaba atingido pela lama de rejeito da barragem de Mariana.
Na ocasião, a Samarco pediu a suspensão da proibição da pesca, alegando que a qualidade da água na área da suspensão da pesca atende aos parâmetros legais e que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária é favorável ao consumo de pescados provenientes da bacia e da região costeira.
A Justiça deu prazo até 21 de fevereiro para que todas as partes se manifestem e, depois disso, decidirá se mantém, ou não, a proibição.
O Ministério Público Federal no Espírito Santo é contra a liberação da pesca. Segundo o órgão, os estudos técnicos e as explicações dos especialistas não são convincentes quanto à segurança do consumo humano do peixe.
Estudo final saí em 2020
O estudo desenvolvido pela Rede Rio Doce Mar (RRDM) tem mais de 7 mil páginas e, nos próximos meses, será analisado pela CTBio e demais órgãos ambientais. A expectativa é de que o relatório final seja apresentado à sociedade até fevereiro de 2020. Além de identificar os impactos da lama, o documento indicará quais estudos ainda precisam ser feitos.
Apontamentos do relatório
• Metais pesados. A lama de rejeitos de minério acumulada na bacia do rio Doce mantém todo o ecossistema contaminado. O ferro é o metal mais abundante nos rejeitos e ainda não há parâmetros que estabeleçam níveis seguros para a saúde humana.
• Pesca proibida. Desde fevereiro de 2016, a Justiça Federal no estado proibiu a pesca em parte do litoral do Espírito Santo e em toda a bacia do rio Doce. A intenção é preservar a diversidade de espécies e evitar o consumo humano de pescado contaminado.
• Redução de espécies. Durante o estudo, os pesquisadores não conseguiram encontrar algumas espécies de animais e plantas que existiam nas regiões atingidas pelos rejeitos.
• Área atingida. Maior evidência de impacto causado pelos rejeitos foi encontrada na calha, no estuário e na foz do rio Doce, bem como a região costeira próxima à foz.
