Coluna Vitor Vogas
Por que Audifax não tem nada a perder disputando o governo do ES?
Sem mandato, ex-prefeito não precisa abrir mão de nada, teve gestões bem avaliadas na Serra e, se não tentar o salto agora, pode acabar sem outra chance, como muitos contemporâneos engolidos pela polarização entre Hartung e Casagrande

Ex-prefeito da Serra, Audifax Barcelos. Foto: Divulgação
Já argumentei aqui que o prefeito de Linhares, Guerino Zanon, tem pouquíssimo a perder se entrar mesmo na corrida com destino ao Palácio Anchieta. Mas se há alguém neste Estado que hoje não perde nada, absolutamente nada, entrando na mesma disputa, esse alguém atende pelo nome de Audifax Barcelos (Rede Sustentabilidade).
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Para pleitear o lugar ora ocupado pelo governador Renato Casagrande (PSB), Guerino precisa renunciar ao mandato de prefeito. Audifax, nem isso. Não precisa abrir mão de nada. Sem mandato desde 2020, só tem a crescer e a ganhar politicamente, projetando-se para além dos limites onde sempre se deu, até hoje, sua trajetória política: o município da Serra.
Audifax já governou por três mandatos o maior colégio eleitoral e maior município do Espírito Santo em termos demográficos: de 2005 a 2008 (ainda como aliado de Sérgio Vidigal) e entre 2013 e 2020 (como adversário do atual prefeito). Com formação altamente técnica, foi secretário municipal em várias pastas nas prefeituras de Vitória e da Serra, antes de ser alçado (por Vidigal) à atividade política – e tomar gosto por ela.
Em seus doze anos à frente do Executivo serrano, conseguiu estabelecer para além dos limites da cidade a marca de gestor eficiente, capaz de istrar a máquina pública e de transformar o dinheiro público em entregas à população. Essa qualidade istrativa é reconhecida no meio político capixaba e lhe rendeu reconhecimento eleitoral dentro das divisas da Serra.
Prova disso é que, jogando em casa, Audifax nunca perdeu um pleito: eleito sobre os ombros de Vidigal em 2004, simplesmente não obteve a legenda no PDT para buscar, quatro anos depois, uma reeleição então dada como certa. Mas, em 2012 e 2016, impôs dupla derrota a Vidigal, malgrado a enorme popularidade do ex-mentor político, sendo a primeira delas como desafiante, com Vidigal ocupando a prefeitura.
Em 2020, sem poder emendar um terceiro mandato seguido, Audifax lançou à sucessão o quase desconhecido vereador Fabio Duarte, que, mesmo sendo um baita azarão, chegou ao 2º turno e deu trabalho a Vidigal nas urnas, graças ao apoio do então prefeito. Resumindo, seja política seja istrativamente, Audifax parece já ter atingido o teto nos confins do seu reduto.
Se não for candidato ao governo do Estado agora, ele terá que esperar mais dois anos (totalizando quatro na planície) para ser candidato nas eleições municipais de 2024. Mas para ser candidato a quê? A prefeito da Serra de novo, contra Vidigal ou o candidato a ser lançado pelo pedetista? Não faz sentido… Seria caminhar em círculos, ou melhor, prolongar um ciclo que, ao cabo de quase 30 anos, já parece ter se esgotado: o da eterna alternância no poder entre Audifax e Vidigal na Serra.
Audifax não quer o Congresso
É claro, este ano há muitos cargos em disputa, não apenas o de governador. Se desistir de se lançar ao Palácio Anchieta, Audifax terá alternativas, como tentar voltar ao Congresso Nacional – onde já esteve por dois anos –, seja como senador, seja como deputado federal.
O Senado é uma empreitada mais dura, pois só há uma cadeira em disputa. Mas, no meio político capixaba, muita gente aposta que, se decidisse pleitear uma das dez cadeiras de deputado federal pelo Espírito Santo, o ex-prefeito da Serra estaria virtualmente eleito, só com os votos fidelizados de seu eleitorado na Serra – não é demais lembrar: maior colégio eleitoral do Estado.
Para uma chapa eleger um deputado federal no Espírito Santo, dirigentes estimam que os 11 candidatos deverão somar um mínimo de 190 mil votos (o quociente eleitoral). Estima-se que, sozinho, Audifax poderia se aproximar dessa marca, praticamente sem precisar sair do seu escritório em Bairro de Fátima.
Mas a pergunta necessária é: e por acaso Audifax tem lá interesse em voltar para o Congresso? A resposta taxativa é não. A interlocutores, o ex-prefeito tem repetido que não quer nem ouvir falar da ideia. Sua experiência como deputado federal, de 2011 a 2012, não lhe deixou boas lembranças.
Embora curta, a agem de dois anos por Brasília bastou-lhe para confirmar a certeza de que não nasceu para o Poder Legislativo. Na pele de parlamentar, Audifax restou como um peixe fora d’água, à beira do Paranoá. E, tal como o referido lago, o terno de legislador ficou artificial vestido nele.
O ex-prefeito entende que sua vocação e sua aptidão estão mesmo no Executivo. E é também por isso que agora se concentra em trabalhar para erguer sua candidatura ao governo.
A última chance de toda uma geração
Outro fator que empurra Audifax para essa candidatura agora é de ordem, digamos, geracional. Tem a ver com o que talvez possamos chamar de “relógio biológico” dos agentes políticos capixabas.
No Espírito Santo, o que tivemos nos últimos 20 anos foi a Era PR: “Política de Rodízio”: “Paulo e Renato”. Ou Era RP: “Revezamento no Poder”: “Renato e Paulo”. Em dueto político, Hartung e Casagrande ditaram a música no Estado nestas últimas duas décadas.
Essa hegemonia dos arquirrivais no cenário político capixaba desde 2002 limitou a estatura dos demais à sua volta. Bloqueou a ascensão ainda maior de líderes políticos importantes da mesma geração que surgiram nos anos 1990 e cresceram nas últimas duas décadas, mas à sombra de Hartung e Casagrande e somente até o limite imposto pelo poderio da dupla.
Para citar alguns casos notórios, temos os ex-prefeitos Luciano Rezende (dois mandatos em Vitória, de 2013 a 2020) e Max Filho (três mandatos em Vila Velha, de 2001 a 2008 e de 2017 a 2020), além do atual prefeito da Serra, Sérgio Vidigal. Este bem que tentou desafiar Hartung em 2006, numa candidatura kamikaze e derrotada no 1º turno. Mas tampouco conseguiu transar as fronteiras de seu reduto político-eleitoral.
Se perguntarem a Erick Musso (Republicanos) ou a Felipe Rigoni (União Brasil), também pré-candidatos ao governo, ou da hora de pôr fim a esse duopólio. Rigoni tem repetido publicamente que esse ciclo de 20 anos “acabou” (profetizando a derrota de Casagrande nas urnas em outubro).
Mas tanto Rigoni como Erick têm bem menos de 40 anos, muito chão a percorrer na vida pública e, certamente, muitas oportunidades eleitorais por vir. Se não chegarem ao Palácio agora, poderão voltar até mais fortes daqui a quatro anos ou mais. Não é bem o caso de Audifax.
Hoje com 57 anos, o ex-prefeito pode até deixar para arriscar esse salto em 2026. Mas talvez àquela altura a empresa fique ainda mais difícil. Principalmente se Casagrande for reeleito, é razoável pensar que, em 2026, após um quarto de século de Era Paulo Renato, os capixabas hão de querer dar uma oportunidade a políticos da geração que vem atrás, cheia de vitalidade política, ambições e vontade de mudar a guarda (quiçá inaugurar outra era política no Estado).
Se deixar ar essa chance agora, Audifax pode perder o bonde da história.
Post scriptum
Por fim, um ponto que não pode ser desprezado nesta análise é a situação partidária de Audifax: seu pleno domínio sobre a Rede em nível estadual, a iminente federação com o Psol e os reflexos desse novo modelo de aliança sobre os seus planos eleitorais. Será o assunto de uma próxima coluna.
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