Coluna Vitor Vogas
O futuro político de Audifax e os porquês de seu apoio a Manato
Aliança do ex-prefeito com o candidato bolsonarista é uma das maiores guinadas da recente história política do Espírito Santo, mas é, antes de tudo, uma aposta de Audifax em busca da própria sobrevivência eleitoral

Da esquerda para a direita: Capitão Assumção, Guerino Zanon, Tenente Assis, Manato e Audifax Barcelos
Com frustrantes 6,5% dos votos válidos no último domingo (desempenho ruim, como ele mesmo reconhece), o ex-prefeito da Serra Audifax Barcelos fez nesta quinta-feira (6) dois anúncios importantes: está saindo da Rede Sustentabilidade e apoiando Manato (PL) contra Casagrande (PSB) no 2º turno. Tanto do ponto de vista ideológico como da trajetória de Audifax, trata-se de uma das maiores guinadas da recente história política do Espírito Santo.
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Em mais de 30 anos, Audifax sempre pertenceu a partidos de esquerda ou centro-esquerda e sempre se situou nesse espectro. Começou sua militância político-partidária no PT, nos idos dos anos 1980 e 1990 (foi assessor da bancada do partido na Assembleia). Pelo PDT, exerceu seu primeiro mandato na Serra (2005-2008). Pelo PSB de Casagrande, elegeu-se para o segundo (2013-2016). Pela Rede, exerceu o terceiro (2017-2020). Agora, une-se ao candidato a governador de Bolsonaro, presidente internacionalmente considerado de extrema-direita. É uma trajetória parabólica.
Em 2018 (logo ali, na esquina da História), Audifax estava ao lado de Marina Silva, Contarato, Rose de Freitas… Agora, está ao lado de Manato na campanha que tem aliados como Capitão Assumção, Gilvan, Magno Malta… Politicamente, são opostos.
Questionado sobre uma mudança tão extrema, Audifax avalia que se trata de uma questão pontual da política eleitoral no Espírito Santo: “O que está acontecendo é uma questão muito local, muito pontual, muito mais que uma questão ideológica, em que preciso manter uma coerência com o que fiz na campanha [como opositor de Casagrande].”
Sobrevivência política
Os anúncios de Audifax foram dois atos conjugados visando à própria sobrevivência no jogo político do Espírito Santo. No Estado, a Rede já não vinha bem e, com seu resultado no domingo, desmilinguiu de vez.
Em termos de capital político, Audifax sai desta eleição menor do que entrou, com baixa votação, com uma dolorosa e marcante derrota na Serra (chegou em 3º lugar em seu reduto) e, o que é mais importante, sem um grupo político propriamente dito a partir do qual possa se reerguer. “De forma muito humilde, reconheço que os resultados não foram positivos para mim”, afirmou ele nesta quinta, em entrevista coletiva.
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Para fugir ao total isolamento que fatalmente o atingiria no pós-eleições 2022 se ele ficasse parado, Audifax resolveu escolher um lado agora no 2º turno (o de Manato), apostando que esse possa ser o lado vencedor, para conseguir se reconstruir, ou se reinventar politicamente, como partícipe do novo grupo que ascenderá ao poder no Espírito Santo, em caso de vitória do candidato bolsonarista.
Se Casagrande ganhar, a carreira de Audifax, já beirando os 60 anos, ficará muito seriamente comprometida.
Audifax chega à campanha de Manato dizendo não ter tido com o candidato do PL – com quem conversou pessoalmente na segunda (3) – nenhuma conversa sobre secretaria ou cargo no governo em caso de vitória. “Posso ajudá-lo na transição. E estou à disposição para aparecer na propaganda eleitoral”, disse o agora ex-redista, acrescentando que precisa de mais tempo para definir seus próximos planos políticos e seu próximo partido. Mas ele quer tentar novamente: “Ainda desejo, de coração, ser governador deste Estado”.
Quanto à sua inserção em um novo grupo político (erguido em volta de Manato), Audifax relativiza:
“A partir do resultado desta eleição e do posicionamento que assumo hoje, provavelmente vou conversar com essas pessoas que vão estar apoiando Manato. Isso significa que daqui a dois anos, ou daqui a quatro anos, estarei com esse grupo? Não necessariamente.”
E fará ele oposição a Casagrande? “Para esta eleição, sim. Para a vida toda, não.” (Vai que Casagrande ganha…)
Como se depreende das respostas, Audifax tornou-se um político 101% pragmático.
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Por que não a neutralidade?
Audifax já havia antecipado, antes mesmo da votação de domingo, que com Casagrande não ficaria no 2º turno. Mas por que não optou pela neutralidade? “Aprendi com a eleição de domingo”, respondeu o ex-prefeito. “Aprendeu” que é preciso ter lado.
Mas por que então o lado de Manato e não o de Casagrande?
Por uma questão de coerência, responde Audifax, após ter criticado tanto a gestão atual desde a fase da pré-campanha. Também por coerência, completa, ele decidiu sair da Rede. O fator determinante, explica ele, foi uma resolução da cúpula nacional do partido determinando o apoio de seus integrantes nos estados a todos os candidatos a governador que estão com Lula (o que inclui Casagrande no Espírito Santo).
“Esse apoio nacional da Rede a Casagrande vai contra o que fiz durante a campanha inteira. Eu já tinha dito a vocês, no fim do 1º turno, que com Casagrande eu não ficaria. Seria uma incoerência enorme da minha parte fazer isso agora.”
Além disso, para Audifax, Manato é neste 2º turno quem representa a ideia de “renovação política” para o Espírito Santo. “Vejo Manato na linha da renovação.”
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Grupo de extermínio
Indagado sobre o fato de Manato, assumidamente, já ter pertencido à Scuderie Le Cocq, grupo de extermínio responsável por centenas de assassinatos no Espírito Santo nas décadas de 1980 e 1990, com direito a carteirinha de filiação e número de registro, o ex-prefeito respondeu assim:
“Na conversa que Manato teve comigo, ele colocou que ele participou de uma entidade que não é a Le Cocq, que eu esqueci o nome. Ele participou, sim, desse grupo, que não era a Le Cocq. Ele teria ido a algumas reuniões e viu que não era aquilo, ele foi e depois não participou mais. Mas ele coloca que a participação dele como membro não foi na Le Cocq, e sim em uma entidade que eu esqueci o nome.”
“Volta do crime organizado”
Sobre o discurso que a campanha de Casagrande tem reiterado nesta primeira semana de 2º turno, de que eventual vitória de Manato representa, para o Espírito Santo, “risco de retrocesso” e de “volta do crime organizado”, Audifax se posicionou:
“Não acredito nisso. Não acredito em risco à democracia. Não acredito em risco na questão do crime organizado. Tive duas relações de trabalho com Manato: uma na primeira gestão de Vidigal na Serra, de 1997 a 1998, e outra na Câmara dos Deputados, de 2011 a 2012. E, nessa relação que tive com ele nesses dois momentos, nunca vi da parte dele nenhuma fala, nenhum gesto em relação ao crime organizado e contra a democracia. E entendo que ele está muito na linha da renovação, que é minha fala desde o início.”
“Sou gestor”. E Manato?
Sobre o fato de Audifax ter ado o 1º turno inteiro repetindo “sou gestor” e dizendo que “o atual governador não é gestor”, enquanto Manato nunca foi nem prefeito, Audifax também defendeu o novo aliado:
“Na primeira istração de Vidigal na Serra [1997-2000], quando fui secretário, ele foi secretário de Serviços. Também foi diretor-geral do Hospital Dório Silva. Na área pública, são essas duas ações. Na área privada, em outros lugares. Ele foi gestor. A minha esperança é que ele seja um bom gestor.”
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O que não foi dito por Audifax
A partir do momento em que Audifax decidiu apoiar o candidato de Bolsonaro no Espírito Santo, sair da Rede não era exatamente uma opção para ele. Com esse ato de “insubordinação”, que se choca com o posicionamento oficial do partido, ele provavelmente sofreria alguma sanção interna e talvez até tivesse que sair da Rede de qualquer maneira, só que de maneira bem mais desonrosa.
Em segundo lugar, como Manato reiterou em entrevistas de domingo para segunda-feira, o candidato do PL queria o apoio do “Audifax F”, ou seja, da pessoa física, mas não da cauda partidária que vinha com ele: a Rede e o Psol, dois partidos totalmente de esquerda e que pertencem à coligação de Lula na eleição presidencial.
Ao, digamos, livrar-se de seu vínculo formal com a Rede, Audifax atende a uma expectativa de Manato – quiçá cumprindo um pedido do próprio candidato no acordo –, para evitar qualquer constrangimento e problema para o bolsonarista nessa nova parceria. O ex-prefeito não poderia chegar à “nova casa” já criando problemas para o anfitrião.
Vamos lembrar que, tecnicamente, Audifax estava vinculado não somente à Rede, mas à Federação Rede/Psol. Se ele tivesse permanecido na Rede, apoiadores de Manato poderiam estranhar e torcer o nariz: “Ué, Manato, mas você agora faz aliança com partidos de esquerda, ‘comunistas’?”, aquela coisa toda…
Da perspectiva daquele bolsonarismo que enxerga tudo “ou preto ou branco”, como a campanha de Manato poderia tachar em Casagrande o “socialismo” tendo como aliado o líder estadual de uma federação composta por uma sigla chamada Partido Socialismo e Liberdade (Psol)?
Não pegaria bem para Manato…
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