Coluna André Andrès
Hoje é o Dia da Pinot Noir. Mas deveria ser o Dia de Felipe, o ‘Bravo’
Ela já foi praticamente personagem de um filme, “Sideways” ou “Entre Umas e Outras”, deliciosa comédia sobre os vinhos e as vinícolas do Napa, vale produtor dos EUA. É a casta utilizada para a produção de alguns dos mais caros (e raros) tintos do planeta. E acabou se adaptando relativamente bem fora da França, onde nasceu por volta do século XIV. Por suas qualidades, acabou muito bem aceita em todo o planeta. Mas não deixa de ser surpresa o fato de a ideia de criar uma data para celebrar a casta Pinot Noir não ter surgido na Borgonha, sua região natal, e sim no estado norte-americano do Oregon.
O Dia da Pinot Noir está ligado a apreciadores de vinhos e donos de restaurantes. iradores da uva, eles se reuniram numa noite na década de 80 e decidiram homenagear a casta, bem adaptada à região onde moravam. Como várias uvas já tinham o “seu” dia, eles resolveram homenagear a Pinot Noir. Isso ocorreu em 18 de agosto, e a partir daí essa data ou a ser dedicada à casta de Borgonha.
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A Pinot Noir: casta delicada e usada na produção de alguns dos vinhos mais caros do mundo. Foto: divulgação
Borgonha… Pois é, temos de retomar esse relato a partir da antiga morada dos celtas e gauleses para fazer justiça a um homem, fundamental para a história da uva, do vinho e até da França. Corria o mês de julho do ano da graça de 1395. O duque Felipe, o Bravo, andava irritado com a uva Gamay. Para ele, era uma casta “ruim e desleal”, por ter invadido espaços antes dedicados apenas à Pinot Noir. Por que os homens do campo preferiam a Gamay? Porque era uma casta de grande produção e colhida mais rapidamente. Havia, no entanto, um problema: os vinhos não eram nada bons. Ou seja, a Gamay provocou a queda de qualidade dos tintos da região e, em consequência, a perda da arrecadação de impostos. Bateu no bolso do Duque de Borgonha. E ele ficou bravo…
Na prática, Felipe autorizou o plantio apenas de Pinot Noir na Borgonha. Ele também teria feito isso com a Chardonnay, mas essa é outra história, a ser contado em outro momento, talvez no dia da Chardonnay. Por isso, quando você for consumir vinhos da Borgonha (ou Bourgogne) é bastante provável não encontrar no rótulo o nome da uva com a qual ele é produzido. Para os ses, isso seria uma estupidez, porque se for vinho tinto é Pinot Noir, e se o vinho for branco é Chardonnay.
E se não fosse pela decisão de Felipe, a Pinot Noir não seria irada no mundo todo por ser o resumo da delicadeza em forma de uva, como é hoje. Nem o mundo do vinho ganharia rótulos como o da Domaine de La Romanée-Conti, sempre elencado entre os mais caros do mundo, ou o Richebourg, e ainda o Leroy Musigny , só para ficarmos em três grandes exemplos, além de outros tantos e tantos vinhos de grande qualidade e menor valor saídos da Borgonha. Por fim, a França não seria um país completo em termos vinícolas se não fosse a decisão do duque.
Por tudo isso, o dia de hoje não deveria ser dedicado à Pinot Noir, mas a Felipe, o Bravo. Porque mesmo sem a noção exata disso, ele determinou rumos da história ao longo dos séculos seguintes ao seu período à frente do ducado de Borgonha. Aliás, talvez ele devesse ser rebatizado e ar a se chamar Felipe, o Sábio. Teriam-lhe feito mais justiça…
(Ficou com vontade de provar um bom Pinot Noir? Amanhã faremos uma lista para quem quiser provar um. E fique tranquilo: ela vai atender quem quer gastar R$ 40 até quem pode gastar R$ 290 mil por uma garrafa…)
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