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Feminismo 4.0, uma nova versão do feminismo
- Por Nathália Cinelli
Os nossos discursos são capazes de nos fortalecer. Bem construídos e coerentes, eles nos colocam em pedestais criados pela sociedade, e somos percebidos. Conhecimento e popularidade são fatores essenciais para a construção de uma reputação. Custa-se produzir uma reputação. Basicamente, três elementos são a base da receita: agir como se fala, falar o que age e convencimento. E, pautado nesses mesmos elementos, o discurso do movimento feminista, na década de 1960, irradiou-se para os países industrializados.
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O feminismo contemporâneo luta pela “libertação” da mulher, denunciando a relação de “inferioridade” construída pela cultura. Cultura é a norma não escrita, é o comum inquestionável entre os indivíduos. E, até mesmo as vítimas do “comum” estão cegas à realidade na qual estão inseridas. Acontece que, se uma, e apenas uma, vítima ar a questionar o status quo, o comum deixa de ser inquestionável e, assim, grandes evoluções são geradas.
Devíamos saber que os discursos que já nos fortaleceram um dia podem nos enfraquecer em um piscar de olhos. Devíamos ter nos atentado que os três elementos essenciais são, de fato, essenciais. Devíamos ter tido cautela ao considerarmos que discursos que se perdem no meio do caminho fazem daqueles que o aderem seres questionáveis, lutando batalhas ilegítimas. Devíamos. E, neste ponto, aquelas vítimas voltam a se tornar vítimas e, dessa vez, do próprio discurso.
Agora, em primeira pessoa, digo que o discurso do empoderamento feminino me prejudica quando vitimiza a mulher. Ele me prejudica quando diz que eu mereço algo por ser mulher. O discurso do empoderamento me prejudica quando diz que diversidade em organizações são construídas por homens e por mulheres, como se fossem seres – completamente – distintos. Ele me prejudica quando me dá crédito por ser uma boa mulher e não por ser uma mulher boa. Lamento, mas o discurso se desfez. A sua essência se foi.
De mulheres que buscavam acabar com a crença da superioridade dos homens, amos a buscar a superioridade das mulheres, em detrimento aos demais seres. Estaríamos nós mulheres fadadas ao fracasso de nos tornarmos o nosso adversário no discurso? A luta pela igualdade se tornou uma luta de sexos, e claro, “não lute comigo, caso contrário, você provavelmente estará sendo ‘machista’. Seja você homem ou mulher. Afinal, eu, que tanto defendi o questionamento, repulso qualquer forma em que eu possa ser questionada em meu discurso”.
A razão pela qual um dia o discurso feminista havia existido foi esquecida. A luta se banalizou. Quem um dia pediu respeito se desrespeitou. O feminismo de tempos atrás ficou lá. A legitimação se converteu em vitimização. E a mulher, que quis deixar de ser vítima, ou a se portar como tal. É nesse contexto, de tantos 4.0, que surge o Feminismo 4.0. Esse é o legítimo, é aquele que já esteve no centro das lutas e é desse que precisamos ainda hoje.
Enquanto grande parte do exército batalhava por superioridade, outra parte seguia nas premissas alastradas pela década de 1960. Esta outra parte do exército enfrentou situações desiguais, desvantajosas, difíceis e chegou “lá”. Esta parte enfrentou a maternidade, com o melhor de si, e multiplicava-se em quantas mulheres fosse preciso para ser mãe e profissional. Esta parte do exército chegou a lugares tão altos nas organizações que já não era mais levado em conta seu sexo, mas seu mérito. As mulheres deste lado do exército se restringiram tanto a conquistar seus sonhos que não tiveram tempo para se abater diante do preconceito velado. As mulheres deste lado do exército construíram o ambiente de igualdade. Construíram pela garra, pela determinação, pelo mérito, por pura coragem.
Essas são as mulheres que lutam pela igualdade, aquela pleiteada lá atrás. Eu, novamente em primeira pessoa, afirmo que é desse lado que precisamos estar. Não quero que contrate meus serviços, se outra pessoa – seja homem ou mulher, tanto faz – oferece-os de forma melhor. Não me considere como um fator de diversidade em sua empresa por ser mulher, a não ser pelo meu ponto de vista diferente do seu. Não me homenageie por ser mulher, mas pelo meu mérito. Não me parabenize por ser a única mulher em uma sala de reuniões, mas acredite no meu potencial por estar lá. Não me ouça por ser mulher, ouça-me se acreditar no que eu fale. Não me respeite por ser mulher, respeite-me porque, por meu mérito, eu mereço o seu respeito.
Sobre a Autora

Nathália Cinelli. Foto: Divulgação
Nathália Cinelli é formada em Direito pela FDV, pós-graduanda em Governança, Riscos e Compliance pelo IGIDO. Atualmente é Assessora Jurídica na Apex e membro do IBEF Academy.
Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do ES360.
