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Coluna Vitor Vogas

Dito e feito: Assembleia muda regra só para ex-deputado assumir cargo

Confirmando previsão feita aqui em 18 de maio, deputados rebaixaram escolaridade exigida para preenchimento de cargo para o qual Torino Marques foi nomeado

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Marcelo Santos apresentou projeto sob medida para Torino Marques

Confirmando um vaticínio feito aqui na coluna no dia 18 de maio, deputados estaduais mudaram uma resolução interna da Assembleia Legislativa só para que um ex-colega de plenário possa assumir um cargo comissionado na estrutura da Casa de Leis. Na mesma data, o ex-deputado Torino Marques (PTB) foi nomeado pelo presidente da Casa, Marcelo Santos (Podemos), para exercer o cargo de supervisor de Redação Integrada/Jornalismo, ligado à Secretaria de Comunicação e com salário de R$ 5,3 mil.

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Só havia um problema: Torino não possui diploma de graduação em Jornalismo, requisito que é (ou era) indispensável para o exercício da função, conforme disposto na Resolução nº 2.890, de 2010.

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Mas, se as regras impedem uma nomeação, pior para as regras. Sem nenhum embaraço, os deputados deram um “jeitinho legislativo” para que Torino possa enfim assumir o cargo para o qual foi nomeado sem possuir a escolaridade exigida. Como? Alterando a exigência.

O caminho encontrado para isso foi o Projeto de Resolução 21/2023, apresentado no último dia 6 pela Mesa Diretora, presidida por Marcelo Santos. O projeto é bem extenso e trata de uma gama de assuntos diversos, incluindo a estruturação da Procuradoria da Mulher e de duas comissões da Assembleia, além da mudança e da criação de cargos comissionados.

Lá no meio, nos artigos 9º e 10º, deram um jeito de embutir a mudança introduzida sob medida (é evidente) para contemplar Torino.

Agora, em vez de “curso superior completo”, o ocupante do cargo em questão pode apresentar “ensino médio completo com registro profissional de jornalista”. E, no lugar de “curso superior em Comunicação Social, Jornalismo ou congênere”, basta possuir o registro profissional.

Só para frisar: Torino tem o registro.

Foi, enfim, “a Emenda Torino”, como aqui a denominamos no último dia 6.

O projeto foi aprovado em plenário por votação simbólica, na última segunda-feira (12). No Dia dos Namorados, Torino ganhou um presentão e deu novo match com a Assembleia, agora como servidor em comissão, ocupando cargo de livre nomeação e escolhido a dedo por Marcelo Santos.

Delegado abriu o caminho

O projeto de Marcelo Santos acolheu quase integralmente uma indicação protocolada pelo deputado Delegado Danilo Bahiense (PL) no dia 29 de maio, sugerindo à Mesa Diretora que mudasse o regramento interno da Assembleia exatamente como agora foi feito, permitindo que o cargo de secretário de Redação Integrada/Jornalismo possa ser exercido mediante apresentação de registro profissional de jornalista. O nome de Torino não é citado na indicação de Bahiense, mas esta também foi feita sob medida para o ex-parlamentar.

Na verdade, a indicação de Bahiense era ainda mais “frouxa”, já que sugeria a supressão total do trecho que especificava a escolaridade necessária para o cargo.

Torino e Bahiense chegaram juntos à Assembleia na eleição de 2018, pelo mesmo partido, o PSL, sigla pela qual Jair Bolsonaro chegou à Presidência no mesmo ano. Os dois foram colegas na bancada do PSL, da direita bolsonarista e da oposição ao governo Casagrande (PSB).

Casuísmo na veia

Como já ponderei aqui, não me cabe avaliar a competência do jornalista Torino Marques nem estou colocando em dúvida sua capacidade técnica para exercer o cargo. Além do registro profissional, suas quatro décadas de exercício do jornalismo em emissoras de rádio e televisão não deixam dúvida quanto à sua experiência prática na área. Não se trata disso.

A questão é que, neste episódio, fica aquela marca indelével do casuísmo, da acomodação das regras e leis a situações concretas, em benefício de amigos e aliados.

Seguindo à risca o que diz a Resolução 2.890/2010, o ex-deputado foi nomeado para um cargo que simplesmente não poderia exercer. Mas “seus problemas acabaram”. A lei foi adaptada e “ajustada” especificamente para atender à necessidade de um aliado político de Marcelo e outros deputados – nesse caso, com o sarrafo sendo colocado mais para baixo.

A norma não foi modificada para exigir maior qualificação nem melhor formação acadêmica.

A resposta da Assembleia

Na tarde esta quinta-feira (15), após a publicação desta coluna, a Secretaria de Comunicação da Assembleia enviou à coluna a nota oficial reproduzida abaixo na íntegra:

Ao longo dos últimos anos, a Secretaria de Comunicação da Assembleia Legislativa tem ado por transformações significativas para se adequar aos novos modelos da comunicação. Em 2017, na gestão do então presidente Erick Musso, considerou que o cargo de coordenador de web deveria ar por uma ampliação em seu escopo de atuação, dado o crescimento da internet e das redes sociais, e a função poderia ar a ser exercida também por profissional da área de Tecnologia da Informação.

Em 2019, em mais uma intervenção benéfica, foi criado o departamento de comunicação institucional e interna, com a finalidade de unificar linguagens e fluxos e conferir caráter ainda mais profissional à comunicação legislativa.

A nomeação o jornalista Torino Marques para o posto de Supervisor da Redação Integrada da Comunicação da Assembleia não fere qualquer legislação vigente, nem mesmo a federal, que desde 2009 desobriga a existência do diploma para o exercício da atividade de jornalista. Embora a Assembleia tenha orgulho de todos os seus jornalistas diplomados, não se pode medir ou diminuir a capacidade de um profissional com experiência comprovada e 30 anos de serviços prestados em veículos de comunicação por não ter um certificado universitário.

Não se trata, portanto, de beneficiar, e sim de reconhecer talentos e dar a eles espaços para realizar uma comunicação pública de qualidade. Essa é a nossa missão.

Secretaria de Comunicação Social
Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo