Coluna Vitor Vogas
Audifax: do “estou vivo” a “não é questão de sobrevivência política”
Da sobrevivência física à política em oito anos, em uma boa entrevista, ex-prefeito responde sobre os motivos de sua nova candidatura na Serra, o conflito eleitoral “novo x velho” (segundo ele, equivocado), os apoios que buscará no 2º turno e sua relação política com Casagrande

Audifax Barcelos foi entrevistado no EStúdio 360. Foto: Reprodução/Instagram
A eleição à Prefeitura da Serra em 2016 entrou para os livros de história política do Espírito Santo e para os manuais de marketing eleitoral como um case. Por décadas, será lembrada por conta da virada antológica de Audifax Barcelos sobre Sergio Vidigal. No auge da campanha, Audifax mergulhou em um quadro grave de pneumonia e ou semanas internado num hospital, entre a vida e a morte. O então prefeito chegou a ser desenganado. Mas sobreviveu.
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Sobreviveu, mas precisava provar à população da Serra que havia sobrevivido. Muitos duvidavam do “milagre”. Era o que as pessoas se perguntavam nas ruas, o que todos queriam saber – e alguns precisavam ver para crer. Então, em estado comovente, fisicamente em frangalhos, Audifax foi colocado no alto de um trio elétrico e ou a reta final do 1º turno a circular pelas ruas e repetir ao microfone, dando “prova de vida” e testemunho vivo do “milagre”: “Serra, estou vivo!”
Numa campanha que acabou sendo regida pela comoção e ganhando um tom quase bíblico, Audifax ou ao 2º turno e derrotou de virada Vidigal, impondo a segunda e inesperada derrota eleitoral seguida à sua nêmesis. É óbvio que não foi nada planejado. Audifax não escolheu quase morrer. Mas, astutamente, sua campanha fez do limão uma limonada: o fato de ter quase morrido, mas, principalmente, o de ter sobrevivido para contar a história, além da compaixão gerada pelo drama: tudo isso acabou se revertendo em seu benefício.
Ter sobrevivido fisicamente, enfim, ajudou-o a manter-se prefeito. Isso foi há oito anos.
Duas eleições municipais depois, Audifax goza de boa saúde – e oxalá assim continue. Mas a questão de “sobrevivência” que se coloca para o ex-prefeito é outra. O que pode estar em jogo agora é a sua sobrevivência política.
O economista já foi prefeito da Serra por três mandatos, de 2005 a 2008 e, depois, de 2013 a 2020. Mas, desde 2020, está sem mandato. Tentou ser governador em 2022, mas não teve sucesso. Se não voltar agora à Prefeitura da Serra, Audifax pode ficar oito anos, pelo menos, sem mandato – até 2028.
Até a próxima eleição municipal, haverá a estadual de 2026. Mas uma nova candidatura de Audifax a governador soa improvável. Para o Parlamento (deputado estadual, federal ou senador), ele até pode concorrer… Mas já demonstrou e confidenciou não sentir vocação para o Legislativo. Não curtiu sua curta experiência como deputado federal, de 2011 a 2012.
Por isso, na entrevista do ex-prefeito nessa terça-feira (17) ao EStúdio 360, telejornal da TV Capixaba/Band, fizemos a ele uma pergunta um pouco incômoda, mas oportuna: por acaso sua candidatura agora responde, antes de tudo, a uma necessidade de “sobrevivência política”?
Audifax foi peremptório na negativa. Disse, em outras palavras, que não tem apego ao poder; que está na política, como sempre esteve, por vocação, e assim permanece; que sempre se sentiu vocacionado para o serviço público, por isso pretende seguir na vida pública e voltar a servir à população da Serra; que se sente o candidato mais preparado para governar, nos próximos anos, o maior município capixaba, durante um período particularmente desafiador, devido sobretudo à perda financeira esperada pela Serra, assim como Vitória e tantas outras cidades, em função da reforma tributária.
Eis as palavras exatas do candidato do PP:
“Eu entrei na política para servir à população. Estou na istração pública há aproximadamente 40 anos. Sou funcionário público efetivo da Prefeitura de Vitória, já fui professor da Escola Técnica, entrei no serviço público por opção da minha vida. Tive oportunidade na iniciativa privada e trabalhei e falei ‘Não, eu quero voltar para o público’. Porque a minha vida é no setor público. Não estou na política para sobrevivência política, não estou na política porque preciso dela, não. Graças a Deus, não tenho filho e nenhum parente ligado a política nenhuma. Eu tenho meus filhos até fora daqui trabalhando, estudando. Minha vida, meu perfil é não atrelar a política para sobrevivência. Nunca fiz isso, não abro mão dos meus princípios, nunca abri e nem vou abrir”, afirmou o ex-prefeito.
A resposta incluiu uma alfinetada em Vidigal, na menção a “filho na política”: o primogênito do atual prefeito, Eduardo Vidigal, é diretor-presidente do IPEM-ES no governo de Renato Casagrande (PSB), aliado de Vidigal e apoiador de Weverson Meireles (PDT), o candidato da situação na Serra.
“Eu estou vindo como candidato a prefeito muito pela minha responsabilidade, pelo amor da minha cidade. E sinto que a cidade corria riscos, e a gente não pode, eu como líder da cidade, deixar esses riscos acontecerem ou isso se concretizar”, completou Audifax.
A referência a “riscos” – dessa vez – tem mais a ver com “riscos econômicos” do que propriamente políticos, já que, com a reforma tributária, a cidade mais populosa e com o maior PIB do Espírito Santo terá de ser liderada em “tempos bicudos”, durante a travessia de um “nevoeiro espesso” – como diria o ex-governador Paulo Hartung, de quem Audifax, aliás, foi secretário estadual de Planejamento.
Pelos cálculos do ex-prefeito – cujos conhecimentos são inegáveis em finanças e contabilidade pública –, os impactos da reforma, que devem começar a se sentir a partir de 2029, podem gerar uma perda de até R$ 300 milhões por ano na arrecadação da Serra.
“Velho” x “Novo”: “Não, não é essa a questão”
Outra questão que se impõe a Audifax, 60 anos – 40 deles, como ele mesmo frisou, dedicados à vida pública –, e que endereçamos a ele na entrevista, diz respeito à possível “fadiga de material” e, mais que isso, ao possível “esgotamento” do ciclo de alternância dos mesmos dois prefeitos no poder, já que ele e Vidigal se revezam no cargo, literalmente, desde o século ado, há exatos 28 anos.
Os dois principais adversários de Audifax, Pablo Muribeca (Republicanos) e Weverson Meireles (PDT), são bem mais jovens que ele, tanto na idade (33 cada um) quanto na vida pública. Como democrata que é, por acaso o ex-prefeito não avalia que seria salutar para o município uma renovação no poder? Foi o que o lhe perguntamos.
Respeitosamente, Audifax contrapôs-se ao questionamento, formulado, para ele, em termos equivocados.
Segundo o ex-prefeito, o cerne da pergunta (número de mandatos, idade, quilometragem na vida pública) não corresponde ao verdadeiro cerne da eleição a prefeito da Serra. Na avaliação de Audifax, a questão primordial não é quem já governou a Serra nem quantos mandatos já exerceu, mas quem está mais preparado para governar a cidade neste momento.
“Essa não é a discussão, e sim quem está mais preparado para a cidade, quem pode tocar melhor essa cidade, em função de alguns riscos que nós temos: reforma tributária, queda da arrecadação. Essa é a questão”, “corrigiu” Audifax.
Curiosamente, ao destacar a própria experiência e preparação, Audifax inverte o sinal e ressignifica a oposição entre o “velho” e o “novo”. Nesse caso, ter muto mais experiência comprovada que seus dois principais oponentes contaria a favor dele, ainda mais em um momento delicado para o qual a maior parte da população ainda não atentou.
“A questão não é se é o primeiro, ou se é o segundo, se é o terceiro, se é o quarto… Essa não é questão. A questão também não é ‘o novo contra o velho’ ou ‘o velho contra o novo’, isso também para mim é uma questão pequena e muito rasa de discutir. Para mim, a questão principal para a cidade é: quem está mais preparado para ser prefeito? De fato, quem é o mais experiente para ser prefeito dessa cidade? De fato, quem tem as melhores propostas para ser prefeito dessa cidade? No meu terceiro mandato, a gente teve coisas marcantes para essa cidade. Não foi no primeiro mandato, foi no terceiro. A obra do Hospital Materno Infantil, o início e o término foi todo na nossa gestão, a UPA de Castelândia foi toda na nossa gestão, o Contorno do Mestre Álvaro…”, exemplificou Audifax.
Segundo turno: “Vou conversar”
As pesquisas eleitorais já publicadas por Rede Gazeta e Rede Vitória antes e durante a campanha têm cristalizado duas tendências: 1) a Serra terá 2º turno; 2) Audifax muito provavelmente será um dos dois finalistas. Até agora, em todas as sondagens, o ex-prefeito tem se mostrado muito sólido na casa dos 35%. Nem ganha nem perde. Fica ali, em torno dessa marca.
Na última da Futura para a Rede Vitória, publicada na semana ada, Muribeca e Weverson empataram tecnicamente em 2º lugar, dentro da margem de erro. O mais próximo do líder, Muribeca, está mais de 10 pontos percentuais atrás de Audifax.
Dado esse cenário, perguntamos também a Audifax: confirmada a ida dele para a segunda fase, no dia 6 de outubro, ele vai procurar Muribeca e pedir o apoio do deputado se o seu adversário no 2º turno for Weverson? E se ocorrer o contrário? Ele pedirá apoio a Muribeca em um confronto direto contra o candidato de Vidigal?
Audifax não deu detalhes nem se aprofundou, mas garantiu: “vai conversar”.
“Sem abrir mão de princípio, sem abrir mão do foco da gestão, sem abrir mão de fazer cada vez mais para a população que mais precisa, que eu amo muito, dedico muito a minha vida, e a cidade conhece isso… Você se lembra o que aconteceu até comigo em 2016, daquele estado em que eu estava entre a vida e a morte e a população sabe. Não tô falando da boca para fora. Deus sabe daquele propósito meu e o meu propósito é o mesmo, de servir à cidade. Então, sem abrir mão de princípio, sem abrir mão de fazer cada vez mais para a cidade da Serra, eu vou conversar, eu vou conversar”.
“Conversar” não só com outros candidatos. “Ganhando a eleição, vou conversar no mesmo dia, vou ligar para o governador pedindo ajuda. Se tiver que ligar para alguém do Governo Federal, irei fazer, para fazer muito mais para a cidade, se Deus quiser.”
A relação com Casagrande: “ou”
Por falar nisso, na última eleição para governador, Audifax – que já não era muito próximo a Casagrande – rompeu de vez com o governador, que acabaria se reelegendo. Na reta final do 1º turno, em entrevistas e debates, o ex-prefeito bateu duramente em Casagrande. Nos primeiros dias do 2º, declarou apoio a Manato (PL), que o apoia agora para prefeito, e subiu no palanque do adversário de Casagrande.
Além disso, mesmo tendo sido candidato a governador pela Rede, que estava na coligação de Lula, Audifax em momento algum declarou apoio ao petista para a Presidência. E, de novo: no 2º turno estadual, apoiou Manato, o candidato de Jair Bolsonaro (PL).
Por tudo isso, também lhe perguntamos: e agora? Se ele voltar a governar a Serra, será possível reatar essa relação com o chefe dos governos estadual e federal? Segundo Audifax, sim, sem problema algum.
“Eu nunca fiz nenhum ataque pessoal ao governador. Nunca fiz nenhum desrespeito à sua vida, à sua família, a questão pessoal dele. Tive uma discussão de gestão sobre política, e ou. Aquilo que eu sempre costumo falar: eu fui prefeito com Dilma, com Lula, com Bolsonaro, com Michel Temer. Fui prefeito com o governador Paulo Hartung, governador Casagrande, então eu sei fazer isso. […] Quero tranquilizar a população de que todos os investimentos, ou quase todos, os investimentos que eu consegui para a Serra foi em parceria com o Governo do Estado e o Governo Federal e, se Deus quiser, voltando a ser prefeito, vamos fazer a mesma prática tanto com o Governo do Estado quanto com o Governo Federal.”
