Coluna Vitor Vogas
“Ação policialesca e eleitoreira”, diz procurador de Vidigal sobre Muribeca
Em reação fortíssima contra “Operação Peixada”, Prefeitura da Serra vai processar o deputado, policiais e três vereadores de oposição em 5 frentes

Pablo Muribeca x Sérgio Vidigal
“Nem ocorrência, muito menos operação. O que houve foi uma ação politiqueira e policialesca que escapa à própria função sublime de um parlamentar. Uma espetacularização de uma politicagem.” Assim o procurador-geral da Serra, Edinaldo Loureiro Ferraz, define o episódio que aumentou ainda mais a já bastante elevada temperatura política do município governado pelo prefeito Sérgio Vidigal (PDT), na última sexta-feira (17): a chamada “Operação Peixada”, como foi batizada pelo deputado Pablo Muribeca e pelos vereadores Anderson Muniz (Podemos), Darcy Junior (Patriota) e Professor Artur (Solidariedade).
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Na ocasião, o subsecretário de Trabalho e Renda da Prefeitura de Serra, Renato Ribeiro, foi acusado pelos quatro parlamentares de oposição a Vidigal de manter um suposto esquema de favorecimento na fila da procura por vagas de emprego no Sine do município. Após o cumprimento de diligências na agência, ele acompanhou policiais militares até uma delegacia da Polícia Civil, onde prestou depoimento e foi liberado. Toda a ação policial foi acompanhada pessoalmente e amplamente registrada em suas redes sociais pelo deputado Pablo Muribeca – que nesta semana lançará sua pré-candidatura a prefeito pelo Republicanos – e pelos três vereadores citados.
Em uma reação fortíssima, a Prefeitura da Serra, representada legalmente por Edinaldo Ferraz, decidiu processar os quatro parlamentares envolvidos na “operação” de sexta-feira, em múltiplas frentes jurídicas.
Na tarde desta segunda-feira (20), o procurador-geral confirmou o rol de medidas legais já definidas pela istração de Vidigal contra os oposicionistas, que, segundo ele, extrapolaram em muito suas prerrogativas e seu poder de fiscalização. Ao todo, serão cinco providências concretas listadas em nota à imprensa pela assessoria de comunicação da Prefeitura e corroboradas por Ferraz, junto à Justiça comum, ao Ministério Público Estadual e às Corregedorias da Polícia Militar, da Assembleia Legislativa e da Câmara Municipal da Serra:
1. Ação judicial contra os quatro parlamentares por danos morais, abuso de poder e perturbação do normal funcionamento de serviço público;
2. Representação contra o deputado Pablo Muribeca na Corregedoria da Assembleia Legislativa, por quebra de decoro parlamentar e abuso de poder;
3. Representação contra os vereadores Anderson Muniz, Professor Artur e Darcy Junior na Corregedoria da Câmara Municipal da Serra, por quebra de decoro parlamentar e abuso de poder;
4. Ação na Corregedoria da Polícia Militar contra os policiais que conduziram o servidor público municipal até a delegacia e apreenderam objetos, sem mandado judicial;
5. Denúncia contra os parlamentares (deputado e vereadores) ao Ministério Público Estadual, por abuso de poder político.
O QUE OCORREU NA SEXTA-FEIRA (17)
Com grande exploração do caso em suas redes sociais, os quatro parlamentares – todos de oposição a Vidigal – denunciaram suposto esquema de direcionamento de vagas de emprego no Sine da Serra em troca de votos para o atual prefeito e seu grupo nas eleições municipais de 2024.
Muribeca afirma que a denúncia partiu de uma servidora efetiva do próprio órgão e que foi chamado ao local na sexta-feira pelos vereadores mencionados. Chegando ao Sine, ele mesmo teria acionado o Ciodes para apuração in loco da denúncia. O subsecretário, então, foi levado para prestar depoimento em delegacia da Polícia Civil, assim como a autora original da denúncia.
À reportagem do Portal ES360, o deputado disse ter encontrado, na gaveta do subsecretário, vários currículos de pessoas que seriam favorecidas na fila para obtenção de vagas de emprego, em um esquema de “compra de votos” atribuído por ele à aproximação das eleições municipais do ano que vem.
Falando em “situação gravíssima” e em “barganha eleitoral”, o vereador Anderson Muniz afirmou à nossa reportagem que teria havido flagrante de que o subsecretário direcionaria irregularmente os currículos no Sine, em benefício dos apadrinhados políticos. Ribeiro, segundo o vereador, também enviaria mensagens de cunho eleitoral aos candidatos a uma vaga de emprego registrados na agência. A prática, completa Muniz, pode configurar improbidade istrativa, por ferir o princípio constitucional da impessoalidade.
Ainda segundo o parlamentar, teriam sido encontradas, no celular institucional do secretário, mensagens enviadas para empresas do município solicitando empregos para determinados candidatos.
O POSICIONAMENTO DA POLÍCIA CIVIL
Entretanto, a nota oficial enviada ainda na sexta-feira pela Polícia Civil diminui bastante a temperatura e atenua consideravelmente a gravidade atribuída ao que os próprios parlamentares envolvidos denominaram “Operação Peixada”:
“A Polícia Civil informa que o servidor municipal, levado à Delegacia Regional de Serra, foi ouvido e liberado pela autoridade policial, visto que, após análise, não foi possível concluir se houve crime. Diante da falta de elementos conclusivos e da necessidade de apuração mais detalhada, não foi adotado nenhum procedimento flagrancial em desfavor dos envolvidos. Será encaminhada uma cópia dos autos para as Corregedorias da Assembleia Legislativa (Ales) e da Polícia Militar (PMES) para conhecimento e providências cabíveis.”
Desse modo, a primeira contradição da narrativa dos parlamentares é que, tecnicamente, não houve nenhum “flagrante”, segundo a própria autoridade policial.
A ELEVAÇÃO DO TOM DA PREFEITURA
Ainda na sexta-feira – mas antes do posicionamento oficial da Polícia Civil –, a Prefeitura da Serra enviou uma primeira nota, bem mais tímida que a que se seguiria. Não fazia nem menção a possíveis reações contra os parlamentares envolvidos no episódio e, na defensiva, destacava a abertura de sindicância interna:
“A Secretaria Municipal de Trabalho, Emprego e Renda da Serra (Seter) informa que preza pelos princípios da transparência da gestão pública. Informa, também, que será aberta uma sindicância para a apuração dos fatos e está aguardando a manifestação das autoridades policiais. A Seter ressalta, ainda, que o servidor atua desde o início da gestão, em 2021, e que nunca houve denúncias de usuários do serviço sobre sua conduta profissional.”
Aí veio “a manifestação das autoridades policiais” aguardada pela Prefeitura da Serra. Como visto acima, a Polícia Civil tirou consideravelmente o peso das primeiras acusações. Foi a senha para a equipe de Vidigal ir com tudo para cima de Muribeca e companhia. Em nova nota, divulgada no fim de semana, a Prefeitura listou, uma por uma, as providências jurídicas a serem tomadas, classificando a ação dos parlamentares de oposição como um “episódio lamentável”:
“Diante do lamentável episódio que aconteceu nesta sexta-feira (17), no Sine da Serra, envolvendo o deputado estadual Pablo Muribeca, policiais militares, vereadores e o subsecretário municipal de Trabalho, Emprego e Renda, Renato Ribeiro, o Município da Serra, por intermédio de sua Procuradoria-Geral, vai entrar com uma ação judicial por danos morais, abuso de poder, perturbação do normal funcionamento de serviço público contra os parlamentares. Também vai fazer uma representação contra o deputado Pablo Muribeca e contra os vereadores que participaram da abordagem abusiva ao servidor nas Corregedorias da Assembleia Legislativa do Espírito Santo e da Câmara Municipal da Serra, por quebra de decoro parlamentar e abuso de poder. A defesa municipal também vai denunciar os parlamentares (deputado e vereadores) ao Ministério Público Estadual. A Corregedoria da Polícia Militar também será acionada pelo município, contra os policiais militares que conduziram o servidor público municipal até a delegacia e apreenderam objetos, sem mandado judicial.”
ENTREVISTA: EDINALDO LOUREIRO FERRAZ, PROCURADOR-GERAL DA SERRA
Apontando inequívoco abuso de poder e quebra de decoro por parte de Muribeca e dos três vereadores, o representante jurídico dos interesses do município da Serra concedeu à coluna a entrevista abaixo, na qual ainda subiu alguns tons em relação à segunda nota da Prefeitura.
Segundo Ferraz, os parlamentares praticaram uma “loucura” e um “absurdo”, pois não têm competência para agir como agiram nem podem exercer daquela forma seu poder fiscalizatório, desrespeitando, segundo ele, o Estado Democrático de Direito. De acordo com o procurador, comenta-se que um dos policiais que atenderam ao chamado de Muribeca seria parente do deputado (alegação desmentida pela assessoria do parlamentar serrano).
Do ponto de vista da Prefeitura Municipal da Serra, o que foi exatamente que ocorreu na última sexta-feira? Foi uma ocorrência policial? Uma operação policial? Que definição vocês dão?
Não teve operação policial e sim operação de alguns parlamentares, que inclusive deram o nome à “operação”, numa ação policialesca, de “Peixada”. Foram eles que batizaram. Não vou nem entrar no mérito da acusação deles. Para isso, a Prefeitura da Serra vai abrir uma sindicância para apurar a conduta de todos os servidores do Sine. O que posso lhe dizer é que o Sine da Serra tem sido um exemplo de órgão exitoso na empregabilidade de quem o procura. Isso é um fato. E em nenhum momento, posso lhe garantir, o Doutor Sérgio Vidigal compactua com irregularidade de quem quer que seja.
Então o senhor não pode dizer se houve ou não houve irregularidades? Não pode atestar a inocência de Renato Ribeiro?
Não posso afirmar se tem ou não tem irregularidades. Esse não é meu papel. O que posso dizer é que, aqui na Procuradoria, por exemplo, todo dia recebemos currículos de pessoas que pedem emprego. São pessoas que nunca me viram. Isso é normal, não estou me referindo especificamente ao Sine. E, eventualmente, verificamos a possibilidade de atender, de acordo com o perfil da pessoa e a disponibilidade de vagas. Isso é comum, e não há nenhuma irregularidade nisso. Digo isso porque os parlamentares alegam ter encontrado currículos na gaveta do subsecretário.
Quem acionou a Polícia Militar e quem atendeu ao chamado no Sine na sexta-feira?
Eu não sei por quê, honestamente, foi muito rápida a chegada da Polícia Militar ao local. Comenta-se que, entre os militares que estiveram no local da diligência, um deles seria parente do deputado Pablo Muribeca. Se é mesmo parente, não houve impessoalidade. Assim como um juiz, por exemplo, deveria ter declarado suspeição. De todo modo, veja, os parlamentares estão dizendo que eles “conduziram” o subsecretário à delegacia. Ora, o vereador e o deputado não têm a prerrogativa nem a competência de conduzir ninguém, salvo se em representação de uma I ou uma comissão oficialmente instaurada, e mesmo a comissão tem que pedir autorização à Mesa Diretora da Casa para fazer essa fiscalização. Eles têm função investigatória no sentido da sua ação parlamentar e não da sua individualidade. Não podem entrar e tumultuar um serviço público. Onde já se viu isso? Um deputado foi fazer “apreensão de celular”… Isso não existe, é uma coisa inusitada! É tão absurdo que é difícil até a gente imaginar que um deputado, sendo uma pessoa esclarecida, faça uma loucura dessas, abrindo gaveteiro de uma repartição pública…
Afinal, quem foi que conduziu Renato Ribeiro à delegacia?
O Professor Renato foi voluntariamente à delegacia no carro da polícia, ele e a servidora efetiva que é a autora da denúncia. Eles dizem que houve um “flagrante”. Ora, não há estado flagrancial, tanto é que o próprio delegado não encontrou elementos para justificar eventual lavratura de flagrante contra o Professor Renato ou quem quer que seja. Não houve flagrante. Podem encontrar problemas no Sine? Podem. Mas após uma investigação. Esse fato requer uma investigação, e não uma ação politiqueira e policialesca que escapa à própria função sublime de um parlamentar. O que se viu foi uma espetacularização de uma politicagem.
Havia mandado contra ele?
De jeito nenhum.
Quem atendeu à ocorrência?
Só os PMs chamados pelo Muribeca.
O senhor diria que, agora, a Prefeitura da Serra não medirá esforços para que os parlamentares envolvidos no episódio respondam pela conduta mantida no episódio?
Eu diria que teve quebra de decoro e abuso de poder. Abusaram de um poder de fiscalização que eles não têm na forma como foi exercida. Não é que a Câmara e a Assembleia não tenham poder de fiscalização, mas um deputado não pode exercer esse poder daquela forma, muito menos se arvorar como representante da Assembleia, sem um ofício do presidente da Assembleia pedindo informação. A mesma coisa eu diria sobre a Câmara. Esse é o Estado Democrático de Direito. Um não pode se imiscuir na ação de outro. Para nós, ficou bem caracterizada a questão do abuso de poder, nos vídeos e no comportamento deles.
A CONTRARREAÇÃO DE MURIBECA
Em contrarreação, a assessoria de Pablo Muribeca negou parentesco do deputado com qualquer policial envolvido na ação no Sine e divulgou a nota abaixo na tarde desta segunda-feira (20), enfatizando que teme inclusive que a servidora denunciante seja retaliada e sofra perseguição por parte da istração de Vidigal – como, segundo afirma o deputado, já viria sofrendo.
O Deputado Pablo Muribeca e os Vereadores Anderson Muniz, Artur Costa e Darcy Junior vêm a público reiterar que toda a ação realizada na “Operação Peixada” atendeu inteiramente à legalidade e aos princípios do ordenamento jurídico.
Após receberem denúncias gravíssimas de servidores efetivos e comissionados, os parlamentares constataram o uso político e eleitoral do SINE da Serra com favorecimento a apadrinhados do Secretário Adjunto.
A Operação foi integralmente filmada, o que confirma a ausência de qualquer abuso praticado pelos parlamentares que agiam no gozo de suas prerrogativas, especialmente porque qualquer cidadão tem o direito de impedir situações flagrantes de ilegalidade, tendo a Polícia Militar sido acionada pelo 190 e enviado viatura ao local, seguindo os trâmites que a lei impõe – negando, inclusive, que qualquer policial seja parente do Deputado.
As filmagens disponíveis ao público e à imprensa revelam que uma denúncia havia sido formalizada no Ministério Público. Nessas gravações, observa-se que subordinados do Secretário tentavam ocultar celulares oficiais e deletar mensagens evidenciando as fraudes no SINE. Não houve apreensão de celular realizada por parte dos parlamentares.
Assim, o Deputado e os Vereadores já esperavam intimidação por parte do Prefeito da Serra e informam que continuarão a defender o povo, estando à disposição com tranquilidade dos órgãos de controle e cobrando veementemente que os verdadeiros criminosos sejam punidos pelo uso fraudulento do SINE da Serra.
Em tempo, o Deputado e os Vereadores acompanharão com olhos de lupa qualquer perseguição à servidora efetiva que denunciou o esquema e esperam do Prefeito Sérgio Vidigal que, pela primeira vez, tenha postura enérgica contra a corrupção em sua gestão.
