Coluna João Gualberto
A Argentina e a persistência da polarização
Vamos pensar na eleição de Javier Milei. Ele foi um candidato totalmente sintonizado com Jair Bolsonaro e seus métodos políticos em todo o primeiro turno
A derrota de Jair Bolsonaro nas eleições do ano ado produziu, de imediato, acirramento da polarização que já havia caracterizado todo o processo eleitoral. Para tentar dar um golpe, a extrema direita organizou-se acampada na porta dos quartéis. Embora mantivesse um isolamento das ruas e poucas manifestações verbais, o então presidente comportou-se de forma a favorecer claramente esses movimentos com claros movimentos nos bastidores.
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Quando essa massa, que se manteve mobilizada, ensaiou uma tomada, pouco viável, do poder, pela invasão que todos vimos em Brasília, a mobilização ficou comprometida O novo governo ganhou o apoio das instituições da sociedade, e a longa exposição do 08 de janeiro na mídia enfraqueceu os setores mais conversadores nas ruas. A ação do STF também provocou mais cautela. Até hoje, essa capacidade de mobilização não foi retomada. Um elo na corrente da polarização pelo lado conservador ficou fragilizado.
A estratégia mudou. Já fiz referência em outros textos ao fato que o PL, partido do casal Bolsonaro, estar se organizando a partir da força evangélica da ex-primeira-dama. Em estratégia inteligente o casal viaja junto, mas parecendo que não está em um mesmo movimento. Ela é a peça mais importante nesse momento. Mobiliza para grandes eventos, nos quais o marido aparece rapidamente. Entretanto fica na mesma cidade do evento, em encontros estratégicos com seus correligionários e construindo articulações para as eleições municipais. Michele também ajuda a filiar milhares de mulheres ao mesmo PL. Muito eficiente como manobra para fazer crescer o bolsonarismo nas bases. Boa estratégia.
Outro ponto importante é o modo como a direita trabalha a persistência da polarização política. Todas as oportunidades para chegar às redes sociais, sobretudo ao WhatsApp, com suas teses e artimanhas que são aproveitadas ao máximo. Foi assim nas eleições para os conselhos tutelares, no posicionamento quanto a Guerra Israel-Palestina e mais recentemente quanto a eleição na Argentina.
Vamos pensar na eleição de Javier Milei. Ele foi um candidato totalmente sintonizado com Jair Bolsonaro e seus métodos políticos em todo o primeiro turno. No segundo, fez uma aliança clara com a direita tradicional da Argentina, mas manteve o gestual do ex-presidente, sobretudo na imagem de distância com a política tradicional. Sua vitória foi surpreendente pela expressividade. Abriu mais de dez pontos com o rival peronista.
A vitória foi saudada pela direita brasileira com euforia, como se fosse sua. O sucesso argentino da copa do mundo foi comparado a eleição do novo presidente. Perdemos a copa e elegemos o 13, a mensagem circulou na internet, fazendo a comparação da política com o mundo do esporte. Caso a gestão Milei seja um sucesso e leve adiante suas teses ultra-liberais, o bolsonarismo tentará se apropriar desse fato para alimentar a polarização com as esquerdas no Brasil.
Assim, cada fato que não parecia fazer parte da polarização, acaba por acirrar o fenômeno político. A Guerra em Gaza, as eleições na Holanda, as eleições americanas, a indicação de Flávio Dino ao STF, ou as descobertas de fatos do ado de algum artista, como ocorreu com Caetano Veloso ou com Xuxa. Vale tudo. O fato é que as ruas estão vazias de manifestações, mas as redes sociais alimentam a polarização, que se acentua. Quem apostava, como eu, em tempos de mais paz perdeu a aposta.
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