Coluna Vitor Vogas
Do “arcaico” ao “novo”: dois pilares da campanha de Erick Musso
Os bastidores do evento do Republicanos com Erick, Pazolini, Meneguelli e companhia. E a nossa análise do discurso do pré-candidato a governador

Erick Musso e Lorenzo Pazolini. Foto: Assessoria de Erick Musso
O presidente da Assembleia Legislativa, Erick Musso, deu início, diante de sua militância, na noite da última quinta-feira (19), ao que ele mesmo definiu como o maior desafio da sua trajetória até aqui: a campanha ao governo do Estado. Em evento de seu partido, o Republicanos, no clube Recreio dos Olhos, em Maruípe, Vitória, Erick também ergueu os dois pilares do que deverá ser o seu discurso de campanha, falando por pouco mais de dez minutos às centenas de militantes que foram prestigiá-lo. Foi rápido, mas deu para ter uma ideia clara de qual será a sua estratégia discursiva:
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Com uma mão, apresentar uma série de críticas respeitosas, mas incisivas, ao governo de Renato Casagrande (PSB), ponto por ponto, área por área, sublinhando, inclusive com números, as deficiências e os resultados ruins; com a outra, ressaltar a juventude e a precocidade política (dele mesmo e de aliados que o cercam) e investir maciçamente na retórica da renovação política contra um governador que, como ele mesmo enfatizou, está indo para a sua sexta eleição ao governo do Espírito Santo (o que é verdade, se contarmos aquela de 1994, na qual o socialista, com um ano a menos do que Erick tem hoje, concorreu como candidato a vice-governador de Vitor Buaiz).
É uma estratégia que pode ser resumida como a antítese entre dois adjetivos utilizados por Erick, em seu discurso-teste feito em cima do palanque no citado clube em Maruípe: o duelo do “novo” (representado, naturalmente, por ele mesmo e seu grupo) contra o “arcaico” (encarnado, no caso, pelo atual governador). Assim o deputado de 35 anos referiu-se ao governo Casagrande, e ainda enfileirou “atrasado” e “retrógrado”.
Os predicativos foram usados no contexto da crítica do pré-candidato à baixa cobertura de internet e telefonia móvel pelas estradas que cortam o território capixaba, mas o substantivo usado foi “governo”, o que transmite bem aquela relação dicotômica que Erick pretende explorar: dá licença, velha guarda, que a juventude quer ar! Abra alas, “governo arcaico”, que a “modernidade” está chegando! Mais ou menos isso.
A propósito, o republicano repetiu à saciedade o seu possível slogan de campanha, também ensaiado ali: “Vamos construir um novo tempo na política deste Estado!”
Os desafios que surgem com o discurso
“Em mais de 70% dos mais de 400 quilômetros de BRs que cortam o Estado, não se consegue falar por telefone celular”, citou Erick. “Enquanto vivemos uma era de fibra ótica, de 5G, o Estado é incomunicável, porque vive um governo arcaico, atrasado, retrógrado, em tempos que nós precisamos colocar tecnologia nas mãos dos capixabas.”
Quais são os desafios de Erick para fazer esse discurso “pegar” (melhor que o sinal dos celulares) e expandir seu eleitorado para muito além daquela plateia amistosa e já fidelizada do Recreio dos Olhos?
Em primeiro lugar, começar a propor soluções palpáveis para os problemas identificados e enumerados por ele, o que pode ser feito aos poucos, no decorrer da campanha. É claro que há tempo para isso e que a ideia ali não era expor um plano de governo à sociedade, mas tão somente fazer um discurso breve e introdutório de campanha, com tom bem emotivo aliás, para mobilizar a militância. Mas será bom se, com o ar do tempo, as críticas apontadas por ele arem a ser acompanhadas por propostas.
Em segundo lugar – e na certa aí o maior desafio –, convencer a maior parte do eleitorado capixaba de que, muito mais que uma questão de juventude, ele é mesmo capaz de encarnar esse propalado conceito de “renovação política”, corroborando-o de fato com práticas, ideias, comportamento político e modelo istrativo diferentes de tudo o que já conhecemos.
Principais aliados
No palanque do evento do Republicanos, também subiram e discursaram, nesta ordem, o presidente estadual do partido, Roberto Carneiro; o ex-prefeito de Colatina e pré-candidato a senador Sérgio Meneguelli; e o prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini.
Silêncio estratégico
Último a falar antes de Erick, Pazolini fez um discurso bem light, praticamente desértico de críticas ao governo Casagrande. Foi assim orientado por seus assessores, inclusive. Por óbvio, não chegou nem perto de fazer menção à denúncia de supostos atos ilícitos no governo estadual – granada atirada por ele no último sábado (14). Não era o local nem o momento, até porque, se o fizesse, teria roubado o protagonismo de Erick, e a ideia ali era exaltar o aliado. Foi o que o prefeito fez: encheu a bola de Erick e ou-a para ele.
A fala de Pazolini
Em sua brevíssima fala (menos de 5 minutos), Pazolini antes de tudo registrou seu compromisso de “estar junto” de todos os candidatos do Republicanos e partidos coligados (no momento, o Patriota, o Agir e o PSC). O mais perto que chegou de fazer uma “crítica” ao atual governo, se é que se pode chamar assim, foi isto: “Não queremos desdenhar o trabalho de ninguém. […] Mas não podemos mais perder oportunidades”.
Na verdade, o prefeito preocupou-se mais em destacar os feitos da própria istração: “Vitória agora é outra. Vitória é a cidade que mais recebe turistas do Brasil. Vitória é a cidade que a economia está bombando. Fomos a primeira cidade em vacinação do país. Tiramos o Espírito Santo do mapa do esquecimento que às vezes não aparecia nem na previsão do tempo nos jornais.”
E, conclamando todos os presentes a “uma transformação republicana” (alusão ao nome da legenda), introduziu aquela “retórica do novo” que Erick desenvolveria em seguida:
“Precisamos ter coragem para mudar, para acompanhar e acreditar no novo, acreditar no jovem com responsabilidade, com uma equipe técnica de homens e mulheres abnegados que mudarão o rumo do Espírito Santo. […] Vitória acreditou no novo e mudou. É a hora de o Espírito Santo acreditar no novo. É hora de o Espírito Santo mudar. É hora de uma construção republicana!”
Trauma e superação
À militância, Erick contou brevemente a própria história, incluindo um episódio que o marcou pelo resto da vida (ele sempre o relata em discursos), ocorrido quando era assessor parlamentar do avô, o então deputado estadual Heraldo Musso: “Fui colocado para fora do plenário da Casa porque estava sem terno e gravata por deputados que Deus deu a oportunidade de votarem em mim três vezes para presidente da Assembleia”.
Precocidade
Erick também destacou: “Tornei-me o presidente de Assembleia mais jovem deste país, aos 29 anos”. E citou a Casa presidida por ele há meia década como “a mais produtiva, mais inclusiva, mais transparente e mais econômica do país”.
As críticas de Erick
Como já havia ensaiado em entrevista a este espaço, Erick também fez (como outros desafiantes de Casagrande têm feito) a crítica que opõe “nota A em gestão fiscal” a problemas graves nos serviços públicos e falta de entregas à sociedade capixaba. Lembrou a morte do menino Kevinn às portas do Himaba (de fato, uma vergonha para o atual governo):
Sobre miséria, citou “os mais de 500 mil capixabas que vivem em insegurança alimentar”.
Sobre segurança pública, disse que a área “está sangrando”. E, voltando-se para a Polícia Civil e a Militar, ressaltou que as duas corporações enfrentam “déficit assustador [de pessoal]”, estão “sem reconhecimento e sucateadas” e recebem “um dos menores salários do Brasil”.
Citou, ainda, o aumento do número de feminicídios: “Prometeram acabar ou reduzir. Mas o Espírito Santo foi o Estado que mais matou mulheres no Brasil no ano ado”. Isso com três delegados no palanque (afora Pazolini), todos pré-candidatos a deputado: Gracimeri Gaviorno, Ícaro Ruginski e Leandro Piquet.
Sobre o sistema prisional estadual, afirmou que hoje ele opera com o dobro da capacidade: “É uma a de pressão”.
Sobre a saúde pública, disse que os hospitais filantrópicos “estão com a corda no pescoço, vivendo no sufoco, e seguram 80% do sistema de saúde no Estado”.
Sobre turismo, questionou: “O que é turismo neste Estado? Nunca teve. Turismo é emprestar tenda e som pra fazer festa. E quem perdeu a eleição virar secretário de Turismo”.
A farpa foi destinada à ex-secretária estadual de Turismo Lenise Loureiro, aliada do ex-prefeito Luciano Rezende e do deputado estadual Fabrício Gandini (os três do Cidadania), por sua vez adversários políticos de Pazolini e Erick.
Parêntese
Especificamente sobre turismo, a fala de Erick foi contraditória com o que o próprio Pazolini acabara de dizer minutos antes. E não deve ter agradado nem um pouco à ex-deputada Luzia Toledo, agora pré-candidata a deputada estadual pelo Republicanos e antiga embaixadora do turismo na Assembleia. Ela estava ali do lado, no palanque…
“Engodo”, com todo o respeito
Em outro trecho mais agudo de seu discurso, ao enumerar promessas não cumpridas pelo atual governo, disse o presidente da Assembleia: “Estão achando que as pessoas vão cair nesse engodo de novo!”
Sobre o próprio Renato Casagrande, Erick expressou cordialidade: “Respeito o atual governador, a sua história, a sua família e a sua pessoa”.
Roberto na retaguarda
Chamando Roberto Carneiro de “amigo e irmão”, Erick reclamou do presidente estadual de seu partido: “Roberto gosta de ficar escondido, eu já chamei ele três vezes [para a frente do palanque]…”. Gosta mesmo: é articulador de bastidores e raramente se expõe.
A fala de Meneguelli
Chamando Pazolini de “esperança deste Estado”, o ex-prefeito de Colatina encampou aquele discurso de “fim do ciclo” que tem sido repetido por Felipe Rigoni (União Brasil) e pelo próprio Erick: “Chega de, por 20 anos, as mesmas duas pessoas governando o Estado”.
Meneguelli também se queixou de quem especula sobre um possível recuo dele: “Forças adversárias incompetentes ficam distribuindo boatos de que nós não seremos candidato”.
Motivação gospel
O evento teve, ainda, muitos “momentos motivacionais”, com abundância de frases de efeito e/ou de autoajuda, especialmente por parte de Erick. Escolha a sua:
. “A humildade leva o ser humano a lugares imagináveis. Nunca desista do sonho de vocês, por mais difícil que ele possa parecer.”
. “O que um dia se torna realidade, um dia foi sonho. E muitas vezes esse sonho no início é uma loucura.”
. “Meu padrinho é o povo do Espírito Santo.”
Erick ainda pediu para tocarem uma canção gospel com a seguinte letra: “Não se importe com o que o mundo diz. Na verdade, você se parece com o Rei Davi”. Para quem não lembra, é aquele que matou um gigante no Velho Testamento. Bem autorreferencial, né?
Querentão
Com direito a bolo de aniversário e “parabéns pra você” puxado por Erick, Pazolini completou 40 anos nessa sexta-feira (20/05).
Presentes
Além de todos os personagens já mencionados, marcaram presença no evento um representante do presidente estadual do PSDB, Vandinho Leite; a vice-prefeita de Vitória e pré-candidata a deputada federal, Capitã Estéfane (Republicanos), vários secretários de Vitória, o ex-deputado estadual Jardel dos Idosos; a médica e pré-candidata a deputada estadual Jéssica Polese (Republicanos).
Claques mais animadas
As claques mais animadas foram, em primeiro lugar, a do vereador de Vitória Denninho Silva, que disputará uma vaga na Assembleia, e, em segundo, a do vereador de Vila Velha Devanir Ferreira (Republicanos).
Dois santos
Denninho é aliado de Pazolini, mas seu novo partido, o União Brasil, tem candidato próprio a governador: Felipe Rigoni. Ele disse à coluna que apoiará Rigoni, até por fidelidade partidária, mas que foi convidado para o evento e só foi “prestigiar”.
Dois santos 2
Quem também compareceu no palanque de Erick foi o deputado estadual Rafael Favatto, pré-candidato a federal. Tudo normal até aí, já que ele preside no Estado o Patriota, que apoia Erick. A questão é que Favatto tem sido visto em várias cerimônias de entrega do governo estadual ao lado de Casagrande, pelo interior. Nessa sexta (20) novamente – um dia após se perfilar com Erick –, dessa vez em Guaçuí.
Por que será?
Quem não compareceu ao evento do próprio partido foi o deputado federal Amaro Neto, que concorrerá à reeleição pelo Republicanos.
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