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Coluna Vitor Vogas

Análise: a mudança radical de estratégia de Casagrande no 2º turno contra Manato

Estratégias do governador mudaram radicalmente em relação ao primeiro turno e são analisadas em detalhes pela coluna

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Casagrande ao lado de Bolsonaro, Tyago Hofmann e Marcos Kneip

Reza uma surrada máxima política que “segundo turno é uma outra eleição”. Pelo menos para o governador Renato Casagrande (PSB), esse dito não poderia ser mais verdadeiro. Na primeira vez em que disputa esta fase do processo em sua quinta campanha ao governo do Espírito Santo, Casagrande entrou no 2º turno com outro tom, outra estratégia… enfim, como um outro candidato, radicalmente diferente daquele do 1º turno. “Novas ideias para novos desafios”, dizia sua propaganda. Agora o desafio tem nome e sobrenome: chama-se Carlos Manato.

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Durante todo o 1º turno, por opção deliberada – e, pelo visto, não muito acertada –, a campanha de Casagrande deixou Manato correr solto em sua raia bem aberta na direita, intocado e desmarcado. Ao que tudo indica, a campanha do governador acreditou que tinha mesmo alta probabilidade de vencer a eleição em turno único e que, portanto, não tinha por que correr o risco de ir para o embate direto contra o candidato do PL, expondo para a população suas vulnerabilidades.

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A mudança radical de estratégia começou a ser colocada em prática logo após a apuração dos votos, já nas primeiras entrevistas de Casagrande na noite de domingo e no day after (3), inclusive para a BandNews e para a TV Capixaba. O governador diplomático e ivo do 1º turno – aquele dos debates finais da Rede Gazeta – deu lugar ao candidato que toma a iniciativa e parte para o ataque contra o seu adversário.

Em uma coluna publicada no fim do 1º turno, cheguei a escrever que a propaganda de Casagrande estava “pra cima” (ou seja, animada). Agora, a expressão ganhou outra conotação: é uma campanha que está “indo pra cima” e que não espera para contragolpear.

As palavras “crime organizado” não tinham sido ouvidas pelos capixabas durante as seis semanas de 1º turno. Já nas primeiras entrevistas de Casagrande após a consolidação do resultado, foram citadas prodigamente por ele, em associação a Manato. Como carro abre-alas da sua campanha no 2º turno, o governador resgatou a história (verídica) da filiação do seu adversário no ado à Scuderie Le Cocq, grupo de extermínio com intensa atuação no Espírito Santo nos anos 1980 e 1990.

De imediato, estrategistas de Casagrande pam em campo a estratégia de tirar o debate da comparação de propostas para colocar em primeiro plano a comparação pessoal entre os candidatos (vida e obra; currículo e história). Sem perda de tempo, começaram a propagar a ideia de que eventual vitória de Manato no dia 30 representa, para o Espírito Santo, “um risco de retrocesso”, “uma ameaça de volta a um período sombrio”.

O programa de reestreia do horário eleitoral, levado ao ar na última sexta-feira (7), foi aberto com Casagrande dizendo:

“A gente levou muito tempo para organizar este Estado. E podem acreditar: se para construir demora, para destruir é muito rápido. Os capixabas precisam agora escolher entre dois caminhos: o caminho da ordem ou o caminho do caos. O Espírito Santo não pode paralisar nem retroceder. Por isso, faço um convite a você neste segundo turno: compare os perfis dos candidatos, confronte os projetos, conheça os valores de cada um. O que está em jogo não é o futuro do Casagrande. É o futuro do Espírito Santo”.

“Em qual lado da história você quer estar?”, conclama a locutora, no final.

O argumento tem sido reforçado por novos (alguns não tão novos) apoiadores de Casagrande que lhe têm dedicado declarações de apoio, como o deputado federal Felipe Rigoni, o ex-prefeito de Vitória Luiz Paulo Vellozo Lucas, o presidente da OAB-ES José Carlos Rizk Filho e o antropólogo e cientista político Luiz Eduardo Soares, um dos maiores especialistas do país em segurança pública. O horário eleitoral gratuito tem se encarregado do resto.

Aliás, a propaganda eleitoral de Casagrande reflete bem essa mudança radical. Sai aquela propaganda “pra cima”, concentrada em apresentar propostas e realizar uma grande prestação de contas do mandato. Entra a comparação de perfis e os “alertas” sobre o adversário. Sai o “Casa, Casa, Casão” no ritmo da casaca e na voz de Casanova; entram frases como “o Espírito Santo não merece Manato”.

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No 1º turno, Casagrande tinha tempo de sobra no rádio e na TV. Mas, nem por um segundo sequer, ocupou-se de algum adversário. Agora, sua propaganda coloca em xeque a capacidade de Manato de dar sequência a obras e projetos iniciados pela atual gestão (“Será?”, pergunta o locutor) e expõe “o jeito Manato de fazer política”.

Na noite desta segunda-feira (10), mostraram o vídeo em que o então deputado federal, após perder a eleição para governador em 2018, discursa na Câmara de Alegre, sua cidade natal, em outubro de 2018, e declara que não mandaria mais recursos de emendas para a comunidade de Feliz Lembrança, porque tinha sido muito mal votado ali, mesmo tendo direcionado R$ 300 mil para a construção de uma quadra esportiva.

Logo na estreia, na última sexta, também recuperaram a história da demissão de Manato do cargo comissionado que ocupava na Casa Civil do governo Bolsonaro, ainda nos primeiros meses da atual istração, supostamente “por incompetência citada até por seus aliados”. O deputado Rigoni já fizera o mesmo.

Com o mesmo intuito de reforçar a comparação de perfis no quesito “capacidade istrativa”, também lançaram o slogan “governador de verdade”. Por contraste, o adversário seria um “gestor de mentira”. A ideia subliminar aqui é a de que Manato seria um farsante, um impostor ou algo assim (a locutora de Casagrande chega a usar a palavra “falácia”).

“Desnacionalização”

Ao mesmo tempo, fica evidente o esforço da campanha do governador para desnacionalizar ao máximo a eleição, descolando-a da disputa presidencial entre Lula e Bolsonaro, enquanto Manato, como era previsível, faz exatamente o contrário: “bolsonariza” ainda mais a sua campanha.

Da parte do candidato do PL, o programa eleitoral levado ao ar na noite desta segunda (10) mostrou muito verde e amarelo e martelou o slogan “Quem vota em Bolsonaro vota em Manato 22”. Suas inserções têm exibido declarações de apoio não só do próprio presidente como de um dos filhos dele, o deputado federal reeleito por São Paulo Eduardo Bolsonaro, que chama Manato de “amigo”.

Casagrande evita essa armadilha porque sabe que, nessa seara, só tem a perder. Primeiro porque, no Espírito Santo, Bolsonaro derrotou Lula no 1º turno por 52% a 40% dos votos válidos. Segundo porque Manato é, de fato, o candidato do partido de Bolsonaro e apoiado pelo presidente. Nesse jogo, Manato é quem tem o mando e campo.

Por isso, o programa do governador nesta segunda à noite foi aberto com o locutor dizendo o seguinte:

“Tem gente que vota por convicção no seu candidato. Mas tem gente que vota em um apenas porque não gosta do outro. Tem pessoas que votam no Lula apenas porque não gostam do Bolsonaro. Tem outras que votam no Bolsonaro apenas porque não gostam do Lula. […] Mas, se você é capixaba, tem uma coisa que é impossível você não gostar: o Espírito Santo.”

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No mesmo programa, o próprio Casagrande destaca a sua “experiência de governar com presidentes ideologicamente diferentes [Dilma e Bolsonaro]”. “É preciso saber construir pontes com o governo federal e isso, ao contrário do meu adversário, eu sei fazer bem”, emenda o governador. Também foram listadas algumas obras em andamento no Espírito Santo, em parcerias do governo estadual (Casagrande) com o federal (Bolsonaro), acompanhadas do bordão “é estadual, é federal”.

Prova maior desse esforço dos estrategistas de Casagrande em não deixar que a disputa local saia das quatro linhas do campo estadual é a nova identidade visual de sua campanha, com muito mais azul e rosa, cores do Espírito Santo, em sua logomarca.

“Voto em Bolsonaro E em Casagrande”

Ao mesmo tempo, como já observei aqui, a campanha colocou em marcha uma estratégia para estancar a sangria, isto é, conter a potencial evasão para Manato de eleitores de Bolsonaro que votaram em Casagrande no 1º turno. Foi aquela onda de manifestações públicas de aliados que declararam “voto em Bolsonaro para presidente e em Casagrande para governador”.

Olhando-se de fora, pode até parecer uma série de iniciativas isoladas e coincidentes, mas só podem ter sido uma ação coordenada que partiu diretamente do centro nervoso da campanha, para “segurar” aquele percentual de votos bolsonaristas que Casagrande não pode se dar ao luxo de perder para Manato; votos de que ele depende para ganhar a eleição.

No conjunto, essas declarações foram como um muro de sacos de areia erguido para impedir o avanço ainda maior da segunda onda bolsonarista contra candidatos não alinhados ao presidente.

Outra estratégia que chamou a atenção, esta de ordem preventiva, foi a rapidez com que a campanha de Casagrande tratou de posicionar-se como “o lado da verdade” contra as fake news eleitorais, procurando ocupar esse espaço através do slogan, também lançado no 2º turno, “se é fato, é Renato”.

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“Novo cangaço” em Santa Leopoldina

Também buscando antecipar-se aos adversários, a campanha de Casagrande abordou, já no programa de reestreia veiculado na última sexta-feira, o chocante episódio da ação do “novo cangaço” na pacata Santa Leopoldina, ocorrido na sexta retrasada (30), antevéspera da votação em 1º turno. Foi o clássico “buscar fazer do limão uma limonada”.

O que foi seguramente o caso mais aterrorizante dessa nova modalidade de crime já ocorrido em território capixaba – exemplo de como a população está vulnerável à ação de criminosos de alta periculosidade – foi explorado como um modelo de reação imediata, resposta exemplar e implacável por parte das forças de segurança estaduais.

“Em menos de 48 horas”, como se fez questão de frisar, o caso foi resolvido, com a prisão de alguns membros da quadrilha e alguns mortos em confronto com a polícia, o que não deixa de ser mais um aceno para aquele eleitor de Bolsonaro para quem “bandido bom é bandido morto”.

Os estrategistas de Casagrande na certa previram que Manato entraria com tudo no 2º turno levantando esse episódio com a abordagem mais crítica possível (“Estão vendo a que ponto chegamos? Debaixo das barbas do governo!”), então trataram de sair na frente, explorando o ângulo mais favorável possível (“Sim, aconteceu, mas não transigimos com criminosos”).

No fim das contas, devido à perda do seu marqueteiro na primeira semana do 2º turno, a campanha de Manato nem tocou no assunto e ainda está reaproveitando muito material antigo (uma das inserções de rádio do candidato faz menção ao Sete de Setembro).

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Conclusões

Em suma, Casagrande e seu staff abriram a caixa em cuja tampa se lia “Manato: só usar em caso de necessidade”. E aquela postura fleumática de magistrado que não quer sujar as mãos e que, atacado por todos os lados, limita-se a posar de vítima… bem, tal postura ficou no 1º turno. Aquele candidato tão ivo e diplomático deu vida a outro que atira primeiro… para alívio, diga-se de agem, de alguns aliados de Casagrande para os quais ele exagerou no papel de Geni.

Mudança tão perceptível pode ter a ver com a entrada de um personagem importante no governo Casagrande como uma das vozes ativas no background da campanha: resolvida a sua eleição para a Assembleia, Tyago Hoffmann (PSB) se soma agora ao coordenador, Vitor de Angelo. Enquanto este tem um estilo mais diplomático e formulador, Hoffmann é o que no futebol italiano dir-se-ia um scontrista: aquele meio-campista que vai mesmo para o choque e não foge de nenhuma dividida.

Se a mudança dará certo ou não, só o dia 30 dirá.

Vitor Vogas

Nascido no Rio de Janeiro e criado no Espírito Santo, Vitor Vogas tem 39 anos. Formado em Comunicação Social pela Ufes (2007), dedicou toda a sua carreira ao jornalismo político e já cobriu várias eleições. Trabalhou na Rede Gazeta de 2008 a 2011 e de 2014 a 2021, como repórter e colunista da editoria de Política do jornal A Gazeta, além de participações como comentarista na rádio CBN Vitória. Desde março de 2022, atua nos veículos da Rede Capixaba: a TV Capixaba, a Rádio BandNews FM e o Portal ES360. E-mail do colunista: [email protected]

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