Coluna Vitor Vogas
O favorito do governo Casagrande para a vaga de Sérgio Borges no TCES
Saiba como estão as articulações de bastidores visando à ocupação da cobiçada cadeira de conselheiro a ser preenchida em votação secreta na Ales

Da esquerda para a direita: Renato Casagrande, Davi Diniz, Marcelo Santos e Valésia Perozini
Com a reabertura dos trabalhos parlamentares da Assembleia na próxima semana, a primeira grande tarefa a aguardar os deputados é a escolha do próximo conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCES), na vaga aberta com a aposentadoria compulsória de Sérgio Borges, que completou 75 anos no dia 8 de janeiro. A vaga “é da Assembleia”, ou seja, compete aos deputados escolher o sucessor de Borges, em votação secreta a ser marcada pelo presidente Marcelo Santos (Podemos), mas o governo, como de praxe, na certa exercerá uma profunda influência na escolha. Como sempre fizeram ele mesmo e seus antecessores no cargo, Casagrande deve aproveitar a chance para emplacar um fiel aliado na Corte de Contas, contando para isso com os votos de sua base em plenário.
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Neste momento, o que a Bolsa Política Capixaba se pergunta é: qual aliado? Dois nomes são gritados no pregão: o da eterna chefe de gabinete de Casagrande, Valésia Perozini (PSB), e o do secretário-chefe da Casa Civil, Davi Diniz, este gritado a vozes mais potentes. O favoritismo hoje é todo de Diniz – o que não quer dizer que Valésia esteja fora do radar, assunto da nossa próxima coluna.
Por que parece ter chegado a hora e a vez de Davi Diniz? Vejamos.
Em primeiro lugar, querer não é poder, mas é o primeiro o para qualquer empreitada política. E o secretário quer, de fato, a vaga de Borges no TCES. Ainda que no seu estilo de sempre – quietão e discretão, movendo-se pelas beiradas –, Diniz já tem feito a sua parte para se consolidar. Recentemente, fez uma visita de cortesia ao deputado Theodorico Ferraço (PP), que não faz parte da base governista e é sempre um voto imprevisível. Ferraço sempre valorizou um carinho político.
Em segundo lugar, a própria função desempenhada por Diniz no governo desde o início do mandato ado de Casagrande o coloca em diálogo e interação permanentes com todos os deputados, do mais leal ao Palácio Anchieta até o crítico mais vigoroso, do líder do governo em plenário (Dary Pagung) até um Capitão Assumção (PL). Não é figura de linguagem: Assumção tem mesmo boa relação com Diniz e ocasionalmente, em caso de necessidade, recorre a ele pessoalmente na Casa Civil.
Pela natureza de sua função, Diniz estabeleceu proximidade com seus 30 eleitores. Desde 2019, firmou-se como principal articulador político de Casagrande com a Assembleia (e com o mundo político em geral). É a ponte pessoal entre os deputados e o governo, o primeiro a quem eles se reportam. Tem bom trânsito e bom relacionamento até com os detratores de Casagrande. Se não é querido por todos, tem de todos pelo menos o respeito. Aliás, se não for respeitado pelos deputados, o chefe da Casa Civil não dura muito no cargo. Diniz está lá há mais de cinco anos ininterruptos. É fato eloquente por si.
Em terceiro lugar, até por conta dessa proximidade e do bom relacionamento estabelecido com o chefe da Casa Civil, pode convir não só a Casagrande, mas também aos próprios deputados, conduzir ao TCES alguém com quem eles tenham desenvolvido um canal direto.
Ora, o plenário da Assembleia nada mais é que um amontoado de interesses paroquiais. Já está aí a eleição municipal, na qual muitos devem tentar a sorte entre os eleitores dos respectivos redutos, na Grande Vitória e no interior. O deputado de hoje pode ser o prefeito de amanhã, tornando-se (ou voltando a ser) ordenador de despesas. E então, automaticamente, entrará na mira fiscalizatória do TCES, órgão de controle auxiliar da Assembleia, que aprecia e dá pareceres sobre as contas dos gestores municipais e estaduais.
Vai que o deputado A se elege prefeito do município B e de repente, no meio do mandato, vê-se às voltas com problemas no TCES… O que será melhor para ele? Ter ali um conselheiro que ele acredite ser “amigo” e que esteja pelo menos ível para lhe abrir a porta do gabinete e escutar sua argumentação? Ou alguém com quem ele nunca tenha conversado na vida? O pragmatismo também há de pesar na preferência dos deputados/eleitores.
O papel de Marcelo nesse jogo
Em quarto lugar, também contam muito nesse processo as inclinações e idiossincrasias de Marcelo Santos.
Primeiro, porque o presidente da Assembleia é quem tem nas mãos as rédeas do processo. Já informado oficialmente pelo TCES da vacância da cadeira de Borges, Marcelo é quem tem a prerrogativa de publicar o “edital” abrindo prazo de dez dias para que a Mesa Diretora ou os deputados inscrevam os seus candidatos (cada um pode inscrever a si mesmo ou a um terceiro, e o inscrito não precisa ser deputado).
Não há nem no Regimento Interno nem na legislação estadual especificação de prazo para que o presidente faça isso. A rigor, se Marcelo assim quiser, ele pode publicar o edital só em dezembro – embora nesse caso a Assembleia certamente fosse provocada por órgãos externos, como o próprio TCES. De todo modo, Marcelo é senhor do tempo nesse processo, a ser deflagrado somente quando ele entender que é chegado o momento. Diniz e qualquer outro postulante dependem da sua boa vontade.
Segundo e mais importante: com a força política reunida hoje, Marcelo é, entre os deputados, o único que teria poder para melar, ou ao menos tentar estragar, os planos do Palácio Anchieta, lançando a própria candidatura ou apoiando algum outro deputado (mas quem???).
A Rádio Assembleia dá conta de que alguns deputados, capitaneados por Hudson Leal (Republicanos), primeiro vice-presidente da Mesa, têm buscado articular um movimento com o objetivo de que “a vaga da Assembleia” seja preenchida por um dos deputados: especificamente, pelo próprio Marcelo. Se quiser, ele pode tentar.
Todas as declarações públicas de Marcelo sobre o tema desde antes de chegar à presidência da Mesa vão na direção contrária. Mas Marcelo, não só pela inicial, é o Mr. M da política capixaba. “Se ele der seta para a direita, você pode esperar que ele vai virar para a esquerda, mas não se surpreenda se ele seguir em frente”, resume outra raposa política de alta pelugem.
Assim, não seria nenhuma grande surpresa se Marcelo, mais uma vez, surpreendesse.
Isso posto, tenho seríssimas dúvidas de que ele pretenda fazer isso. Tenho dúvidas ainda maiores de que ir parar no TCES seja um “bom negócio” para ele neste ano da graça de 2024. No Jogo da Vida Política, seria retroceder algumas casas.
Ao que tudo indica, Marcelo já está em outra. Sua cabeça está voltada para projetos maiores. O deputado já aspirou (e muito) a uma vaga no TCES. Há cerca de cinco anos, quando sua carreira parecia em declínio, chegar lá era lucro para ele. Agora, porém, com o novo vigor obtido nas urnas em 2022, seguido por sua tão ansiada chegada ao poder no Legislativo Estadual, Marcelo vive, de longe, o melhor momento de sua longa caminhada política, iniciada em 1996.
Está em franca ascensão. Tem idade, poder e aliados para ambicionar voos mais altos. Todos dão por certa sua recondução à presidência da Mesa em 2025. Para o ano seguinte, ele tem falado em Câmara dos Deputados, mas, dependendo da conjuntura, essa vaga buscada no Congresso pode até vir a ser na outra Casa (o Senado terá duas em disputa)… Por que agora, logo agora, em seu melhor momento político, ele haveria de querer amarrar seu burro na sombra do TCES e enterrar, aos 53 anos, uma carreira política com um potencial de crescimento que ele nunca antes tinha tido? Não faz o menor sentido. Nem do ponto de vista financeiro, pois Marcelo não precisa disso.
O presidente da Assembleia já teve oportunidades, mas nunca foi para o enfrentamento com o governo Casagrande. Não é agora que iria. Fonte próxima a ele confirma que, para Marcelo se candidatar, só mesmo se ele for o nome de consenso da Assembleia, do Palácio Anchieta e, ainda, dos atuais conselheiros do TCES. Dificilmente o será.
E aí tornamos a Davi Diniz. É claro que, para o preferido do Palácio Anchieta, reconhecido o poder de Marcelo como único capaz de travar ou ameaçar a sua ida para o TCES, é importante cultivar também uma boa relação com o presidente da Assembleia. E isso existe entre eles. Politicamente, os dois estão bem alinhados.
Confidencialmente, deputados ouvidos pela coluna falam até em um compromisso firmado por Marcelo com Diniz, de não se lançar agora à vaga de Borges a fim de lhe deixar o caminho livre. Seria, antes de mais nada, retribuição pela imensurável ajuda do chefe da Casa Civil na chegada de Marcelo à presidência da Mesa Diretora, precisamente um ano atrás.
Em quinto e último lugar, Diniz reúne as duas condições principais para quem almeje vaga no TCES: conhecimento técnico e político. Davizinho, como é chamado por Zé Esmeraldo (um dos deputados mais casca grossa), saiu-se bem em uma função delicada, lidando diariamente com os egos e interesses de deputados melindrosos. Mas é, originalmente, um técnico, que chegou a ser secretário da Fazenda de Vitória no governo de Luciano Rezende (Cidadania). É um técnico que virou, quase por acaso, o principal operador político de Casagrande.
Por tudo isso, hoje, é um nome que a no plenário muito mais facilmente que o de Valésia – ou o de qualquer outro que venha a ser carimbado pelo governo. Teria a indicação aprovada muito mais tranquilamente que a dela. Se Casagrande apontar-lhe o dedo – como fez em direção a Marcelo na última eleição da Mesa –, sua base o seguirá. E o governo hoje tem a maioria em plenário, ainda que não folgada, por conta do poder e do dinheiro: liberação de emendas orçamentárias, por sinal ampliadas neste ano para R$ 2 milhões por deputado, em articulação liderada, ora, ora, pelo próprio Diniz, no fim do ano ado.
Deputados seguem a bússola do poder, cuja seta sempre aponta para o Palácio Anchieta. E o Palácio Anchieta, hoje, tende a apontar para Davi Diniz.
Por que é mais difícil com Valésia?
Se Casagrande quiser bancar a indicação de Valésia em detrimento de Diniz, o nome da chefe de gabinete até poderá vencer a eleição em plenário, mas não será nada fácil. Nesse caso, a conta a ser paga seria bem maior. O governo teria de gastar muito mais politicamente. “Nomeações e liberação de emendas fora de época”, resume uma fonte.
Mas é preciso sempre lembrar: a votação é secreta, o que sempre abre espaço perigoso para surpresas e traições. O governador não pode se dar ao luxo de escolher um nome arriscado, que não lhe inspire certeza de vitória. Se não definir um nome e sinalizá-lo muito claramente para o mercado político e se esse nome escolhido não for bem aceito pelos deputados, o processo de escolha pode escapar das mãos do chefe do Executivo.
E aí o negócio pode virar um “cada um por si”, deflagrando o autolançamento de diversos deputados para a vaga. Um deles comentou que, se a candidata do Palácio for Valésia, vislumbrando chance de vitória na votação secreta, ele mesmo registrará candidatura, assim como alguns colegas possivelmente o farão. Pelo regulamento, não há necessidade de uma votação mínima (“maioria simples”, “maioria absoluta” etc.). Em escrutínio único, ganha quem obtiver mais votos que os demais.
Eventual indicação de Valésia foi um movimento impulsionado por atores do PSB, interessados, claro, em ver outra correligionária lá (após emplacarem Rodrigo Chamoun em 2012 e Luiz Carlos Ciciliotti em 2019, ambos filiados ao PSB antes de tomarem posse no TCES).
Mas as dificuldades começam pelo fato de que Valésia não é, a princípio, um nome que desperte grande simpatia entre os deputados. Não apenas por estilo, mas também pela natureza das funções, o que Diniz tem de proximidade Valésia tem de distanciamento em relação aos parlamentares.
No meio político, entre aliados do Palácio, enquanto Davi é visto como o cara que lhes abre as portas e faz o possível para atendê-los, resolver seus conflitos e desenrolar seus pleitos, Valésia é tida por alguns como aquela que barra seus desejos e fecha as portas do gabinete para eles, negando-lhes o direto ao governador. Enquanto um facilita, a outra blinda.
Considerada dura, a chefe de gabinete não é de fazer média política com ninguém. É articuladora política, mas não é ela mesma uma política e não lida diretamente com eles. Constrói a agenda do governador, mas não recebe pessoalmente ninguém para agendas com ela. Na Assembleia, os deputados nem sequer mencionam o nome dela para nada. Entre uns poucos, o nome desperta certa antipatia. Para a maioria, não desperta nada.
Nada disso, porém, quer dizer que levar a chefe de gabinete para o TCES esteja fora dos planos do governo Casagrande e do PSB futuramente. De que maneira?
É o tema de uma próxima coluna.
